segunda-feira , 18 novembro , 2024

Crítica | Triângulo da Tristeza – Ganhador da Palma de Ouro é uma sátira político-social engraçada e impactante

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Ganhador da Palma de Ouro do Festival de Cannes, Triângulo da Tristeza (Triangle of Sadness) coloca em um plano jocoso a luta de classe e o embate sobre os prazeres e as agruras do capitalismo. 

Assim como em Parasita (2019), de Bong Joon-ho, Triângulo da Tristeza utiliza o timing cômico para apresentar uma envolvente e ácida crítica social. Com um currículo de seis filmes impressionantes, o sueco Ruben Östlund, responsável pela direção e roteiro, expõe desta vez uma nova classe de privilegiados, os “influencers”, por meio de diálogos mordazes e situações bem-humoradas. 

Cena debochada de um casting de modelos.

Em seu filme anterior, The Square – A Arte da Discórdia (2017), igualmente premiado com a Palma de Ouro em Cannes, Östlund já tinha apresentado o seu modo intenso de trabalhar uma crítica a partir de particularidades individuais à esfera coletiva. A comparação com a obra coreana Parasita, não é por acaso. São ambos filmes com proposições políticas e de comando à reflexão, ao mesmo tempo em que se propõem encantar e divertir o público. 



Desde a cena inicial, numa sala repleta de modelos masculinos para um teste de casting, Triângulo da Tristeza já ostenta o seu tom de ironia, o qual é exacerbado ao longo das 2h20 de filme. O extenso tempo não é motivo de preocupação, cada minuto é um deleite da criatividade do autor. 

Do exemplo mais corriqueiro de glamour e frivolidade, a gente acompanha o casal Yaya (Charlbi Dean) e Carl (Harris Dickinson). Eles são o centro da primeira parte narrativa, dividida em três. O bate-boca entre eles prepara suavemente o terreno para as intempéries seguintes. Vale lembrar que a carreira promissora da sul-africana Charlbi Dean foi precocemente interrompida após uma parada respiratória, em agosto deste ano. 

Após um jantar, eles abrem uma longa discussão – sempre jocosa – sobre o pagamento da conta do restaurante. A começar deste gesto trivial, o diretor/roteirista desenrola o debate sobre dinheiro, poder e manipulação. 

Não deixe de assistir:

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Depois de um tenso começo, o longa nos leva para um cruzeiro com o jovem casal de modelos e outros passageiros ainda mais exóticos. A mudança de ambiente abre o segundo capítulo da história. 

Quem são as pessoas que viajam em um transatlântico? Segundo os critérios burlescos do filme, os “endinheirados” e os “influencers”. Na era do Instagram todo passeio, monumento ou momento extraordinário, no sentido, fora da rotina, torna-se uma pose a ser compartilhada na rede. Nesta disputa, quem mais compartilhar momentos de prazer com um belo filtro, ganha… seguidores. 

Entre os passageiros, estão homens que não dispensam a oportunidade de gabar-se de suas posses e mulheres que amam ostentar um controle sobre os outros. Neste cenário, os tripulantes e funcionários do cruzeiro têm apenas uma missão: satisfazer os clientes. Comandados pela chefe de operações, Paula (Vicki Berlin), eles devem sempre concordar com a vontade dos hóspedes e obedecer os seus pedidos mais estapafúrdios. 

Darius (Arvin Kananian) e O Capitão (Woody Harrelson)

Dentro deste animado navio, o capitão é um bêbado, esnobe e avesso ao capitalismo do modo mais sonso possível. Inspirado pela tônica burlesca, Woody Harrelson – muito próximo dos seus personagens em Zumbilândia (2009) e Jogos Vorazes (2012) -, intensifica o tom nonsense da vergonhosa mistura de humilhação e esnobismo do enredo. 

Por conta da falta de comunicação entre a coordenadora de tripulação e o comandante embriagado, o jantar do capitão ocorreu em um dia de tormenta marítima. Dali, é provocado as cenas mais hilariantes do filme, um show de vômitos e diarreia. Algo que todos os seres humanos, sejam eles faxineiros ou proprietários de terras, estão sujeitos a passar.

Neste pé de igualdade, a noite de tempestade é permeada por discussões ébrias – e sempre chistosas – entre um russo capitalista e um estadunidense marxista, e termina numa explosão. O acontecimento é tão engraçado quanto todas as situações anteriores e nos leva à terceira parte do filme: o embate final. 

Numa ilha deserta, quem sobrevive é quem sabe caçar a comida e acender o fogo. Desse modo, a faxineira do navio Abigail (vivida pela filipina Dolly De Leon) toma partido dos seus conhecimentos sobre outros sobreviventes. Assim, toda a dinâmica de poder, sedução, autoridade discutidas desde da cena de casting e do jantar entre os namorados é entrelaçada. 

Como o Triângulo da Tristeza conquistou o júri de Cannes? Assim como em Força Maior (2014) e The Square (2017), Ruben Östlund cria uma sátira político-social naturalmente engraçada e impactante. Em outras palavras, o diretor coloca o dedo nas nossas feridas sociais, mas como uma farsa, assim o processo catártico não é dolorido.  

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Assim como em Parasita (2019), de Bong Joon-ho, Triângulo da Tristeza utiliza o timing cômico para apresentar uma envolvente e ácida crítica social. Com um currículo de seis filmes impressionantes, o sueco Ruben Östlund, responsável pela direção e roteiro, expõe desta vez uma nova classe de privilegiados, os “influencers”, por meio de diálogos mordazes e situações bem-humoradas. 

Cena debochada de um casting de modelos.

Em seu filme anterior, The Square – A Arte da Discórdia (2017), igualmente premiado com a Palma de Ouro em Cannes, Östlund já tinha apresentado o seu modo intenso de trabalhar uma crítica a partir de particularidades individuais à esfera coletiva. A comparação com a obra coreana Parasita, não é por acaso. São ambos filmes com proposições políticas e de comando à reflexão, ao mesmo tempo em que se propõem encantar e divertir o público. 

Desde a cena inicial, numa sala repleta de modelos masculinos para um teste de casting, Triângulo da Tristeza já ostenta o seu tom de ironia, o qual é exacerbado ao longo das 2h20 de filme. O extenso tempo não é motivo de preocupação, cada minuto é um deleite da criatividade do autor. 

Do exemplo mais corriqueiro de glamour e frivolidade, a gente acompanha o casal Yaya (Charlbi Dean) e Carl (Harris Dickinson). Eles são o centro da primeira parte narrativa, dividida em três. O bate-boca entre eles prepara suavemente o terreno para as intempéries seguintes. Vale lembrar que a carreira promissora da sul-africana Charlbi Dean foi precocemente interrompida após uma parada respiratória, em agosto deste ano. 

Após um jantar, eles abrem uma longa discussão – sempre jocosa – sobre o pagamento da conta do restaurante. A começar deste gesto trivial, o diretor/roteirista desenrola o debate sobre dinheiro, poder e manipulação. 

Depois de um tenso começo, o longa nos leva para um cruzeiro com o jovem casal de modelos e outros passageiros ainda mais exóticos. A mudança de ambiente abre o segundo capítulo da história. 

Quem são as pessoas que viajam em um transatlântico? Segundo os critérios burlescos do filme, os “endinheirados” e os “influencers”. Na era do Instagram todo passeio, monumento ou momento extraordinário, no sentido, fora da rotina, torna-se uma pose a ser compartilhada na rede. Nesta disputa, quem mais compartilhar momentos de prazer com um belo filtro, ganha… seguidores. 

Entre os passageiros, estão homens que não dispensam a oportunidade de gabar-se de suas posses e mulheres que amam ostentar um controle sobre os outros. Neste cenário, os tripulantes e funcionários do cruzeiro têm apenas uma missão: satisfazer os clientes. Comandados pela chefe de operações, Paula (Vicki Berlin), eles devem sempre concordar com a vontade dos hóspedes e obedecer os seus pedidos mais estapafúrdios. 

Darius (Arvin Kananian) e O Capitão (Woody Harrelson)

Dentro deste animado navio, o capitão é um bêbado, esnobe e avesso ao capitalismo do modo mais sonso possível. Inspirado pela tônica burlesca, Woody Harrelson – muito próximo dos seus personagens em Zumbilândia (2009) e Jogos Vorazes (2012) -, intensifica o tom nonsense da vergonhosa mistura de humilhação e esnobismo do enredo. 

Por conta da falta de comunicação entre a coordenadora de tripulação e o comandante embriagado, o jantar do capitão ocorreu em um dia de tormenta marítima. Dali, é provocado as cenas mais hilariantes do filme, um show de vômitos e diarreia. Algo que todos os seres humanos, sejam eles faxineiros ou proprietários de terras, estão sujeitos a passar.

Neste pé de igualdade, a noite de tempestade é permeada por discussões ébrias – e sempre chistosas – entre um russo capitalista e um estadunidense marxista, e termina numa explosão. O acontecimento é tão engraçado quanto todas as situações anteriores e nos leva à terceira parte do filme: o embate final. 

Numa ilha deserta, quem sobrevive é quem sabe caçar a comida e acender o fogo. Desse modo, a faxineira do navio Abigail (vivida pela filipina Dolly De Leon) toma partido dos seus conhecimentos sobre outros sobreviventes. Assim, toda a dinâmica de poder, sedução, autoridade discutidas desde da cena de casting e do jantar entre os namorados é entrelaçada. 

Como o Triângulo da Tristeza conquistou o júri de Cannes? Assim como em Força Maior (2014) e The Square (2017), Ruben Östlund cria uma sátira político-social naturalmente engraçada e impactante. Em outras palavras, o diretor coloca o dedo nas nossas feridas sociais, mas como uma farsa, assim o processo catártico não é dolorido.  

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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