Desde sua estreia oficial no cenário da música com seu álbum homônimo, Taylor Swift mostrou que veio para ficar.
A cantora e compositora, detentora de nada menos que catorze estatuetas do Grammy e uma estatueta do Emmy, sempre teve uma inegável habilidade de construir histórias através de uma lírica certeira e de metáforas muito bem construídas. Fosse explorando as vertentes do country e abrindo portas para uma nova geração de artistas femininas em um gênero dominado pela perspectiva masculina, ou então reinventando-se com o pop para expandir seu império e angariar ainda mais fãs ao redor do planeta. Não é surpresa que, através desses complexos enredos (ao menos em sua maioria), Swift tenha se consagrado como uma zeitgeist de sua geração, causando grande impacto através de seus álbuns e de suas turnês.
Um dos elementos de maior apreço por parte dos fãs é a sua capacidade de repaginação. Seus três primeiros álbuns, ‘Taylor Swift’, ‘Fearless’ e ‘Speak Now’ mergulharam nas construções do country e serviram de base para histórias de romance e de coração partido que condiziam com sua imagem – o último citado, inclusive, foi uma das primeiras respostas às falsas alegações de que Swift não compunha suas músicas, ficando totalmente responsável pela escrita das canções. Em 2012, com ‘Red’, a performer começou a denotar uma mistura entre o country e o pop, explorando território um tanto quanto desconhecido que viria a se firmar com seus três projetos subsequentes – ‘1989’, ‘Reputation’ e ‘Lover’.
Em 2020, prestes a completar trinta anos, Taylor apostaria fichas em um dos pontos mais determinantes de sua carreira com o inesperado anúncio de ‘folklore’. Aqui, ela abandonou a estética do pop e se enclausurou em belíssimas arquiteturas intimistas e angustiantes, dando origem a um universo bastante idiossincrático e diferente de tudo o que já nos havia entregado – apostando fichas em literárias rendições como “august”, “seven” e “cardigan” em uma celebração do folk e do appalachian folk. Algo similar aconteceria com o álbum-irmão ‘evermore’, em que a mística do compilado anterior é remodelada em uma poesia pautada na vulnerabilidade e na potência das declamações espontâneas.
A brevidade entre as datas de estreia desses dois últimos discos, porém, seria apenas o início de uma prosperidade quase mercenária de produções originais e relançamentos de títulos anteriores após Swift reconquistar os direitos das próprias masters. Em questão de quatro anos, Taylor presenteou seus fãs com nada menos que oito álbuns (quatro regravações e quatro obras inéditas).
Após ‘Fearless (Taylor’s Version)’ e ‘Red (Taylor’s Version)’, Swift anunciou o ambicioso e antecipadíssimo ‘Midnights’ – que quebrou diversos recordes de vendas ao redor do mundo e a propulsionou a embarcar na ‘The Eras Tour’ ao redor do planeta, rendendo-lhe a maior arrecadação da história, além de lhe garantir mais duas estatuetas do Grammy Awards. Todavia, o compilado deu ares de um certo cansaço criativo que começava a ser percebido por parte da crítica especializada e até mesmo dos fãs (ora, até mesmo alguns críticos e uma parte dos ouvintes discutiram acerca da decisão controversa da Academia de Artes e Ciências Fonográficas em coroá-lo com o prêmio de Álbum do Ano quando em comparação a outros títulos).
Não se enganem: ‘Midnights’ está longe de ser um projeto ruim – mas não chega aos pés do que ela fizera nos anos anteriores. Enquanto um pouco mais da metade das faixas é acima da média, com destaque a “Vigilante Shit”, “Maroon” e “The Great War”, por exemplo, notando uma proximidade interessante da performer ao conceitualismo do synth-pop. Não obstante os consideráveis ápices da obra, certas escolhas de progressão sonora e de arranjos instrumentais se mostraram repetitivas e coniventes demais para trazer a originalidade que prezávamos nas iterações predecessoras.
Enfim, chegamos a ‘The Tortured Poets Department’: contando com uma versão dupla de 31 faixas, o 11º álbum de estúdio de Swift tinha tudo para fugir dos convencionalismos que deixara transparecer em ‘Midnights’. O resultado, entretanto, foi bem aquém do esperado, ao menos na visão deste que vos fala: enquanto ‘folklore’ e ‘evermore’ beberam da magnanimidade engenhosa e estética de uma das maiores artistas vivas, o recente compilado insurge como a cópia de uma cópia – um amontoado de histórias idênticas umas às outras e que se amarram em uma cansativa linha de pensamento inescapável e infindável. Nem mesmo a conhecida e celebrada lírica de Taylor parece ornar com o espectro que adota nessa mais nova era – esvaindo-se em incontáveis metáforas vencidas e sem sentido, como explicado na nossa crítica oficial.
O que isso significa? Como é característico de qualquer carreira artística, Swift vem enfrentando alguns problemas que, ano após ano, tornam-se mais evidentes. É claro que, conhecendo o poder de marketing da cantora, o álbum se tornará um sucesso de vendas (não é à toa que alcançou números extraordinários no Spotify em apenas um dia desde o lançamento), mas isso não significa que devemos nos contentar com uma óbvia mediocridade – em que ela se apoia em investidas tão exageradas que, no final das contas, não dizem nada além de uma banalidade derradeira.
A verdade é que ‘The Tortured Poets Department’ apenas veio para reafirmar o que vários pensavam: Taylor Swift precisa respirar e dar um passo para trás se quiser fugir dos problemas que vêm enfrentando. Não há como negar que a exaustão criativa, beirando um burnout de produtividade, transparece faixa a faixa em uma tristonha reciclagem. E, por mais que tente esconder a personalidade workaholic com um “ímpeto da poesia imperativa”, seria mais que necessário que ela reavaliasse as próprias criações para não continuar caindo em uma mesmice fadigosa.