‘Halo’ é uma das franquias de games mais populares de todos os tempos e, além de ter conquistado aclame crítico desde sua estreia oficial em 2001, se tornou um sucesso de vendas ao comercializar mais de 81 milhões de cópias ao redor do mundo. Anos depois, a Paramount+ anunciou a produção de uma ambiciosa e vindoura série baseada nos jogos – e, após vários meses de espera, o episódio de estreia finalmente chegou à plataforma de streaming, para alegria dos fãs e dos apaixonados por histórias de ficção científica.
Para aqueles não familiarizados, a história é ambientada no século XXVI, dramatizando uma épica batalha entre os humanos, que lutam para sobreviverem perante os perigos do espaço, e uma raça alienígena perigosa conhecida como Covenant que quer varrê-los da face do universo. No centro dessa narrativa, temos Master Chief (Pablo Schreiber), um soldado de elite construído pela genial e distorcida mente da Dra. Catherine Elizabeth Halsey (Natascha McElhone) e que fará de tudo para cumprir as missões que lhe são dadas. Entretanto, é claro que essa conhecida premissa não poderia ser apenas a única a povoar esse explosivo panteão bélico – e, além de enfrentarem o Covenant, também lidam com conflitos internos que envolvem a organização intergaláctica intitulada UNSC e os postos de guerrilheiros rebeldes que são massacrados pela força governamental.
Apenas com essa breve sinopse da produção, é possível destilar diversas incursões que sempre fizeram parte do gênero sci-fi e que, aqui, se aglutinam em um objetivo em comum – ao menos, tenta-se fazer isso. Não é novidade que em investidas futuristas, o combate entre oprimidos e opressores se desenrole como um dos pontos-chave da trama, à medida que é revestido com inflexões que transformam críticas sociais e antropológicas em um espetáculo audiovisual (ora, é só nos lembrarmos, no tocante mainstream, de ‘Jogos Vorazes’ e as múltiplas análises políticas arquitetadas por Suzanne Collins). De certa maneira, a releitura de ‘Halo’ apresenta elementos que seguem esse padrão, mas, ao contrário do que esperávamos, se rende a alguns clichês que não fogem muito da superficialidade e que se valem demais do imagético, esquecendo-se de prestar atenção ao roteiro e ao próprio desenvolvimento dos personagens.
Em qualquer construção televisiva (e, agora, em streaming), o piloto consagra-se como o episódio mais importante da temporada de lançamento, dando o tom dos capítulos seguintes e engendrando vários ganchos que serão resolvidos. A cena inicial é muito bem orquestrada pelo diretor Otto Bathurst (‘Peaky Blinders’) e, ainda que se estenda por longos 17 minutos, nos dá um gostinho da guerra sem fim que se alastra pelo cosmos: os espectadores são levados para um planeta-colônia conhecido como Madrigal, em que um dos postos de rebeldes é atacado pelos Covenant e quase exterminado, deixando para trás uma única sobrevivente – a jovem Kwan Ha (Yerin Ha), filha do líder local. Entretanto, os alienígenas também sofrem baixas com a chegada dos Espartanos, grupo a que Master Chief pertence e que é temido através da galáxia por sua abordagem incisiva e sanguinária.
Se o episódio em questão resolvesse seguir por caminhos menos ousados, ao menos teria entregado uma concisa e sólida jornada introdutória que nos fizesse comprar o que fosse vendido – mas a decisão de abrir espaço para tantas subtramas impede que os protagonistas e coadjuvantes sejam devidamente explorados, retirando boa parte da profundidade que merecem. Master Chief e Kwan Ha são exceções dessa falta de cautela, apesar de esbarrarem em fórmulas constantes que servem de base para seu complexo relacionamento. Catherine, por sua vez, goteja uma espécie de crise existencial que envolve a criação da I.A. Cortana (um clone de si mesma) e que, no final das contas, não chega a lugar nenhum, por enquanto; Miranda Keyes (Olive Gray), uma das oficiais da UNSC, se vê num dilema moral quando seu pai recebe ordens de assassinar Kwan Ha, não compreendendo porque uma adolescente deve morrer só por não compactuar com a controversa causa da federação; e por aí vamos.
É claro que este é apenas o capítulo de estreia, motivo pelo qual conseguimos perdoar alguns deslizes em prol de descobrir o que será explorado nas semanas seguintes – e certas escolhas estéticas contribuem para as investidas que virão: mesmo com uma despreocupação constante com os efeitos visuais, a separação imagética entre o posto rebelde e a sede da UNSC parte de uma divisão gritante, que aposta fichas no impacto entre uma paleta de cor amarelada e seca contra a sobriedade de uma sociedade altamente tecnológica e detentora de um arsenal infinito de armas e equipamentos de combate; ora, a própria caracterização dos personagens já nos causa um distinção urgente que unifica dois opostos em uma causa comum.
‘Halo’ começa tropeçando em sua ambição; entretanto, é inegável que traz um potencial gigantesco que pode aparar as pontas soltas e investir mais esforços numa narrativa que conquistou os fãs ainda no começo do século – e que ascendeu a uma das franquias mais adoradas da história.