007 – Sem Tempo para Morrer, o vigésimo quinto filme oficial da franquia mais duradora do cinema, tem estreia programada em nova data para o dia 30 de setembro de 2021 exclusivamente nos cinemas – após ser adiado do ano passado devido à pandemia. Como forma de irmos aquecendo os motores para esta nova superprodução que, como dito, faz parte de uma das maiores, mais tradicionais e queridas franquias cinematográficas da história da sétima arte, resolvemos criar uma nova série de matérias dissecando um pouco todos os filmes anteriores, trazendo a você inúmeras curiosidades e muita informação.
Para a alegria de muitos fãs, o eterno 007 Sean Connery retornava ao papel doze anos após tê-lo abandonado em Os Diamantes São Eternos (1971). Para a tristeza dos mesmos, Nunca Mais Outra Vez nada mais era do que um remake de A Chantagem Atômica (1965), numa produção fora da franquia oficial da EON. Além disso, o filme seria lançado em 1983, mesmo ano em que Roger Moore estrelaria Octopussy, seu sexto longa na pele do espião James Bond. Sentiram o tamanho da encrenca? Confira abaixo detalhes desta que é uma das mais curiosas obras a levar a marca do personagem, no ano que ficou conhecido como o duelo entre os James Bond.
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Produção
Como eu havia dito anteriormente na matéria de A Chantagem Atômica (1965), o quarto filme estrelado por Sean Connery na franquia oficial, antes de fazer sucesso e vender os direitos de seus livros para a produtora EON Pictures de Albert R. Broccoli e Harry Saltzman, o escritor Ian Fleming havia tentado emplacar o roteiro de uma possível adaptação de James Bond para o cinema. Para tal, ele fez parceria com o famoso produtor Kevin McClory (de A Volta ao Mundo em 80 Dias). Como não conseguiu vender o tratamento, McClory decidiu então transformar tal roteiro no livro Thunderball (o título original de Chantagem Atômica). O problema é que Fleming não creditou o texto ao produtor, que o ajudou a desenvolve-lo.
Depois que a EON comprou os direitos dos livros de Fleming e decidiu construir uma franquia no cinema, quando chegou a vez de levar A Chantagem Atômica às telas, um acordo foi feito com McClory em que ele constava como único produtor daquele longa, enquanto Broccoli e Saltzman apenas “apresentavam” a produção. Fora isso, outro acordo foi feito para que McClory só pudesse criar sua própria produção dez anos depois – na época, a dupla da EON acreditava que os filmes de 007 já teriam perdido o gás àquela altura. Pouco sabiam.
McClory foi insistente e não desistiu de sua ideia. Ele desenvolveu o roteiro de sua produção que na época seria chamada de “James Bond do Serviço Secreto” e contratou ninguém menos que Sean Connery, não para estrelar, mas para ajudar no roteiro. Claro, tudo uma desculpa para depois atraí-lo a protagonizar o longa também. Mas a brincadeira não acabava aí. Vendo que a franquia só ganhava mais força com o passar dos anos, Broccoli tratou de impedir legalmente que McClory lançasse o seu filme e a produção ficou estagnada por anos. Até que em cena entrou Jack Schwartzman, advogado sensação do ramo de entretenimento que se colou com McClory e garantiu sua versão junto da Warner. Schwartzman era um destes advogados “tubarões” e ninguém do corner de Broccoli era páreo para ele. E sim, o advogado de McClory é o pai do ator Jason Schwartzman e marido de Talia Shire, a Connie de O Poderoso Chefão e a Adrian de Rocky.
Após um longo embrolho, finalmente a versão de McClory para o personagem sairia do papel. E não apenas isso, como também teria nenhum outro senão Sean Connery de volta ao personagem. No mesmo ano a EON tratou de resgatar Roger Moore da aposentadoria para o duelo definitivo entre os dois James Bond. E por um momento ambos seriam lançados na mesma época para um verdadeiro “arranca-rabo”. Em casos assim, alguém sempre “amarela” e aqui McClory, com medo de tomar uma surra nas bilheterias, decidiu adiar sua superprodução – com um orçamento de US$36 milhões, então o filme mais caro do agente secreto – para o fim do ano.
Para a direção, McClory, Schwartzman e a Warner optaram por um nome quente da época. Irvin Kershner acabava de sair do comando de uma obra que se tornava uma das mais bem sucedidas do cinema e o terceiro arrasa-quarteirão da história – é claro que se trata de O Império Contra-Ataca (1980), então o segundo episódio na franquia Star Wars.
James Bond
Como dito, o título do filme viria bem a calhar, pois Nunca diga Nunca Outra Vez (na tradução literal do original – chamado Nunca Mais Outra Vez no Brasil) trazia Sean Connery de volta ao papel, algo que o ator havia jurado não reprisar. Essa era sua sétima investida no personagem, pairando uma acima então de Roger Moore (mas como sabemos, Moore ainda estrelaria um último filme após 1983, talvez para se equivaler a Connery). Uma curiosidade é que foi a esposa de Sean Connery, Micheline Roquebrune, quem optou pelo título “desaforado”, tirando uma com a cara do marido. Já que a inicialmente, os produtores intitulavam a obra como James Bond do Serviço Secreto.
O que muitos fãs apontam é que Sean Connery aparentava melhor forma aqui aos 53 anos de idade, do que em Os Diamantes São Eternos (sua investida anterior), aos 41 anos. Fora isso, o ator parece realmente ter se divertido e estar inspirado neste novo longa. Ao contrário do episódio anterior citado em que o ator apenas descontava seu cheque para ir se divertir nos bastidores de Las Vegas.
Missão Secreta
Apesar de ser um novo exemplar de 007 com Sean Connery, devido a ações legais, os produtores não possuíam muito espaço para se mexer ou ir além em relação à história. Havia sido estipulado que McClory poderia reutilizar somente o que criara com A Chantagem Atômica – o que entre outras coisas tirava Blofeld e a SPECTRE das mãos da EON. E assim foi feito: Nunca Mais Outra Vez é uma versão “remixada” de A Chantagem Atômica – contando a mesma história com os mesmos personagens, porém, de uma forma um pouco diferente, mais dinâmica e alterando algumas cenas e situações.
Na trama, um James Bond mais velho nas formas de Connery é retirado da aposentadoria para cuidar de um caso envolvendo o roubo de ogivas nucleares. E sim, além de Bond, temos na história novamente personagens como Blofeld, Largo e Domino, mas Fiona era substituída por Fatima.
Bondgirls e Aliados
Se tem um elemento que Nunca Mais Outra Vez consegue destaque (além de trazer Connery de volta ao papel, é claro) é em seu elenco – um dos melhores da franquia, mesmo não sendo parte do cânone. Em matéria de Bondgirls, a principal é uma Kim Basinger bem novinha, aos 29 aninhos, em seu terceiro filme no cinema após uma bem sucedida carreira como modelo. A loira estonteante foi a escolhida para ser a nova Domino no cinema, substituindo a morena francesa Claudine Auger no mesmo personagem em A Chantagem Atômica. Basinger está simplesmente estonteante.
Porém, talvez para a surpresa geral, quem rouba todas as cenas em Nunca Mais Outra Vez é a Bondgirl do mal, Fatima que é a versão moderna da ruiva Fiona (da italiana Luciana Paluzzi) em A Chantagem Atômica. Fatima possui um latente sex appeal nas formas da exuberante morena nicaraguense Barbara Carrera que, acredite, foi indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz coadjuvante pelo filme! Carrera, igualmente belíssima, ficou conhecida por seus papeis em A Ilha do Dr. Moreau (1977), O Dia em que o Mundo Acabou (1980), Condorman – O Homem-Pássaro (1981) e A Madrasta (1989).
Fora o duelo de beldades, Nunca Mais Outra Vez também trazia substitutos para o chefe M (Edward Fox), o inventor Q (Alec McCowen), Moneypenny (Pamela Salem) e inclusive uma participação de Rowan Atkinson, o eterno Mr. Bean, como o atrapalhado agente Small-Fawcett – antes de sua investida em sua própria série de espião com Johnny English. Fora isso, esse remake pode se orgulhar de trazer a primeira versão do usual colaborador de Bond na CIA, Felix Leiter, vivido por um ator negro com Bernie Casey no papel, muitos anos antes de Cassino Royale (2006).
Vilões
É claro que o produtor Kevin McClory não iria deixar barato e aproveitaria com gosto seu direito de usar o maior vilão da franquia, Blofeld. Diferente de todas as suas outras interpretações no passado, onde havia sido representado por atores como Donald Pleasence, Telly Savalas e Charles Gray, quem herdava o papel aqui era o renomado Max von Sydow, famoso por “dramas de arte”. Apesar de seu talento performático indiscutível, Sydow não entrega um desempenho, digamos, muito memorável na pele de Blofeld, tanto que além de não ser citado como favorito dentre os intérpretes do vilão, muitos sequer lembram de sua participação no filme.
Por outro lado, o igualmente celebrado Klaus Maria Brandauer (indicado ao Oscar) entrega um desempenho mais humano e realista para o “número 2” Largo. Sem o uso do tapa-olho visto em Adolfo Celi (A Chantagem Atômica), Brandauer é capaz de criar um antagonista mais identificável, permanecendo na mesma linha que viríamos a receber mais para frente na franquia nas versões atuais de vilões.
Relatório
Por incrível que pareça, a volta de Sean Connery para o personagem que ajudou a eternizar terminou ficando abaixo de seu “rival” naquele ano, a décima-terceira produção oficial da EON, Octopussy, onde 007 era vivido por Roger Moore. Era como se o segundo preferido houvesse de fato sobrepujado o número um em um duelo de titãs. Tudo bem que McClory e a Warner haviam ficado presos na armadilha de refilmar A Chantagem Atômica e não tinham muito para onde ir além daquela história. Mesmo assim, Nunca Mais Outra Vez foi um sucesso, arrecadando uma bilheteria bem favorável. Só não fez tanto dinheiro ou sucesso quanto Octopussy.
O que a maioria dos fãs e críticos concordam é que a volta de Sean Connery ao papel merecia um filme maior e melhor. Não que seja uma fraca investida no personagem, mas apenas rendeu um filme rotineiro com o espião, algo que já era muito visto a esta altura em diversas produções do cinema.
Fora isso, McClory ainda pensava em realizar sua própria franquia não oficial fora da EON e queria Connery de volta para protagoniza-la. É claro que o astro prontamente recusou, fazendo de Nunca Mais Outra Vez sua última incursão na pele do personagem. Apesar disso, McClory ainda chegou a escrever mais um roteiro para uma nova aventura intitulada Warhead, a qual esperava lançar na década de 1990, a ser estrelada por Liam Neeson. Já imaginou?
No duelo entre os 007 mais famosos, Roger Moore e Octopussy levaram a melhor, o que faria o ator a retornar para um último round na pele do agente secreto. O que você confere aqui no próximo Dossiê.