‘Game of Thrones’ acabou, e nós mal podemos acreditar que estamos dizendo essa frase. Alguns gostaram do final, muitos ficaram decepcionados. Amem ou odeiem, o último episódio foi exibido, e um diálogo chamou a atenção, porque é justamente ele que explica toda a intenção desta última e polêmica temporada da série. Pensando nisso, resolvi explicar este que, a meu ver, é o ponto principal do último capítulo da série. Assim, a partir de agora a reportagem contém spoilers.
Tudo começa quando Tyrion Lannister é levado como prisioneiro pelo Verme Cinzento para ser julgado por um Conselho formado por representantes de todas as principais Casas de Westeros. Ele fora preso por Daenerys, acusado de traição. Verme Cinzento começa a exigir justiça para o Imp, mas Tyrion ressalta, por duas vezes, que não cabe a ele decidir, apontando que essa função seria do rei ou rainha dos Sete Reinos. Na falta de um governante, Tyrion sugere que eles mesmos elejam um novo rei ou rainha, uma vez que eles são as pessoas mais importantes do reino. A despeito do que o coitado do Sam Tarly sugere – de iniciar uma democracia e delegar a votação ao povo –, os Lordes e Ladies concordam que uma eleição entre eles é a melhor solução.
Tyrion, então, começa um discurso que, mais do que um mero diálogo de personagem, traz, em si, a essência da ‘Canção de Gelo e Fogo’.
Ele começa a explicar que pensou muito no assunto e que chegou à conclusão de que o que une as pessoas não são as guerras, os casamentos ou os reinos: o que une as pessoas são as histórias, uma boa história. Assim, a próxima pessoa a governar os sete (bom, agora seis) reinos teria que ser uma pessoa que contivesse todas as histórias do reino, que tivesse testemunhado os acontecimentos, ou seja, que fosse a memória de uma nação. Daí, então, a melhor opção ser Brandon Stark, o Quebrado, aquele que caiu da torre e sobreviveu; que, incapaz de andar, aprendeu a voar e a ver; e que, vendo, observou o passado e o futuro e atingiu a sabedoria que os homens mundanos jamais conseguirão. Em outras palavras, Brandon Stark é o museu vivo de Westeros.
Como sugeri em minha outra matéria, Bran é o personagem que viu tudo, o detentor de conhecimento e, por isso, poderia se tornar o narrador da história, ou mesmo o autor. Assim, temos duas representações para a importância de Bran na história.
Figurativamente, dentro das ‘Crônicas de Gelo e Fogo’, Brandon seria o próprio George Martin, e Tyrion Lannister o contador da história. Ou seja, Brandon, a memória do povo, é aquele capaz de registrar e contar as histórias e os feitos dos heróis da trama, mas, para tal, precisa de Tyrion como sua Mão (literalmente), porque, afinal, dentro daquele universo fictício, o anão seria seu narrador. Este seria o primeiro significado de ambos, dentro da compreensão e do mundo dos personagens, pelo viés de quem viveu a história.
Em outra medida, podemos enxergar Brandon Stark como uma alegoria do próprio espectador – e, a meu ver, esta é a abordagem que tanto os roteiristas quanto a própria HBO querem que nós tenhamos.
Brandon está sempre sentado, assistindo a tudo sem interferir – ou pouco interferindo. Ele sabe toda a história, e pode ver tanto passado quanto futuro (como nós, que podemos rever os episódios e ver teasers do que estava por vir). Ele é o guardião da memória, aquele que vai cantar a história dos heróis aos quatro ventos e manter ‘As Crônicas de Gelo e Fogo’ viva eternamente. Agora, pensem: quem, senão nós, espectadores, viu tudo, lembra de tudo, contou a história de ‘Game of Thrones’ pra todo mundo nos últimos dez anos, levantou teorias, se emocionou, amou e odiou tudo o que aconteceu? Nós, os fãs.
Assim, figurativamente, Brandon Stark é a representação dos fãs. E, uma vez que Drogon destruiu o Trono de Ferro, não há mais trono para sentar, porém, Brandon sempre teve seu próprio trono, que o conduziu por toda a série, de inúmeras maneiras. E para quem acha que essa análise é uma viagem, sugiro olhar a mensagem divulgada ontem pela própria HBO, em que a empresa agradece ao elenco, à equipe e, principalmente, aos fãs de GOT e diz: nós dobramos o joelho para vocês.
E para quem se dobra o joelho, se não a um rei?
É claro que sabemos das teorias levantadas de que Tyrion, na verdade, teria conspirado para que elegessem Brandon para, assim, ele mesmo poder governar. Ou a hipótese de Brandon ser um golpista, que sabia de tudo desde o início e deixou que tudo acontecesse, só para banir o irmão (agora primo) pra Muralha e isolar a irmã em Winterfell, para que ele tivesse o poder (bom, neste caso, Dr. Estranho também seria um baita de um golpista em ‘Vingadores: Guerra Infinita’, pela mesma razão), embora isso vá de contra tudo que o personagem viveu em sua jornada. Sabemos, claro, que a origem de ‘Game of Thrones’, o livro, é política, e que o jogo pelo trono tem seus posicionamentos ideológicos. Porém, acreditamos que o objetivo de David Benioff e D. B. Weiss, roteiristas da série, ao eleger Brandon como o novo rei dos seis reinos, era pura e simplesmente prestar uma grande homenagem ao fã e ao criador da série, George Martin, ao mesmo tempo. Porque, como Tyrion mesmo disse, uma história, uma boa história uniu a todos nós, fãs, assim como uma boa história seria reunida e contada através de Brandon Stark, O Quebrado, Primeiro de Seu Nome, Rei dos Seis Reinos. Sinceramente, essa é uma escolha muito bonita, e prefiro acreditar nela.