Desde que acertou a parceria com a Disney para compartilhar o Homem-Aranha com o Universo Cinematográfico Marvel, a Sony começou a experimentar bilheterias que jamais tinha alcançado com o herói. A escolha de Tom Holland para o papel principal criou uma ponte legal com o público jovem e suas participações nos filmes dos Vingadores agradaram aos fãs em geral. Com isso, o estúdio começou a desenvolver seu próprio projeto para explorar o universo do Cabeça de Teia sem necessariamente precisar envolver o Homem-Aranha nisso. No entanto, esse projeto acabou gerando filmes episódicos, tanto para os personagens geridos diretamente pela Sony quanto para os filmes solo do Aranha da Marvel. Isso pode não ser um problema para alguns, mas acaba criando filmes muito abaixo do que os personagens podem render.
Quando lançado, Homem-Aranha: De Volta ao Lar (2017) veio na ressaca de Capitão América: Guerra Civil (2016), após a brilhante introdução do herói no MCU. Era a primeira aventura solo do Teioso de Tom Holland nesse universo mágico, no qual, nos quadrinhos, o Aranha é um dos pilares. Porém, a história desse filme não agregou em muito àquele universo, tampouco trouxe uma trama grandiosa que fizesse justiça à expectativa criada ao seu entorno. Ao optar por uma história de menor impacto, mas ainda precisando inserir a megalomania do mundo dos Vingadores, o longa saiu como um filho de pais divorciados. Sem saber se abraça o lado do pai ou da mãe, De Volta ao Lar não consegue ir a fundo na abordagem intimista de uma história mais voltada para o lado Amigão da Vizinhança e também não chega a grandiosidade dos Heróis Mais Poderosos da Terra. É praticamente uma aventura “filler”, assim como aquelas revistinhas mensais que saíam entre uma grande saga e outra que precisavam ser lançadas para que o público se mantivesse fiel ao herói, mesmo que não acrescentasse muito para a mitologia do personagem. Estava ali para “cumprir tabela”.
Mesmo assim, De Volta ao Lar foi um bom filme, que fez boa bilheteria e recebeu boas críticas. Diante desse cenário positivo, a Sony colocou em desenvolvimento seu plano de ter um universo próprio voltado para o herói sem precisar necessariamente dele. Vale lembrar que a ideia desses spin off‘s vinha desde a fracassada franquia estrelada por Andrew Garfield, que, segundo depoimentos e especulações, pretendia explorar um filme do Sexteto Sinistro, da Gata Negra e até mesmo um longa dedicado à Tia May. Mas, com o mau desempenho da saga, esses projetos foram por água abaixo. Com o sucesso das aparições de Tom Holland, era hora de reviver esse “AranhaVerso”. O primeiro filme, obviamente, foi voltado para um dos maiores vilões do herói, o Venom.
Estrelado por Tom Hardy, o longa foi um fracasso colossal de críticas, virando piada no meio cinematográfico e sendo menosprezado por muitos. No entanto, a bilheteria foi surpreendente, chegando muito próxima da casa do bilhão. Com essa fortuna, a Sony prontamente aprovou a sequência e o próximo spin off: Morbius. É interessante ver como Venom (2018) conseguiu mesmo dar esse pontapé inicial numa franquia sobre um vilão sem precisar do herói para sustentá-lo. É uma história boba e voltada para a comédia que consegue se manter, mas segue com o problema dos bastidores influenciando na trama. Em vários momentos, o roteiro faz pequenas referências ao Homem-Aranha, mas sem especificar qual versão do herói poderia ser aquela. Isso porque, na época, havia uma expectativa dos executivos de que Venom fosse integrado ao MCU, o que viria a render um embate entre empresas que quase terminou com a saída precoce do Aranha de Tom Holland do Universo Cinematográfico Marvel.
Enquanto isso, no MCU, as participações do Homem-Aranha seguiam melhorando e fazendo a alegria dos fãs em filmes como Vingadores: Guerra Infinita (2018) e Vingadores: Ultimato (2019). Esse crescimento do personagem nos filmes grandes da Disney só faziam com que suas aventuras solo – que nunca foram efetivamente “solo”, já que contavam com outros heróis da casa influenciando muito no roteiro – tivessem mais esse jeito de filmes episódicos. A confirmação disso veio em 2019, com Homem-Aranha: Longe de Casa, que acabou trazendo mais uma história que não se decidiu entre se render à grandiosidade do MCU ou seguir mais fiel ao universo próprio do Aranha, criando outra aventura indecisa e com consequências menores, além de seguir apoiando o herói em outros heróis da empresa, como se o Homem-Aranha por si só não fosse o bastante para sustentar um filme. A resposta da crítica foi novamente positiva, assim como a bilheteria, que bateu US$ 1 bilhão em um filme “solo” do herói pela primeira vez, o que encheu os olhos – e os bolsos – da Sony para negociar um novo acordo com a Disney, senão tiraria o herói do MCU sem mais nem menos. Foi uma batalha de bastidores gigante que terminou com a Disney cedendo aos desejos da Sony, incluindo aquele antigo de colocar o Venom no MCU.
Assim, Venom: Tempo de Carnificina (2021) chega aos cinemas em mais uma aventura episódica, que usa um tempo brincando com o que virá no futuro, mas que desenvolve de forma estranha – não que isso seja negativo – a relação de Eddie Brock com o simbionte Venom, enquanto enfrentam um dos vilões clássicos do herói nos quadrinhos, o Carnificina (Woody Harrelson). Mesmo não sendo lá essas coisas, os dois filmes do anti-herói conseguem desenvolver bem seu protagonista, um ponto polêmico quando o assunto é o Homem-Aranha, já que alguns fãs acreditam que o Peter consegue se desenvolver mais nos filmes dos Vingadores/ Capitão América do que em suas aventuras solo. E com essa provável união dos personagens se consolidando por conta do vindouro Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa (2021), é possível que esse ciclo de filmes episódicos do “AranhaVerso” acabe de vez ou se amplifique ainda mais.
Fato é que o Homem-Aranha e se universo podem até funcionar sem se comunicarem tanto, como está acontecendo no momento, mas jamais atingirá seu potencial de aventura e drama sem colaborarem um com o outro. Por isso a pós-créditos de Tempo de Carnificina é tão promissora e tão animadora. Fazer essa ponte entre os dois universos pode ser a chave para novos projetos maravilhosos e com potencial enorme. Basta saber se as duas empresas por trás dos personagens vão se entender ou se vão seguir achando bom trazer apenas aventuras indecisas que não fazem justiça aos personagens.
Venom: Tempo de Carnificina está em cartaz nos cinemas do Brasil.