domingo , 24 novembro , 2024

Disney+ e a ‘Síndrome de George Lucas’

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O Disney+ já é praticamente um sucesso consolidado lá fora. Reunindo filmes, curtas e séries do império Disney, que engloba Disney, Pixar, Lucasfilm, Marvel e Fox, o streaming vem conseguindo polemizar em algumas questões. A principal delas envolve a classificação indicativa das obras que estão no catálogo. O serviço disponibiliza obras de classificação livre até PG-13. O problema é que algumas obras que foram inclusas no catálogo tinham cenas que, no momento, aumentariam a classificação, e, por isso, foram digitalmente alteradas.

Antes e depois do polêmico popô de Splash.

O caso mais famoso é o do filme Splash: Uma Sereia em Minha Vida, que conta a história de um menino que é salvo de um afogamento por uma sereia e a acaba reencontrando com ela 20 anos depois, e assim começa uma divertida aventura sobre amor. Estrelado por Tom Hanks, o filme, lançado em 1984, tem uma cena em que a sereia vai correndo pelada para o mar. Não revela nada demais, apenas um pouco da bunda da atriz Daryl Hannah. Para os executivos da Disney, isso deveria ser retirado do filme para entrar no catálogo. A solução foi colocar um cabelo tosco de CGI tampando o popô da moça. A modificação não foi bem aceita e gerou uma série de reclamações na internet. Um executivo da plataforma ainda comentou que outras cenas foram alteradas.



Um repórter diferente a cada região. Foi assim que a Disney promoveu Zootopia.

O ponto é que a Disney alterar seus próprios filmes não é lá uma grande novidade. Historicamente, o estúdio vem mudando suas obras seja disponibilizando versões diferentes para agradar para agradar a certos mercados, ou apenas para apagar polêmicas passadas. Um exemplo recente disso é o filme Zootopia. O âncora do telejornal teve várias versões. No Brasil, ele foi um Leopardo chamado Boi Chá – dublado pelo saudoso jornalista Ricardo Boechat. Na versão chinesa, ele foi trocado por um panda. E ainda houve mais versões do mesmo personagem. Há o caso também das acusações de racismo acerca dos corvos, em Dumbo. A solução foi cortar a aparição deles do filme.

Os corvos foram removidos de Dumbo por fazerem apologia ao racismo. O problema é que a sequência deles era importante para a trama.

Modificações em obras nunca serão bem vistas pelo público, principalmente em filmes consagrados, como Lilo & Stitch, que teve uma cena em que Lilo se escondia em uma máquina de lavar digitalmente modificada para que ela se escondesse em um armário. A justificativa é que isso poderia incentivar crianças a entrarem em máquinas de lavar, o que seria perigoso. A mesma coisa com o clássico de 1933, Os Três Porquinhos, em que a piada politicamente incorreta dos porquinhos terem uma linguiça pendurada na parede mostrando ser o pai morto deles, foi removida do curta. A intenção pode ser boa, mas a censura não pode e não deve ser aceita jamais.

Visando evitar que crianças entrem em máquinas de lavar, a Disney alterou a cena.

Costumo brincar que isso é a “Síndrome de George Lucas” agindo. Isso porque o diretor começou a editar os próprios filmes assim que teve acesso ao CGI. Essa mania insana de sair picotando e refazendo cenas da trilogia original de Star Wars causou a fúria dos fãs e gerou bizarrices, como o Greedo atirando no Han Solo e Hayden Christensen adulto aparecendo em um filme lançado quando o ator tinha apenas dois anos de idade. Fora a adição de diversos elementos que não acrescentam em nada à trama e servem apenas para poluir o visual. Agora, se um diretor alterando sua obra anos depois já causa desconforto para o público, imagina o efeito disso quando é um estúdio mexendo em obras consagradas? No Brasil, a literatura infanto-juvenil tem em Monteiro Lobato um de seus maiores representantes. O Sítio do Pica-Pau Amarelo está cheio de referências racistas, mas ainda assim a obra não deve ser alterada. Isso porque não é apagando o racismo e atitudes consideradas erradas que esses problemas vão desaparecer. São questões sérias e complicadas que precisam ser discutidas, debatidas e usadas como exemplo para que não se repitam daqui para frente. Se a censura fosse a resposta, não haveria motivo para as pessoas aprenderem história nas escolas. São elementos que refletem o modo de pensar da época, por mais horrível que sejam.

As polêmicas alterações de George Lucas são tema de debate até hoje.

Outras mudanças feitas pelo Disney+ foram a redublagem de algumas séries para remover palavrões e falas de duplo sentido. Alguns episódios de Os Simpsons foram vetados, e a polêmica cena de O Rei Leão, na qual Simba olha para as estrelas e a poeira forma um SFX (homenagem à equipe de efeitos especiais) no céu, teve o efeito removido. Isso porque havia gente que enxergava a palavra SEX (sexo) no lugar de SFX.

A homenagem foi cortada por conta da confusão que causou.

Há algumas semanas, a franquia Percy Jackson voltou a ser assunto por estar com uma nova adaptação sendo preparada para chegar ao Disney+ em breve. No entanto, alguns fãs que resolveram assistir à primeira adaptação, que foi supercriticada, perceberam que uma das poucas sequências que se salvavam desse desastre em forma de filme foi cortada no streaming. A sequência em que eles vão para um hotel e comem uma flor entorpecente, que os desligava da realidade, funcionando como uma metáfora para o uso de drogas, foi removida. Isso dá um indício do que a empresa deve querer da nova série: uma abordagem mais infantil e suavizada.

O criador da saga, Rick Riordan, brincou que o filme inteiro deveria ser apagado, dadas as críticas negativas.

Se fica uma lição disso tudo é que a mídia física, como DVDs e Blu-rays, ainda é a forma mais segura de consumir as obras em suas formas originais. E a lição para a Disney é que apagar o passado nunca é a resposta. Imagina se a MGM ou a Universal inventassem de tentar apagar o politicamente incorreto de animações clássicas, como Tom & Jerry e Pica-Pau. Em vez de tentarem alterar o passado, esses estúdios lançam novas versões das obras, de uma forma que dialogue melhor com a nova geração. Esse é o caminho.

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Pedro Sobreirohttp://cinepop.com.br/
Jornalista apaixonado por entretenimento, com passagens por sites, revistas e emissoras como repórter, crítico e produtor.

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Antes e depois do polêmico popô de Splash.

O caso mais famoso é o do filme Splash: Uma Sereia em Minha Vida, que conta a história de um menino que é salvo de um afogamento por uma sereia e a acaba reencontrando com ela 20 anos depois, e assim começa uma divertida aventura sobre amor. Estrelado por Tom Hanks, o filme, lançado em 1984, tem uma cena em que a sereia vai correndo pelada para o mar. Não revela nada demais, apenas um pouco da bunda da atriz Daryl Hannah. Para os executivos da Disney, isso deveria ser retirado do filme para entrar no catálogo. A solução foi colocar um cabelo tosco de CGI tampando o popô da moça. A modificação não foi bem aceita e gerou uma série de reclamações na internet. Um executivo da plataforma ainda comentou que outras cenas foram alteradas.

Um repórter diferente a cada região. Foi assim que a Disney promoveu Zootopia.

O ponto é que a Disney alterar seus próprios filmes não é lá uma grande novidade. Historicamente, o estúdio vem mudando suas obras seja disponibilizando versões diferentes para agradar para agradar a certos mercados, ou apenas para apagar polêmicas passadas. Um exemplo recente disso é o filme Zootopia. O âncora do telejornal teve várias versões. No Brasil, ele foi um Leopardo chamado Boi Chá – dublado pelo saudoso jornalista Ricardo Boechat. Na versão chinesa, ele foi trocado por um panda. E ainda houve mais versões do mesmo personagem. Há o caso também das acusações de racismo acerca dos corvos, em Dumbo. A solução foi cortar a aparição deles do filme.

Os corvos foram removidos de Dumbo por fazerem apologia ao racismo. O problema é que a sequência deles era importante para a trama.

Modificações em obras nunca serão bem vistas pelo público, principalmente em filmes consagrados, como Lilo & Stitch, que teve uma cena em que Lilo se escondia em uma máquina de lavar digitalmente modificada para que ela se escondesse em um armário. A justificativa é que isso poderia incentivar crianças a entrarem em máquinas de lavar, o que seria perigoso. A mesma coisa com o clássico de 1933, Os Três Porquinhos, em que a piada politicamente incorreta dos porquinhos terem uma linguiça pendurada na parede mostrando ser o pai morto deles, foi removida do curta. A intenção pode ser boa, mas a censura não pode e não deve ser aceita jamais.

Visando evitar que crianças entrem em máquinas de lavar, a Disney alterou a cena.

Costumo brincar que isso é a “Síndrome de George Lucas” agindo. Isso porque o diretor começou a editar os próprios filmes assim que teve acesso ao CGI. Essa mania insana de sair picotando e refazendo cenas da trilogia original de Star Wars causou a fúria dos fãs e gerou bizarrices, como o Greedo atirando no Han Solo e Hayden Christensen adulto aparecendo em um filme lançado quando o ator tinha apenas dois anos de idade. Fora a adição de diversos elementos que não acrescentam em nada à trama e servem apenas para poluir o visual. Agora, se um diretor alterando sua obra anos depois já causa desconforto para o público, imagina o efeito disso quando é um estúdio mexendo em obras consagradas? No Brasil, a literatura infanto-juvenil tem em Monteiro Lobato um de seus maiores representantes. O Sítio do Pica-Pau Amarelo está cheio de referências racistas, mas ainda assim a obra não deve ser alterada. Isso porque não é apagando o racismo e atitudes consideradas erradas que esses problemas vão desaparecer. São questões sérias e complicadas que precisam ser discutidas, debatidas e usadas como exemplo para que não se repitam daqui para frente. Se a censura fosse a resposta, não haveria motivo para as pessoas aprenderem história nas escolas. São elementos que refletem o modo de pensar da época, por mais horrível que sejam.

As polêmicas alterações de George Lucas são tema de debate até hoje.

Outras mudanças feitas pelo Disney+ foram a redublagem de algumas séries para remover palavrões e falas de duplo sentido. Alguns episódios de Os Simpsons foram vetados, e a polêmica cena de O Rei Leão, na qual Simba olha para as estrelas e a poeira forma um SFX (homenagem à equipe de efeitos especiais) no céu, teve o efeito removido. Isso porque havia gente que enxergava a palavra SEX (sexo) no lugar de SFX.

A homenagem foi cortada por conta da confusão que causou.

Há algumas semanas, a franquia Percy Jackson voltou a ser assunto por estar com uma nova adaptação sendo preparada para chegar ao Disney+ em breve. No entanto, alguns fãs que resolveram assistir à primeira adaptação, que foi supercriticada, perceberam que uma das poucas sequências que se salvavam desse desastre em forma de filme foi cortada no streaming. A sequência em que eles vão para um hotel e comem uma flor entorpecente, que os desligava da realidade, funcionando como uma metáfora para o uso de drogas, foi removida. Isso dá um indício do que a empresa deve querer da nova série: uma abordagem mais infantil e suavizada.

O criador da saga, Rick Riordan, brincou que o filme inteiro deveria ser apagado, dadas as críticas negativas.

Se fica uma lição disso tudo é que a mídia física, como DVDs e Blu-rays, ainda é a forma mais segura de consumir as obras em suas formas originais. E a lição para a Disney é que apagar o passado nunca é a resposta. Imagina se a MGM ou a Universal inventassem de tentar apagar o politicamente incorreto de animações clássicas, como Tom & Jerry e Pica-Pau. Em vez de tentarem alterar o passado, esses estúdios lançam novas versões das obras, de uma forma que dialogue melhor com a nova geração. Esse é o caminho.

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