A reta final de 2023 claramente teve um protagonista no cinema mundial. Feito com um orçamento de uma coxinha e um Guaravita, Godzilla Minus One conquistou fãs do mundo inteiro ao mostrar os horrores da bomba nuclear norte-americana durante a Segunda Guerra Mundial contra o Japão por meio da metáfora do Rei dos Monstros. Escrito e dirigido pelo japonês Takashi Yamazaki, o longa é um resgate à essência do que é Godzilla e se diferencia da franquia da Legendary, que cativa o público por meio da diversão e da galhofa, por abordar o monstro como uma ameaça ao povo, não como um tipo de anti-herói ou força da natureza.
Em outras palavras, é um filmaço de ficção científica carregado de drama e mensagens relevantes. E a melhor parte é que ele acabou de entrar no catálogo da Netflix completamente de surpresa. Sem sombra de dúvidas, é a grande pedida deste fim de semana nos streamings.
Desde que saiu de cartaz, Godzilla Minus One movimentou a base de fãs pelo mundo para cobrar as plataformas de streaming para que adquirissem os direitos de transmissão do filme. Afinal, todos queria revê-lo o quanto antes. Porém, por uma estratégia da Toho Studios, o longa acabou entrando apenas nas plataformas japonesas. Então, não demorou para que Minus One caísse na ilegalidade da internet. O que acabou gerando um debate incomum: os fãs do mundo fizeram campanha para que não baixassem o filme ilegalmente. Do outro lado, os outros fãs reclamavam que ninguém baixaria se a produção estivesse disponível para ser vista.
Felizmente, esse embate agora chega ao fim, porque Godzilla Minus One chegou oficialmente a diversos streamings do mundo neste sábado (1º), incluindo no Brasil. Essa adição ao catálogo da Netflix traz uma chance de ouro para os fãs brasileiros, que é a de assistir o filme no idioma original. Por decisões amplamente questionáveis, as redes que exibiram a ficção nos cinemas optaram por sessões dubladas, deixando o áudio original para sessões de péssimo horário. Ou seja, é muito provável que a maioria dos apaixonados pelo monstro tenha assistido o filme em português.
E isso não é uma crítica à dublagem do filme, que é excelente. Se tem algo que não se pode reclamar é do cuidado que a versão nacional deste longa recebeu. O ponto é que se trata de uma história tipicamente japonesa, produzida, estrelada e construída 100% por japoneses. As atuações trazem pesos diferentes, porque é uma temática extremamente sensível ao elenco original, então é mais intenso ver no idioma original. Para entender melhor, é como se você fosse assistir Cidade de Deus dublado em inglês. O filme continuaria espetacular, mas os palavrões, as gírias e afins não teriam o mesmo impacto.
Godzilla Minus One se passa momentos depois da derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial. O trauma deixado pelo lançamento das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki ainda é muito forte, porque a sociedade ainda tenta se reconstruir. Nesse contexto de puro caos e destruição, com o que restou das famílias inocentes – que nada tinham a ver com a guerra – precisando se reestabelecer em meio a destroços e escombros, o filme acompanha o jovem Kōichi Shikishima (Ryunosuke Kamiki), um kamikaze desertor que presenciou um ataque do Godzilla em uma ilha e se recusou a sacrificar a própria vida pelo batalhão.
De volta a sua vida ‘normal’, Kōichi passa a conviver com a falta de empregos disponíveis e com a nova família que construiu por acaso, enquanto lida com o terror das imagens do monstro e com a vergonha de ser um desertor. Encarado pela sociedade como um covarde, ele vai deixar suas inseguranças de lado ao voltar ao exército para investigar as denúncias de um possível novo ataque inimigo ao Japão. Porém, para seu temor, não é um submarino norte-americano, mas o próprio Godzilla, o monstro que assombrava suas memórias, retornando e pronto para pulverizar a Terra do Sol Nascente com seu raio de radiação.
Agora, em uma luta contra o tempo, ele tentará convencer as autoridades do nível absurdo de monstruosidade que eles enfrentarão, enquanto busca formar um plano para derrotar a criatura antes que seja tarde demais. É uma ficção sobre vingança, luto, honra e sobre os terríveis impactos que uma guerra pode causar não apenas a um país, mas principalmente a seu povo. E ter saído nos cinemas no mesmo ano que Oppenheimer acabou engrandecendo ainda mais Godzilla Minus One, que faz uso da ficção para servir como resposta à visão ocidental sobre a Segunda Grande Guerra.
E o mais impressionante do filme é o que ele fez nos bastidores. Com módico orçamento de 15 milhões de dólares, o longa traz efeitos visuais espetaculares, deixando no chinelo muitas produções de US$ 200 milhões de orçamento. O design do monstro é algo espetacular, dando a ele uma sensação de perigo iminente a cada aparição. E a resposta nas bilheterias foi tão grande quanto a qualidade do filme exibido. Foram aproximadamente 115 milhões de dólares arrecadados mundialmente, fazendo dele o filme japonês do Godzilla de maior bilheteria da história.
Além disso, Minus One fez história no ocidente. Ele se tornou o primeiro filme da franquia Godzilla a ser indicado ao Oscar de Melhores Efeitos Visuais. Aliás, não apenas foi indicado, como também venceu a estatueta mais famosa do cinema mundial. Isso fez dele o primeiro filme de língua não inglesa a levar o Oscar de Melhores Efeitos Visuais.