Tem coisa que a paranoia na cabeça dos roteiristas adora escrever a respeito: o universo conspiratório em que todo mundo está contra os interesses do “governo”, seja ele qual for. Geralmente centrado no eixo Europa-Estados Unidos, uma produção de ação com suspense e conspiração geralmente envolve mocinhos versus bandidos, sendo estes geralmente oriundos dos países não ocidentais. Seguindo esse molde, estreou na virada do ano como uma das apostas da Netflix a minissérie ‘Traição’, uma boa opção para os assinantes que gostam desse tipo de produção.
Em um dia comum, Sir Martin Angelis (Ciarán Hinds), diretor geral da MI6 (o serviço de inteligência secreto do Reino Unido e das Nações Amigas), está almoçando no clube que sempre frequenta quando, de repente, percebe que algo está errado: ele fora envenenado. Com o diretor afastado no hospital, Adam Lawrence (Charlie Cox), um homem jovem e cheio de energia, é indicado para ocupar a vaga de diretor geral da MI6. Sob pressão mas disposto a dar seu melhor, Adam se debruça a fundo para investigar quem estaria interessado no envenenamento de Adam, porém, aos poucos sua própria vida começa a correr risco, e também a de sua esposa Maddy (Oona Chaplin) e seus filhos Callum (Samuel Leakey) e Ella (Beau Gadsdon). Isto porque Kara (Olga Kurylenko), sua ex-namorada russa, volta de seu passado para cobrar respostas sobre uma missão em que os dois estiveram envolvidos anos antes.
Dividido em cinco episódios de cerca de quarenta minutos cada, ‘Traição‘ é o tipo de história que busca entregar ao menos uma grande reviravolta por episódio, de modo a engajar o espectador a continuar assistindo. Neste sentido, consegue seu objetivo, afinal, sendo uma minissérie, o espectador já tem mais predisposição para assistir, ciente de que terá o final da história quando a minissérie acabar.
O roteiro de Mark Charman e Amanda Duke faz o eixo do enredo girar a cada fim de arco narrativo. Em um primeiro momento temos a história centrada no protagonista Adam, que é um sujeito meio sem sal que não justifica estar na posição em que está; em seguida mudamos para Kara e esse passado negado, que eventualmente explica o porquê das coisas; por fim, ficamos em Maddy, a esposa que começa sem muito espaço na história mas que acaba como protagonista. Para rechear as tramas, muito suspense conspiratório envolvendo agentes-duplos, agentes infiltrados, FBI, MI6, vilões russos e heroísmo em território árabe. Ou seja, um roteiro que bebe e reforça a construção dessa imagem de árabes e russos como os grandes maus e os ingleses-estadunidenses como os bonzinhos, mesmo que entre eles mesmos haja muita puxada de tapete.
A direção compartilhada entre Louise Hooper e Sarah O’Gorman promove dinamismo para a história, alternando os holofotes do vilão versus herói de modo que o espectador é constantemente enganado, sem saber em quem acreditar – tal como os personagens na história. As diretoras realizam um competente trabalho na construção do suspense e das cenas de luta e tiroteio, tornando-as bastante convincentes, que é o que os fãs de ação querem ver.
‘Traição’ é uma boa minissérie de ficção com um quê de real, que se baseia no imaginário coletivo do eixo nórdico do globo de estar constantemente buscando traidores. Não traz nada de novo, mas é bem feito, e é isso que importa no entretenimento.