O cinema não possui a alcunha de sétima arte por qualquer motivo: afinal, é ele quem conflui todas as outras expressões artísticas em um mesmo lugar, seja nos enquadramentos e nas fotografias (emulando a própria pintura), seja no uso da música como potencializador narrativo.
E, desde a consagração do cinema como “arte” no sentido factual do termo, inúmeros títulos carregam o lendário título de revolucionários, por terem modelado diversas “regras” ou “formulações” a serem seguidas por cineastas, auxiliando-os inclusive a desmistificar convencionalismos em prol de impulsões que caem no gosto dos espectadores e dos especialistas.
Pensando nisso, tivemos a árdua tarefa de eleger os dez melhores longas-metragens dos anos 2000.
Confira abaixo as nossas escolhas:
10. GLADIADOR (2000)
“Rodado todo em ordem cronológica aos acontecimentos que assistimos, a mega produção coloca sua construção narrativa nos passos de um protagonista que se desconstrói em relação a tudo que acredita sobre lealdade atingindo um caminho sem volta para uma vingança épica. As subtramas nos mostram o caos político e a luta pelo poder em uma Roma enfraquecida com a perda de seu respeitado imperador Marco Aurélio. O olhar para o antagonista se resume as práticas cruéis de um recém imperador mimado, que sonha em alcançar o respeito de seu povo mas que nunca o terá” – Raphael Camacho
9. FILHOS DA ESPERANÇA (2006)
Alfonso Cuarón não considerado um dos melhores cineastas de todos os tempos por qualquer razão – e seu longa pós-apocalíptico ‘Filhos da Esperança’ é mais um lembrete de seu poder narrativo e técnico dentro da sétima arte. Navegando por um planeta devastado pela derradeira extinção da raça humana, Cuarón sagra-se um autor cinematográfico de calibre inexplicavelmente irretocável. A trama nos leva ao ano de 2027, em que a infertilidade é uma ameaça real para a civilização – e o último humano a nascer em anos acaba de morrer. Frente a um cenário pessimista sobre o futuro, um burocrata desiludido se torna o herói improvável que pode salvar a humanidade. Para isso, ele enfrenta seus próprios demônios e tenta proteger a última esperança do planeta: uma jovem mulher milagrosamente grávida, descoberta pela ativista inteligente com quem fora casado.
8. BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS (2004)
Vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Original, ‘Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças’ é uma obra muito inteligente e madura sobre relacionamento. Fala sobre a possibilidade de se apagar pessoas de sua memória, algo com que muita gente recém-separada consegue se relacionar. Mas, ao final, mostra que por mais dolorosa que seja a separação e a falta daquela companhia, ainda é melhor ter vivido aquilo. O filme também aborda vários elementos de relacionamentos, como a noção de que um deve completar o outro ou mesmo a dependência que se forma em uma relação. O elenco conta com as ótimas participações de Jim Carrey, Kate Winslet, Kirsten Dunst e Mark Ruffalo.
7. SANGUE NEGRO (2007)
“‘Sangue Negro’ é um dos filmes mais aclamados da carreira de Paul Thomas Anderson e funciona como um drama épico de época que foi extremamente ovacionado pela crítica e foi considerado como um das melhores produções do século XXI. Ambientada na fronteira da Califórnia na virada do século XIX para o XX, a trama acompanha Daniel Plainview (Daniel Day-Lewis), um mineiro de minas de prata derrotado, que divide seu tempo com a tarefa de ser pai solteiro. Um dia ele descobre a existência de uma pequena cidade no oeste onde um mar de petróleo está transbordando do solo. Daniel decide partir para o local com seu filho, H.W. (Dillon Freasier). O nome da cidade é Little Boston, sendo que a única diversão do local é a igreja do carismático pastor Eli Sunday (Paul Dano). Daniel e H.W. se arriscam e logo encontram um poço de petróleo, que lhes traz riqueza mas também uma série de conflitos” – Thiago Nolla
6. AS COISAS SIMPLES DA VIDA (2000)
Marcando a despedida de seu trabalho no cinema antes do falecimento de Edward Tang, o melodrama ‘As Coisas Simples da Vida’ emerge como uma obra-prima cinematográfica que, de maneira aplaudível e tocante, amalgama inúmeras emoções contrastantes em um drama multigeracional que continua a influenciar cineastas até os dias de hoje. A trama nos leva a Taipei e acompanha Jian, um homem de 40 anos que vai ao casamento do cunhado. Nesta ocasião, ele reencontra sua namorada de infância, Sherry, enquanto sua filha Ting Ting vivencia sua primeira desilusão amorosa. Explorando a inerência da tristeza e da alegria – bem como da vida e da perda -, o longa é uma inescapável análise da condição humana em meio a uma potência exacerbante de sensações.
5. E SUA MÃE TAMBÉM (2001)
No cenário mainstream, Alfonso Cuarón ganhou aclame e fama mundiais ao comandar títulos como ‘Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban’ e ‘Filhos da Esperança’. Porém, em 2001, Cuarón lançou a obra-prima de sua carreira com a espetacular dramédia coming-of-age ‘E Sua Mãe Também’. Indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original, o filme acompanha Julio e Tenoch, dois adolescentes que, junto com Luisa, uma mulher mais velha, embarcam em uma jornada para uma praia paradisíaca. Em uma viagem de carro pelo México, os três acabam se envolvendo e aprendem muito sobre si mesmos e suas relações.
4. CIDADE DOS SONHOS (2001)
David Lynch é conhecido por gostar de chocar seu público. E é isso o que ele faz com grande sucesso no filme ‘Cidade dos Sonhos’, protagonizado por Naomi Watts e Laura Harring. Misturando o mundo real com as inconstâncias do paralelismo onírico, a história de mistério é perscrutada por uma gradativa tensão sexual, pautada no desejo e no primitivismo humano, entre as personagens principais, que eventualmente consumam sua atração uma pela outra em uma cena incrível. Ao contrário de outros filmes do gênero, a crueza é a opção narrativa principal, com passagens explícitas e que não se preocupam com a catarse absorvida pelo espectador.
3. A VIAGEM DE CHIHIRO (2001)
‘A Viagem de Chihiro’ não é considerado um dos melhores filmes da história por qualquer motivo: a produção, dirigida e escrita por Hayao Miyazaki, surpreendeu a todos por uma competente e emotiva narrativa, guiada por uma animação cautelosamente arquitetada – e não apenas conquistou aclame da crítica, como carregou o título do filme mais bem-sucedido da história da sétima arte japonesa por quase duas décadas. Como se não bastasse, o título ajudou a calcar a animação como arte, e não apenas como um gênero voltado ao público infantil.
2. O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN (2005)
É inexplicável o motivo de ‘O Segredo de Brokeback Mountain’ não ter levado o Oscar de Melhor Filme para casa – mas seu legado estende-se até hoje. Dirigido por Ang Lee, o drama romântico neo-western retrata o complexo relacionamento emocional e sexual entre dois caubóis estadunidenses, chamados Ennis Del Mar e Jack Twist, no Meio-Oeste dos anos 1960. Interpretados por Jake Gyllenhaal e Heath Ledger em rendições que ficariam marcadas para a história, o longa-metragem acompanha os dois protagonistas trabalhando como pastores em uma fazenda em Wyoming e como eles esconderam quem realmente eram do mundo, mantendo um caso romântico por mais de vinte anos.
1. O SENHOR DOS ANÉIS: O RETORNO DO REI (2003)
‘O Retorno do Rei’ traz uma história maravilhosa contada com detalhes impressionantes que honram o nome de J.R.R. Tolkien. Entretanto, ele não merece reconhecimento apenas por isso, e sim por representar a excelência em relação aos primores técnicos. Se o diretor Peter Jackson conseguiu criar mágica nas obras anteriores, aqui ele supera a seus próprios limites ao não apenas orquestrar coreografias perfeitas e fluidas, mas por unir investidas artísticas e metodológicas em uma só atmosfera: cada frame se assemelha a uma pintura barroca pela composição paradoxal de luz e sombra, seja nos momentos de glória dos personagens, nos reflexivos ou nos derradeiros. Em adição, os enquadramentos e movimentos de câmera são tão fluidos que parecem dançar conforme seguem os guerreiros em suas tentativas de prevalecer perante a ruína iminente.