segunda-feira , 23 dezembro , 2024

Panorama Suíço | Depois da Guerra: drama político e sobre relações familiares reflete nossos tempos sombrios

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Por Nívia Passos

Com o embate político entre direita e esquerda cada vez mais acirrado no Brasil, difícil não pensar na nossa realidade quando algum filme traz essa dualidade como foco; ainda que, por ser de outra nacionalidade, aborde questões um pouco diferentes das nossas. Isso acontece com o longa Depois da Guerra (2017), da estreante Annarita Zambrano, que será exibido na 7ª edição do Panorama do Cinema Suíço – evento que acontecerá entre os dias 9 e 21 de maio em São Paulo. Focando na tumultuada vida de Marco Lamberti (Giuseppe Battiston), um ex-militante de extrema esquerda acusado de terrorismo pelo assassinato de um professor universitário, ele mostra as implicações da perseguição política para quem, em geral, nada tem a ver com a história: a família do acusado.



A narrativa – que se passa em 2002 na Bolonha, Itália – já começa com a morte do professor logo após uma discussão com alunos da universidade em sala de aula. Minutos antes de ser morto aos tiros por um desconhecido, o acadêmico estava em uma tensa discussão com os universitários que protestavam pela manutenção do Artigo 18 – que dá à Justiça do Trabalho o poder de reintegrar empregados que tenham sido despedidos sem justa causa. Para quem é ligado em política internacional, os elementos desse cenário logo vão parecer familiares. É que, em março de 2002, mais de dois milhões de italianos protestaram contra a reforma trabalhista que havia sido aprovada por Silvio Berlusconi, e que afetaria diretamente esse artigo que tanto beneficiava a classe proletária. O trágico assassinato que serve de gancho para o filme também aconteceu, inclusive; mas, fora das telas, a vítima foi o jurista Marco Biagi, que seria um dos responsáveis pela reforma.

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A partir daí, o que se segue não é uma busca por quem matou o professor. Injustamente ou não, como você vai se perguntar durante todo o longa, o governo da Itália já escolheu um culpado: Marco Lamberti, que já estava há anos extraditado na França por conta de outra condenação pelo assassinato de um juiz. No entanto, contrariando o que as primeiras cenas parecem indicar, Depois da Guerra não tem a intenção de criar um enredo de suspense e jogadas políticas em torno do possível terrorista, e nem de apontar direita ou esquerda como certa. O principal objetivo aqui é mostrar o perigo de qualquer extremismo; a atitude da mídia quando “o vilão” é escolhido; e, principalmente, as consequências dessa perseguição para a vida da família do acusado – que não mantinha contato com ele há anos – e para sua filha adolescente Viola (Charlotte Cétaire), uma jovem cheia de vida que se vê limitada pelas andanças do pai e é obrigada a sair de Paris contra sua vontade para acompanhá-lo na fuga para a Nicarágua.

E por falar em Cétaire, vale destacar sua ótima atuação, que transmite toda a angústia e desejo de fuga da personagem com a naturalidade ideal para não tornar nenhuma cena over. A química entre ela e Giuseppe Battiston, que interpreta seu pai, é incrível; indo do descaso ao apego em segundos, de uma maneira que nos convence. Ainda não conhecia a atriz, mas certamente ficarei de olho em seus próximos trabalhos… Barbora Bobulova e Elisabetta Piccolomini – que interpretam a irmã e a mãe de Marco, respectivamente – também merecem aplausos. A primeira por transmitir o tempo todo com o olhar (ou o desvio dele, como você vai entender quando assistir) a indiferença pelas escolhas e condenações do filho, e a segunda por passar a sensação de medo e insegurança que rodeiam sua personagem – tanto por temer por sua filha de 10 anos e o marido quanto por se preocupar com o destino do irmão acusado. Nessas horas, com as duas, o filme perde seu teor todo político e também se revela como um drama familiar bem denso sobre escolhas e ideologias diferentes.

No entanto, mesmo com todas essas questões e personagens cheios de camadas, o longa perde alguns pontos pelo ritmo e desenrolar dos acontecimentos. Não que seguir uma narrativa mais lenta – com planos demorados e mais silêncio que diálogos – seja um problema; mas a questão é que, mesmo com tantos elementos a seu favor, ele deixa de prender a atenção em alguns momentos e chega a se tornar cansativo por parecer ser bem mais longo do que seus 92 minutos realmente são. Porém, no final – que caminha entre um final feliz e um desfecho trágico concomitante – suas mensagens se destacam entre as falhas. Uma delas é a de que, em um mundo de extremismos, não se ganha nada além de um eterno ciclo; e a outra, brincando com o título, é sobre recomeços “depois da guerra” – seja ela política, familiar ou, como no caso do filme, tudo isso junto. Fica a reflexão mais do que necessária para os tempos sombrios em que vivemos…

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A narrativa – que se passa em 2002 na Bolonha, Itália – já começa com a morte do professor logo após uma discussão com alunos da universidade em sala de aula. Minutos antes de ser morto aos tiros por um desconhecido, o acadêmico estava em uma tensa discussão com os universitários que protestavam pela manutenção do Artigo 18 – que dá à Justiça do Trabalho o poder de reintegrar empregados que tenham sido despedidos sem justa causa. Para quem é ligado em política internacional, os elementos desse cenário logo vão parecer familiares. É que, em março de 2002, mais de dois milhões de italianos protestaram contra a reforma trabalhista que havia sido aprovada por Silvio Berlusconi, e que afetaria diretamente esse artigo que tanto beneficiava a classe proletária. O trágico assassinato que serve de gancho para o filme também aconteceu, inclusive; mas, fora das telas, a vítima foi o jurista Marco Biagi, que seria um dos responsáveis pela reforma.

A partir daí, o que se segue não é uma busca por quem matou o professor. Injustamente ou não, como você vai se perguntar durante todo o longa, o governo da Itália já escolheu um culpado: Marco Lamberti, que já estava há anos extraditado na França por conta de outra condenação pelo assassinato de um juiz. No entanto, contrariando o que as primeiras cenas parecem indicar, Depois da Guerra não tem a intenção de criar um enredo de suspense e jogadas políticas em torno do possível terrorista, e nem de apontar direita ou esquerda como certa. O principal objetivo aqui é mostrar o perigo de qualquer extremismo; a atitude da mídia quando “o vilão” é escolhido; e, principalmente, as consequências dessa perseguição para a vida da família do acusado – que não mantinha contato com ele há anos – e para sua filha adolescente Viola (Charlotte Cétaire), uma jovem cheia de vida que se vê limitada pelas andanças do pai e é obrigada a sair de Paris contra sua vontade para acompanhá-lo na fuga para a Nicarágua.

E por falar em Cétaire, vale destacar sua ótima atuação, que transmite toda a angústia e desejo de fuga da personagem com a naturalidade ideal para não tornar nenhuma cena over. A química entre ela e Giuseppe Battiston, que interpreta seu pai, é incrível; indo do descaso ao apego em segundos, de uma maneira que nos convence. Ainda não conhecia a atriz, mas certamente ficarei de olho em seus próximos trabalhos… Barbora Bobulova e Elisabetta Piccolomini – que interpretam a irmã e a mãe de Marco, respectivamente – também merecem aplausos. A primeira por transmitir o tempo todo com o olhar (ou o desvio dele, como você vai entender quando assistir) a indiferença pelas escolhas e condenações do filho, e a segunda por passar a sensação de medo e insegurança que rodeiam sua personagem – tanto por temer por sua filha de 10 anos e o marido quanto por se preocupar com o destino do irmão acusado. Nessas horas, com as duas, o filme perde seu teor todo político e também se revela como um drama familiar bem denso sobre escolhas e ideologias diferentes.

No entanto, mesmo com todas essas questões e personagens cheios de camadas, o longa perde alguns pontos pelo ritmo e desenrolar dos acontecimentos. Não que seguir uma narrativa mais lenta – com planos demorados e mais silêncio que diálogos – seja um problema; mas a questão é que, mesmo com tantos elementos a seu favor, ele deixa de prender a atenção em alguns momentos e chega a se tornar cansativo por parecer ser bem mais longo do que seus 92 minutos realmente são. Porém, no final – que caminha entre um final feliz e um desfecho trágico concomitante – suas mensagens se destacam entre as falhas. Uma delas é a de que, em um mundo de extremismos, não se ganha nada além de um eterno ciclo; e a outra, brincando com o título, é sobre recomeços “depois da guerra” – seja ela política, familiar ou, como no caso do filme, tudo isso junto. Fica a reflexão mais do que necessária para os tempos sombrios em que vivemos…

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