Durante muito tempo a indústria cinematográfica brasileira centrou suas histórias em apenas um determinado tipo de personagem feminino: a mulher (magra, branca) em crise no casamento porque fora abandonada/traída pelo marido e precisava se redescobrir na vida. Tal narrativa construiu um imaginário de que talvez os únicos problemas sociais femininos fossem desse tipo, e todo o resto estaria bem. Felizmente, porém, na última década um novo olhar vem mudando a forma de representar os corpos e personagens femininos no audiovisual, tornando-os mais plurais e diversos, abordando outros temas e oferecendo outras soluções. Nessa pegada, estreia nos cinemas a partir do próximo dia 23 o filme ‘De Repente, Miss!’.
Quando ficou grávida pela primeira vez, Mônica (Fabiana Karla, de ‘Uma Pitada de Sorte’) decidiu abandonar sua promissora carreira como publicitária para cuidar da gravidez e da família – e nunca se arrependeu dessa escolha. Mas agora, com sua filha Luiza (Giulia Benite, de ‘Chama a Bebel’, tão bonitinha com os cabelos arruivados), no auge da aborrecência dos quinze anos rejeitando tudo que a mãe faz, e seu filho Leo (Gianlucca Mauad) se conectando muito mais com o pai, Mônica se questiona se está sendo uma boa mãe. Para sua surpresa, seu marido, Marcus (João Baldasserini, de ‘Polícia Federal – A Lei é Para Todos’), presenteia toda a família com uma viagem para um resort de luxo em Fortaleza. Apesar de seu medo do mar e sua insegurança emocional, Mônica vê na viagem uma forma de se aproximar da filha, e para tal decide participar de um concurso de Miss promovido pelo hotel com uma adversária jogo-duro como Flavia (Danielle Winits, de ‘Os Farofeiros’).
Mais uma vez o diretor Hsu Chien acerta na escolha precisa de seu elenco e na direção dos atores, construindo laços entre os personagens que favorecem a interação entre eles em suas jornadas pessoais. A música composta por Plínio Profeta e a fotografia de Silvia Gangemi constroem, juntos, o pano de fundo ideal para as férias em família.
Mesmo sendo a vilã na trama, Danielle Winits surpreende por conferir humanidade e carisma a uma personagem que, no fim das contas, a seu modo (torto) também busca ser feliz com suas escolhas. Novamente no protagonismo de uma produção, Fabiana Karla encontra, em Mônica, seu melhor papel até agora, com uma personagem insegura e complexa que, ao contrário do que se pode esperar, não busca uma redenção, mas sim (tal qual a vilã/antagonista) também só busca ser feliz com sua escolha.
O roteiro sensível de Dani Valente retrata as inseguranças maternas de uma forma muito pessoal e, portanto, crível. Mônica não é uma personagem perfeita e nem quer sê-lo, mas busca dar o seu melhor, se esconde nas virtualidades para passar seu conhecimento e não quer receber aplausos – mas também não quer ser desprezada. Assim, a busca, o resgate pela autoestima perdida (por inúmeros motivos) se dá através da alegoria do concurso de miss, mas que, na prática, é sobre ter a segurança de falar o que pensa, para aceitar receber um elogio, de acreditar na solidez dos relacionamentos e acreditar-se, sim, capaz de inspirar pessoas.
Com as participações luxuosas das imparáveis Polly Marinho (‘Uma Carta Para Papai Noel’) e Nany People (‘Quem Vai Ficar com Mário?’) ‘De Repente, Miss!’ é uma história de mãe e filha, mas dialoga com mulheres de todas as idades. Com sorte, abrirá a mente e o coração de muita gente, sobre como devemos ser mais generosos conosco mesmas.