domingo , 24 novembro , 2024

Dica de Filme | Documentário ‘Miss Americana’ apresenta um novo lado de Taylor Swift

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Assim como praticamente qualquer outra esfera do entretenimento, a indústria da música sempre foi dominada por homens – e, mais do que isso, sempre foi reafirmada como livre para eles. Em contrapartida, as mulheres continuam até hoje sendo tratadas como objetos descartáveis cuja expiração ocorre aos 35 anos e que, caso desejem se manter ativas e relembradas, devem se reinventar com uma frequência muito maior que seus conterrâneos. E, enquanto Lady Gaga, Cher e Madonna já falavam sobre isso nos primeiros anos de sua carreira, chegou a vez de Taylor Swift vir à tona para discorrer sobre esse assunto com o documentário Miss Americana, que estreou no começo de 2020 na Netflix.

Seguindo os passos de outras produções do gênero, a ideia da diretora Lana Wilson (conhecida por sua breve filmografia voltada para obras de não-ficção) é humanizar o que muitas pessoas encaravam como uma construção puramente midiática, voltada para o mercado country-pop da música e sem qualquer prospecto de causar impacto significativo. E, na verdade, o começo de carreira de Taylor não fugia muito do que as aparências mostravam ao público: uma jovem loira e branca de dezessete anos do Tennessee que fazia canções de amor, tocava violão e se apresentava para público grandiosos – que alavancaram sua carreira até se tornar uma estrela sem precedentes. A garota, influenciada por Shania Twain e Dixie Chicks, era modelada para agradar às pessoas e não a si mesma, como bem pontua durante o primeiro ato da produção.



Swift nunca deixou de se cobrar ao extremo e, como muitas pessoas suspeitavam desde seu sutil surgimento e sua explosão como um ícone contemporâneo, seu principal objetivo (ao menos nos primeiros álbuns) era fazer o melhor para ser adorada, para não ser criticada, para se neutralizar em meio a polêmicas discussões e nunca deixar que seus apreços políticos, econômicos e sociais tivessem voz. A única voz possível era a de sua música, a de cândidas melodias bem escritas sobre términos, separações e um otimismo onírico que soava extremamente falso – ao passo que vendia horrores e a colocava no topo dos charts. Entretanto, depois de vários obstáculos que enfrentou com o passar dos anos, a performer finalmente percebeu que precisava arrancar a mordaça que a impedia de se postar perante assuntos de extrema importância.

O documentário cumpre quase tudo que se propõe a fazer, transformando uma narrativa que começou há mais de uma década em uma breve e didática explicação que transformou a protagonista no que é hoje. Através de vídeos antigos, teasers de premiações e pequenas fatias de incríveis shows, é notável a mudança estética e psíquica e Taylor desde seu início até hoje – analisando os altos e os baixos que transformaram sua vida numa montanha-russa conturbada e bastante complexa. Mais do que isso, a versão mais recente da cantora e compositora é constantemente colocada em paralelo com o que era, por vezes invadindo os espaços que a mídia utilizava para condená-la ou santificá-la, o que fosse mais conveniente.

Swift parece uma personagem tirada de uma manual de escrita criativa cujos capítulos explicam sobre o desenvolvimento do personagem: seu semblante radiante e adorado pelos fãs era mascarado com uma quietude extrema e uma tendência psicótica ao padrão de beleza que os outros esperavam dela – o que explica suas crises de anorexia que drenavam seu apetite, fosse por comida, fosse pela vida. Como ela bem pontua, “achava que era normal sentir vontade de desmaiar depois de um show”, crédula de que a exaustão era fruto do trabalho duro e da conexão que criava com a audiência – tudo para que ninguém pensasse que era fraca. E, anos mais tarde, ela finalmente compreendeu o que e de quem precisava para ser feliz: de si mesma.

Diferente do que muitos podem imaginar, a cineasta faz o máximo que pode para não transformar a temática de sua obra em um martírio pedante e desnecessário. Aliás, Taylor recusa-se a colocar num pedestal de vítima várias vezes, inclusive nos momentos em que é assediada em pleno tapete vermelho e em que torna-se alvo de chacota pelo rapper Kanye West e por jornalistas e apresentadores sensacionalistas que a chamaram de histérica. O principal problema do longa-metragem é, sem sombra de dúvida, estrutural: Wilson não mergulha tão fundo quanto pode e opta por unir fragmentos superficiais demais para explicar camadas muito densas de uma das figuras mais complexas do cenário fonográfico – e uma que ainda tem muito para nos dar.

Miss Americana insurge como uma perspectiva diferente para alguém que não parecia ou não queria ter mais de um lado. É inegável dizer que Taylor Swift se transformou em uma pessoa mais aberta, acessível, desabafando seus medos e inseguranças em uma trama que ainda está longe de acabar – e que, por essas razões, transformou-se em uma das artistas mais idolatradas do século.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Seguindo os passos de outras produções do gênero, a ideia da diretora Lana Wilson (conhecida por sua breve filmografia voltada para obras de não-ficção) é humanizar o que muitas pessoas encaravam como uma construção puramente midiática, voltada para o mercado country-pop da música e sem qualquer prospecto de causar impacto significativo. E, na verdade, o começo de carreira de Taylor não fugia muito do que as aparências mostravam ao público: uma jovem loira e branca de dezessete anos do Tennessee que fazia canções de amor, tocava violão e se apresentava para público grandiosos – que alavancaram sua carreira até se tornar uma estrela sem precedentes. A garota, influenciada por Shania Twain e Dixie Chicks, era modelada para agradar às pessoas e não a si mesma, como bem pontua durante o primeiro ato da produção.

Swift nunca deixou de se cobrar ao extremo e, como muitas pessoas suspeitavam desde seu sutil surgimento e sua explosão como um ícone contemporâneo, seu principal objetivo (ao menos nos primeiros álbuns) era fazer o melhor para ser adorada, para não ser criticada, para se neutralizar em meio a polêmicas discussões e nunca deixar que seus apreços políticos, econômicos e sociais tivessem voz. A única voz possível era a de sua música, a de cândidas melodias bem escritas sobre términos, separações e um otimismo onírico que soava extremamente falso – ao passo que vendia horrores e a colocava no topo dos charts. Entretanto, depois de vários obstáculos que enfrentou com o passar dos anos, a performer finalmente percebeu que precisava arrancar a mordaça que a impedia de se postar perante assuntos de extrema importância.

O documentário cumpre quase tudo que se propõe a fazer, transformando uma narrativa que começou há mais de uma década em uma breve e didática explicação que transformou a protagonista no que é hoje. Através de vídeos antigos, teasers de premiações e pequenas fatias de incríveis shows, é notável a mudança estética e psíquica e Taylor desde seu início até hoje – analisando os altos e os baixos que transformaram sua vida numa montanha-russa conturbada e bastante complexa. Mais do que isso, a versão mais recente da cantora e compositora é constantemente colocada em paralelo com o que era, por vezes invadindo os espaços que a mídia utilizava para condená-la ou santificá-la, o que fosse mais conveniente.

Swift parece uma personagem tirada de uma manual de escrita criativa cujos capítulos explicam sobre o desenvolvimento do personagem: seu semblante radiante e adorado pelos fãs era mascarado com uma quietude extrema e uma tendência psicótica ao padrão de beleza que os outros esperavam dela – o que explica suas crises de anorexia que drenavam seu apetite, fosse por comida, fosse pela vida. Como ela bem pontua, “achava que era normal sentir vontade de desmaiar depois de um show”, crédula de que a exaustão era fruto do trabalho duro e da conexão que criava com a audiência – tudo para que ninguém pensasse que era fraca. E, anos mais tarde, ela finalmente compreendeu o que e de quem precisava para ser feliz: de si mesma.

Diferente do que muitos podem imaginar, a cineasta faz o máximo que pode para não transformar a temática de sua obra em um martírio pedante e desnecessário. Aliás, Taylor recusa-se a colocar num pedestal de vítima várias vezes, inclusive nos momentos em que é assediada em pleno tapete vermelho e em que torna-se alvo de chacota pelo rapper Kanye West e por jornalistas e apresentadores sensacionalistas que a chamaram de histérica. O principal problema do longa-metragem é, sem sombra de dúvida, estrutural: Wilson não mergulha tão fundo quanto pode e opta por unir fragmentos superficiais demais para explicar camadas muito densas de uma das figuras mais complexas do cenário fonográfico – e uma que ainda tem muito para nos dar.

Miss Americana insurge como uma perspectiva diferente para alguém que não parecia ou não queria ter mais de um lado. É inegável dizer que Taylor Swift se transformou em uma pessoa mais aberta, acessível, desabafando seus medos e inseguranças em uma trama que ainda está longe de acabar – e que, por essas razões, transformou-se em uma das artistas mais idolatradas do século.

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Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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