Divergente não diverge muito do que é visto no subgênero
Podem imaginar a disposição dos críticos de cinema adultos ao receberem a notícia de que terão que encarar mais um filme baseado em um livro de ficção e aventura juvenil. Para ser justo e não dizer que isso é tudo o que é feito atualmente na meca do cinema, podemos afirmar também um certo desgaste nas refilmagens e adaptações de quadrinhos de super-heróis. É claro também que nada disso importa se as obras forem de fato boas. Afinal ninguém reclama da fonte de um bom exemplar cinematográfico, só dos ruins.
E o problema é justamente esse. Temos muitos exemplares ruins do subgênero. Ao ponto de perdermos a conta. Desde que Harry Potter deu (muito) certo, Hollywood despertou para a coisa e terminou por encorajar todo tipo de escritor. Daí vieram Crepúsculo e Jogos Vorazes, de qualidades variadas, mas sucesso inquestionável. E quem não quer garantir seus milhões. Sem dúvidas Dezesseis Luas, A Hospedeira, Percy Jackson, A Bússola de Ouro, Os Instrumentos Mortais e outros tentaram.
Agora chega a vez de Divergente, ficção infanto-juvenil da escritora Veronica Roth (por si só uma jovem de 25 anos). É claro que a “menina autora” bebe na fonte de Harry Potter (a seleção de qual casa você irá ficar), Jogos Vorazes (treinamentos e combates intensos para o público mais novo) e infelizmente de A Hospedeira e Os Instrumentos Mortais também (com uma protagonista que é a predestinada). A bola da vez é Tris, personagem da bela e talentosa Shailene Woodley.
Woodley marcou presença provando que é boa atriz em obras como Os Descendentes (2011, indicado ao Oscar de Melhor Filme) e The Spectacuar Now (2013, romance superelogiado saído de Sundance e ainda inédito no Brasil). A carreira da menina tem tudo para decolar e aqui ela investe numa superprodução mirada ao público jovem para se tornar uma estrela. No texto de Roth, o mundo do futuro é dividido por facções trabalhistas, definidas por suas aptidões.
Ao completar certa idade, os jovens perante um conselho, escolhem suas facções. Para isso colocam o chapéu selet… ops, digo, cortam a mão e deixam uma gota de sangue cair na vasilha do grupamento específico. Os pais de Tris são altruístas importantes e influentes. Tal classe é a regente deste mundo futurístico. Seu trabalho consiste em ajudar os pobres, algo mais caridoso impossível. Porém, ao contrário do que esperam seus pais (vividos por Tony Goldwin e Ashley Judd), a pequena Tris tem aspirações maiores e sonha com os audaciosos – membros de uma força de elite designada para proteger todos nesta sociedade.
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E para isso, essa tropa de elite do futuro possui um treinamento puxado o bastante, e que faria orgulhoso o Capitão Nascimento, ou seu primo do futuro, RoboCop. Mas espera, as coisas não param por aí. Acontece que em uma pré-seleção, a protagonista se descobre uma Divergente – nome dado àqueles cujo teste é inconclusivo. O segredo é mantido entre ela e Tori, a tatuadora/membro do governo que realiza o teste!?, vivida por Maggie Q. É claro também que o segredo não ficará mantido por muito tempo, e a severa Jeanine (Kate Winslet) está sempre a um passo da verdade.
Brincadeiras à parte, Divergente possui seus méritos. E o maior deles é manter interessante e de forma bem explicada todos esses elementos citados nessa descrição, que soam muito mais complicados na minha sinopse do que no desenvolvimento do filme em si. Parte disso se deve ao diretor Neil Burger, cineasta especialista em esmiuçar tramas complexas, vide O Ilusionista (2006) e Sem Limites (2011). Os atores se saem bem e Shailene Woodley tem carisma suficiente para se tornar uma estrela. Seu par no filme, o misterioso Quatro (Theo James), apesar do visual de galã, desempenha bem sua faceta dura.
Uma curiosidade quanto ao elenco é que neste filme Woodley atua ao lado de dois pares românticos seus de outros projetos – e em personagens bem opostos. Do citado The Spectacular Now, Miles Teller vive Peter aqui, o antagonista e principal rival da menina. E Ansel Elgort, que aqui é Caleb – o irmão da protagonista, vive seu par amoroso no ainda inédito A Culpa é das Estrelas. Apesar de manter um bom ritmo até um pouco mais de sua metade, Divergente descarrila em seu terceiro ato totalmente. O filme causa um efeito totalmente contrário de seu “primo” Jogos Vorazes, no qual o desfecho do segundo episódio nos deixou aguando pelo próximo.
O terceiro ato de Divergente é tão corrido, que sinceramente não nos importamos muito com o que virá a seguir. E aparentemente não parece bom. Isso vindo de um filme que teve 139 minutos para se desenvolver. Talvez a culpa seja mesmo da estrutura do texto original. Seja como for, é válido recomendar Divergente. O filme não é o desastre que aparentava, o que para muitos pode ser um alívio. Se para mais nada, é válido para ver a Oscarizada Kate Winslet (mesmo que numa ponta bem pequena) tentando esconder sua barriga de grávida com o figurino e em quase todas as cenas com uma pasta na frente do corpo.