‘Wallace & Gromit’ é uma das franquias multimidiáticas mais populares da cultura britânica e, em 2005, conquistou o restante do mundo com o lançamento do longa-metragem ‘A Batalha dos Vegetais’. Conquistando o Oscar de Melhor Animação por sua estupenda estética cinematográfica e por sua incrível qualidade artística, o filme foi supervisionado pela Aardman Animations (mesma companhia por trás do igualmente aclamado ‘A Fuga das Galinhas’) e reacendeu o interesse de realizadores e cinéfilos pela arte do stop-motion. Agora, duas décadas depois, somos convidados a retornar para esse incrível e instigante cosmos com o lançamento do aguardado ‘Wallace & Gromit: Avengança’.
Na trama, Wallace (Ben Whitehead) e Gromit vivem em sua conhecida e tecnológica casa. Gromit, entretanto, se vê rodeado de mais e mais invenções criadas por seu dono, ficando sobrecarregado com a quantidade de “engenhocas” que, a princípio, deveriam ajudá-los. Porém, com as contas aumentando e o dinheiro escasso, o adorável cachorro percebe que as coisas precisam mudar. Eis que Wallace, ignorando as múltiplas tentativas de aviso de seu melhor amigo, tem a ideia de mais uma invenção: um gnomo-jardineiro conhecido como Norbot (Reece Shearsmith) que logo chama a atenção de seus vizinhos e emerge como uma possível solução de seus problemas.
Todavia, o que eles não imaginavam era que um antigo inimigo, encarcerado no zoológico local após tentar roubar um valioso diamante, estava apenas esperando o momento certo para contra-atacar: Feathers McGraw. O vilanesco pinguim, dotado de uma engenhosidade perigosa, consegue acessar os arquivos secretos de Wallace para mudar a configuração de Norbot e dos outros gnomos-jardineiros a fim de conseguir não apenas se vingar contra os responsáveis por sua prisão (nossos heróis titulares), mas reaver o diamante e fugir impune. E é a partir daí que ambas as tramas se convergem em uma divertida e nostálgica aventura que acerta em quase todas as notas.
Nick Park retorna à cadeira de direção dessa “sequência espiritual”, mas alia-se às habilidosas mãos de Merlin Crossingham para encabeçar o enredo. É notável como a dupla mantém-se fiel não só à estética stop-motion, e sim aos mínimos detalhes que tornam esse mundo da Aardman imediatamente reconhecível: há um emblemático encontro entre passado e presente que torna a ambientação fora de uma cronologia palpável e dentro de uma dimensão única e envolvente do começo ao fim. As engenhocas de Wallace parecem nos situar no tempo e no espaço à medida que constroem apenas um ponto de fixação, abrindo margens para uma sucessão de acontecimentos que são impossíveis e burlescos ao mesmo tempo.
Park também supervisiona a história ao lado de Mark Burton e, ainda que invista bastante em incursões bastante fantasiosas, o roteiro não foge do classicismo da franquia animada e adiciona elementos originais à medida que permanece fiel a uma identidade imaculada. Temos uma clara delineação maniqueísta do bem e do mal; porém, pinceladas inesperadas fornecem mais complexidade a essas personalidades, seja nas pequenas reviravoltas que se acumulam para o clímax, seja no empréstimo de elementos arquetípicos que funcionam dentro de seus próprios limites e a partir de uma praticidade aprazível e condizente às mensagens que precisam ser transmitidas. Ora, temos até uma leve ambição na relação entre Wallace e Gromit que se desenrola no primeiro ato e que é finalizada como previsto.
Em comparação à grandiosidade fílmica do longa anterior, essa nova empreitada pode falhar em não ousar mais do que consegue; todavia, considerando que somos presenteados com breves 80 minutos de tela, persistir em um escopo mais contraído, por assim dizer, é uma jogada sagaz. Em outras palavras, sentimos falta de alguns personagens coadjuvantes de peso (ainda que tenhamos o retorno do Inspetor Albert Mackintosh e a introdução da novata Mukherjee); todavia, o saldo é positivo o suficiente para que terminemos a obra de forma satisfatória.
‘Wallace & Gromit: Avengança’ é uma bem-vinda adição a esse adorado universo animado e uma ótima entrada ao catálogo da Netflix – funcionando tanto como uma revisitação aos fãs de longa data e uma apresentação de personagens icônicos a uma nova geração. Sem sombra de dúvida, uma pedida certa para ver em família e, principalmente, acompanhado dos pequenos.