A adaptação em live action da adorada animação ainda possui uma imagem bastante negativa com os fãs
Realizar uma adaptação de um material, de uma mídia diferente e cuja a fama é considerável sempre é um desafio. Muitos elementos que no formato original tinham espaço natural para serem explorados eventualmente podem não ter a mesma oportunidade na mídia de destino.
Isso não significa que o resultado final será ruim ou desrespeitoso; um exemplo é a relação entre o livro O Poderoso Chefão e a adaptação de 1972. Personagens muito explorados nos livros (como o Johnny Fontane ou Pete Clemenza) não tiveram o mesmo tempo na versão audiovisual, porém o resultado obviamente não foi comprometido.
Dito isso, quando o diretor M. Night Shyamalan anunciou que seu projeto, a ser lançado em 2010, seria uma versão live action de Avatar – A lenda de Aang, houve esse misto de expectativa e receio. A confiança veio tanto do renome que o cineasta já havia construído desde o início dos anos 2000 com alguns exemplares memoráveis do suspense – vide Corpo Fechado (uma visão bastante particular sobre super-heróis e que surgiu no mesmo ano que o segundo boom dos quadrinhos no cinema aconteceu), Sinais e A Vila.
A reserva de confiança para com Shyamalan, porém, vinha de sua mais recente obra: Fim dos Tempos. O suspense que teve Mark Wahlberg como protagonista rendeu de fato um bom retorno financeiro, tendo como orçamento US$ 48 milhões e gerando um lucro de US$ 163 milhões. Porém a recepção da crítica especializada no geral não foi boa. Todas elas ressaltando a incapacidade do filme de entregar um bom desenvolvimento e conclusão para a ideia. O próprio Wahlberg afirmou durante uma coletiva em 2010, promovendo seu então novo filme, que Fim dos Tempos era uma obra ruim.
Apesar deste ter sido o até então ápice da má fase do diretor, ele também já colecionava as primeiras críticas negativas em massa da sua carreira ainda em outro filme anterior a esse, A Dama na Água. Foi cercado de suspeitas que Shyamalan apresentou à Nickelodeon (detentora dos direitos sobre a série animada) a ideia de adaptar a primeira temporada, ou “livro 1: Água” como é intitulada, que reunia 20 episódios. A ideia inicial do projeto era que houvesse uma trilogia, cada uma adaptando uma temporada específica do desenho.
Em 2015 ele concedeu uma entrevista ao portal IGN sobre como havia planejado adaptar a série animada. “Meu filho tinha nove anos. Então você podia fazer isso de duas formas. Você poderia fazê-lo para a mesma audiência, que foi o que fiz – para crianças de nove e 10 anos – ou você poderia fazer uma versão Transformers e colocar a Megan Fox. Eu não fiz isso”.
Após chegar aos cinemas O Último Mestre do Ar (uma vez que o nome Avatar já havia sido “reivindicado” por James Cameron em sua obra homônima) colecionou uma série de críticas por parte do público, principalmente. A primeira delas e talvez a principal foi a questão do whitewashing dos personagens. Esse termo é utilizado para qualquer situação em que personagens não-brancos são convertidos para esse grupo.
Na série animada havia em tela uma variedade de personagens de diferentes raças e etnias, sendo que os criadores Bryan Konietzko e Michael Dante DiMartino sempre deixaram claro que Avatar era muito sobre ser o mais representativo possível. No entanto, o que se viu na versão live-action foi um embranquecimento do trio principal (sendo que originalmente dois deles possuem um tom de pele bem mais escuro do que a versão do cinema e o protagonista tinha inspiração em etnias orientais). Muitos críticos na época observaram que a diversidade em si estava presente no elenco secundário da obra, até mesmo em figurantes, o que fortaleceu as críticas dos fãs.
Outro ponto levantado foi a forma com que os elementos eram manipulados. Enquanto que na série animada a dobra elementar era inspirada em movimentos de lutas reais que se ligavam à característica do elemento em questão (como estabilidade, relaxamento, agilidade), a movimentação no filme lembra muito mais uma dança e isso acabou por tirar a intensidade que era concedida a essas situações.
O Último Mestre do Ar possui avaliações catastróficas no agregador de notas Rottem Tomatoes; tendo 5% no Tomatometer (que reúne as críticas de profissionais da área) e 30% no Audience Score (que junta as notas do público). Financeiramente o filme também foi um fiasco para a Paramount, com um orçamento de US$ 150 milhões o saldo de bilheteria fechou em US$ 319 milhões, segundo o portal Box Office Mojo. Detalhe que a bilheteria em território estadunidense, que foi de US$ 131 milhões, por si só não foi suficiente para superar o valor do orçamento de produção.
Esse filme se tornou desde então o exemplo moderno mais preciso sobre como adaptações podem gerar novos produtos ruins e chamou atenção para que esse tipo de obra tenha sempre dois fatores em mente: a compreensão por parte da equipe de produção sobre o que tornou, originalmente falando, aquela história um sucesso digno de receber uma versão para os cinemas e a importância de planejar o que pode funcionar na telona e o que não pode.