quinta-feira , 21 novembro , 2024

Crítica | Vida Selvagem – Carey Mulligan é uma força da natureza em drama familiar

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Em Nome do Pai

A fama é um dos grandes objetivos do ser humano, e está muito associada ao sucesso. Não é fácil de conquistar, e uma vez conseguida, administrá-la se torna uma tarefa ainda mais difícil. No mundo do cinema, a fama se traduz em venda mais garantida para novos trabalhos dos que a possuem – gerando automaticamente expectativa por tal obra. Isso é o motor que faz girar a indústria e que faz cinéfilos, especialistas e fãs esperarem pela próxima produção de seus artistas preferidos. Tal fato ocorre mesmo com estreias, se o debutante na área for uma personalidade já tarimbada vinda de outro segmento.

Vida Selvagem marca a estreia na direção do ator e roteirista Paul Dano, “muso” do cenário indie norte-americano. Baseado no livro de Richard Ford, o roteiro foi adaptado por Dano e sua companheira dentro e fora das telas, a também atriz Zoe Kazan. A história retrata com eficiência o cotidiano de uma família de classe média baixa norte-americana vivendo em Great Falls, Montana, na década de 1960. Trinta anos após a grande depressão que abalou a maior potência mundial, a família Brinson luta para tentar se manter de pé, e sobreviver financeiramente.



Jerry (o pai), Jeanette (a mãe) e Joe (o filho), à primeira vista parecem a típica família perfeita, vangloriada em comerciais de margarina. Basta, no entanto, uma segunda olhada para encontrar intensas rachaduras nesta cúpula – como apresentado de forma memorável em Beleza Americana (vencedor do Oscar em 2000). Não bastasse a luta diária para prover à sua família de forma apertada, o patriarca Jerry perde o emprego e conseguir outro se mostra uma tarefa árdua – ao ponto de deixá-lo desesperançoso e deprimido. O fato força sua esposa a contribuir, e também sair em busca do ganha-pão – numa época de transição para a independência feminina, onde tais ocorrências ainda causavam estranhamento social.

Apesar dos grandes nomes, como Jake Gyllenhaal e Carey Mulligan, nos papeis principais do pai e da mãe, tudo é visto e acompanhado através dos olhos do filho do casal, o jovem Joe (Ed Oxenbould). Ele serve como nosso guia pela intimidade de sua família, nos fazendo excursionar por uma fase nostálgica de nossas próprias vidas, e refletir sobre o comportamento da relação de pais e filhos – que sintomaticamente nos molda como as pessoas que viremos a nos tornar. A base de tudo são estes anos formadores, cruciais para o restante de nossas vivências.

Com uma visão extremamente madura, digna de um veterano, o cineasta calouro Paul Dano mostra que aprendeu com os grandes nomes com quem trabalhou – gente como Paul Thomas Anderson, Richard Linklater, Ang Lee, Steve McQueen, Denis Villeneuve, Paolo Sorrentino, entre outros -, se formando com maestria e adquirindo de cada um deles a qualidade necessária para assimilar a postura de um contador de histórias de mão cheia. A sofisticação com que Dano monta cada frame de seu longa é simplesmente de tirar o fôlego. O diretor faz uso de uma das melhores fotografias do ano (garantida de ser lembrada na época de prêmios – se ficar de fora será um disparate) e uma trilha incisiva, que combinadas florescem os sentidos numa experiência única.

Contemplativo e minimalista, Vida Selvagem pode ser considerado dono de uma narrativa quase lisérgica e ritmo deliberadamente lento para alguns, mas sua estética é tão vibrante que se torna impossível desgrudar os olhos da tela. É claro que isso não seria o suficiente caso o texto apresentado não fosse igualmente compelativo. A adaptação é identificável ao extremo e possui um adjetivo muito em falta no cinema mainstream atual: humanidade. Essa é uma história sobre seres humanos errantes e sua rotina, seus deslizes e pecados – inerente de toda e qualquer relação neste planeta.

Quando o pai deixa sua família em função de um arriscado emprego apagando incêndios florestais – muito devido a frustrações pessoais – tal abandono reflete imediatamente nos outros entes desta equação. O filho pródigo ainda vê na figura paterna um exemplo, ansiosamente esperando seu retorno – que pode sequer ocorrer. A mulher, preterida, não assume tal posicionamento e parte ela mesmo atrás de uma forma de sobrevivência – seguindo por caminhos errôneos para uma vida melhor.

A verdadeira protagonista do longa é Jeanette, tomada por uma Carey Mulligan nunca antes vista. Em geral incorporando personagens donas de personalidade similar (a mulher fragilizada e insossa), a jovem britânica entrega aqui seu ponto fora da curva. Mulligan apresenta uma atuação magnética – pela qual somos instantaneamente atraídos, fascinados e totalmente arrebatados. A atriz nunca esteve melhor do que neste desempenho, se despindo até a alma na forma de uma mulher insatisfeita com os rumos que sua vida tomou – recobrando a liberdade e juventude que lhe foram tiradas. Em momentos de diálogos com o filho, Mulligan exprime o máximo de veracidade de suas cenas. Sua entrega é pura explosão e carisma – inéditos na carreira. Vê-la de tal forma, como na cena do jantar na casa do patrão (na qual dança), é impressionante. É possível constatar as características de uma grande atriz – em especial para os que nunca a viram por tal prisma. Se sair indicações a prêmios, será merecido.

Vida Selvagem dialoga com a melancolia e expectativas não cumpridas em âmbitos de nossas vidas. Dano cria um filme belo, triste e real, refletindo unicamente uma parcela da vida, e sendo capaz, inclusive, de transcender a uma produção cinematográfica – elevação que pode causar estranhamento. O realismo, porém, é uma de suas maiores virtudes. E o diretor acrescenta ainda uma parte técnica inspirada e atuações avassaladoras. Quem dera todas as estreias atrás das câmeras pudessem ser assim. Dano, quando sai seu segundo filme?

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Vida Selvagem marca a estreia na direção do ator e roteirista Paul Dano, “muso” do cenário indie norte-americano. Baseado no livro de Richard Ford, o roteiro foi adaptado por Dano e sua companheira dentro e fora das telas, a também atriz Zoe Kazan. A história retrata com eficiência o cotidiano de uma família de classe média baixa norte-americana vivendo em Great Falls, Montana, na década de 1960. Trinta anos após a grande depressão que abalou a maior potência mundial, a família Brinson luta para tentar se manter de pé, e sobreviver financeiramente.

Jerry (o pai), Jeanette (a mãe) e Joe (o filho), à primeira vista parecem a típica família perfeita, vangloriada em comerciais de margarina. Basta, no entanto, uma segunda olhada para encontrar intensas rachaduras nesta cúpula – como apresentado de forma memorável em Beleza Americana (vencedor do Oscar em 2000). Não bastasse a luta diária para prover à sua família de forma apertada, o patriarca Jerry perde o emprego e conseguir outro se mostra uma tarefa árdua – ao ponto de deixá-lo desesperançoso e deprimido. O fato força sua esposa a contribuir, e também sair em busca do ganha-pão – numa época de transição para a independência feminina, onde tais ocorrências ainda causavam estranhamento social.

Apesar dos grandes nomes, como Jake Gyllenhaal e Carey Mulligan, nos papeis principais do pai e da mãe, tudo é visto e acompanhado através dos olhos do filho do casal, o jovem Joe (Ed Oxenbould). Ele serve como nosso guia pela intimidade de sua família, nos fazendo excursionar por uma fase nostálgica de nossas próprias vidas, e refletir sobre o comportamento da relação de pais e filhos – que sintomaticamente nos molda como as pessoas que viremos a nos tornar. A base de tudo são estes anos formadores, cruciais para o restante de nossas vivências.

Com uma visão extremamente madura, digna de um veterano, o cineasta calouro Paul Dano mostra que aprendeu com os grandes nomes com quem trabalhou – gente como Paul Thomas Anderson, Richard Linklater, Ang Lee, Steve McQueen, Denis Villeneuve, Paolo Sorrentino, entre outros -, se formando com maestria e adquirindo de cada um deles a qualidade necessária para assimilar a postura de um contador de histórias de mão cheia. A sofisticação com que Dano monta cada frame de seu longa é simplesmente de tirar o fôlego. O diretor faz uso de uma das melhores fotografias do ano (garantida de ser lembrada na época de prêmios – se ficar de fora será um disparate) e uma trilha incisiva, que combinadas florescem os sentidos numa experiência única.

Contemplativo e minimalista, Vida Selvagem pode ser considerado dono de uma narrativa quase lisérgica e ritmo deliberadamente lento para alguns, mas sua estética é tão vibrante que se torna impossível desgrudar os olhos da tela. É claro que isso não seria o suficiente caso o texto apresentado não fosse igualmente compelativo. A adaptação é identificável ao extremo e possui um adjetivo muito em falta no cinema mainstream atual: humanidade. Essa é uma história sobre seres humanos errantes e sua rotina, seus deslizes e pecados – inerente de toda e qualquer relação neste planeta.

Quando o pai deixa sua família em função de um arriscado emprego apagando incêndios florestais – muito devido a frustrações pessoais – tal abandono reflete imediatamente nos outros entes desta equação. O filho pródigo ainda vê na figura paterna um exemplo, ansiosamente esperando seu retorno – que pode sequer ocorrer. A mulher, preterida, não assume tal posicionamento e parte ela mesmo atrás de uma forma de sobrevivência – seguindo por caminhos errôneos para uma vida melhor.

A verdadeira protagonista do longa é Jeanette, tomada por uma Carey Mulligan nunca antes vista. Em geral incorporando personagens donas de personalidade similar (a mulher fragilizada e insossa), a jovem britânica entrega aqui seu ponto fora da curva. Mulligan apresenta uma atuação magnética – pela qual somos instantaneamente atraídos, fascinados e totalmente arrebatados. A atriz nunca esteve melhor do que neste desempenho, se despindo até a alma na forma de uma mulher insatisfeita com os rumos que sua vida tomou – recobrando a liberdade e juventude que lhe foram tiradas. Em momentos de diálogos com o filho, Mulligan exprime o máximo de veracidade de suas cenas. Sua entrega é pura explosão e carisma – inéditos na carreira. Vê-la de tal forma, como na cena do jantar na casa do patrão (na qual dança), é impressionante. É possível constatar as características de uma grande atriz – em especial para os que nunca a viram por tal prisma. Se sair indicações a prêmios, será merecido.

Vida Selvagem dialoga com a melancolia e expectativas não cumpridas em âmbitos de nossas vidas. Dano cria um filme belo, triste e real, refletindo unicamente uma parcela da vida, e sendo capaz, inclusive, de transcender a uma produção cinematográfica – elevação que pode causar estranhamento. O realismo, porém, é uma de suas maiores virtudes. E o diretor acrescenta ainda uma parte técnica inspirada e atuações avassaladoras. Quem dera todas as estreias atrás das câmeras pudessem ser assim. Dano, quando sai seu segundo filme?

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