Atenção: o texto a seguir aborda os três primeiros episódios da série. Cuidado com spoilers.
‘Outlander’ tornou-se uma das produções mais adoradas e elogiadas da televisão contemporâneo, apostando fichas em um potente drama romântico de época pincelado com incursões sci-fi que honraram os escritos de Diana Gabaldon. Acompanhando a jornada de Jamie Fraser (Sam Heughan) e Claire Beauchamp (Caitríona Balfe), a trama nos transportou à Escócia do século XVIII em um envolvente e apaixonante enlace romântico que se estendeu por oito temporadas. Agora, somos convidados a revisitar esse universo icônico com a série pré-sequência ‘Outlander: Blood of My Blood’, que chegou recentemente ao catálogo do Disney+.
A trama é dividida em duas e, a princípio, ocupa os dois primeiros capítulos da temporada para se firmar. Logo no piloto, somos transportados ao início dos anos 1700 e acompanhamos os futuros pais de Jamie. De um lado, temos Ellen (Harriet Slater), a única filha do clã MacKenzie, que passa por um profundo luto após a morte do pai, com quem mantinha uma relação bastante próxima. Com os fervores tomando conta da família, seus irmãos disputam para quem ascenderá ao controle das terras – acendendo uma necessidade de poder absurda em Colum (Séamus McLean Ross), irmão mais novo de Ellen que deseja desposá-la com um nobre do clã aliado, Malcolm Grant (Brian McCardie). Porém, o pai jurou que ela não precisaria firmar matrimônio com qualquer homem – e seu crescente amor por Brian Fraser (Jamie Roy) deixa tudo mais complicado, considerando que o melhor amigo do rapaz, Murtagh (Rory Alexander), também está apaixonado pela moça.
Logo após sermos arremessados ao melodrama romântico envolvendo Ellen e Brian, somos levados para o período próximo ao fim da I Guerra Mundial. Tentando sobreviver nas claustrofóbicas trincheiras, Henry Beauchamp (Jeremy Irvine) percebe que, talvez, viver não valha a pena, confidenciando seus pensamentos a uma carta que, com sorte, cairá nas mãos de alguém. E esse alguém é Julia Moriston (Hermione Corfield): inteligente e versada na escrita e na organização sistemática, a jovem encontra a carta de Henry e começa a se corresponder com ele em um enlace epistolar digno de aplausos e que configura um dos melhores episódios do ano. Eventualmente, os dois se apaixonam e, após se encontrarem, logo se casam e navegam pelos traumas e por um amor verdadeiro incorrigível – isto é, até serem separados em uma viagem de volta no tempo para uma Escócia em polvorosa.
A partir daí, a história dos nossos protagonistas se entrelaça e dá as cartas de um inescapável destino que culminaria na união entre Jamie e Claire – e que expande a mitologia eternizada por Gabaldon de maneira sublime e muito sólida. Apresentando uma releitura convincente de duas épocas distintas entre si que se chocam em um espetacular e envolvente enredo, os três capítulos iniciais desse aguardado spin-off são certeiros em sua completude e nos deixam animados e ansiosos para o que as próximas semanas reservam. Mais do que isso, é notável como a produção reacende o interesse do público em produções de época, mostrando que, às vezes, certos convencionalismos funcionam mais que ambições desmedidas.
Jamie Payne está às rédeas dessa magnífica tríade televisiva, conduzindo com maestria uma aventura que atravessa séculos e que, de maneira sutil e comedida, explora a inevitabilidade da condição humana. O diretor não é nenhum estranho ao universo ‘Outlander’, visto que já comandou outras iterações da série original, e demonstra ter domínio do que se propõe a contar através de uma bem-vinda liberdade criativa. Cada cena preza por uma beleza inexplicável que transmuta os cenários em pinturas épicas e sonhadoras, que reúnem elementos oníricos tanto na Inglaterra quanto na Escócia, em contraposição à árdua jornada a ser enfrentada pelos personagens – e que singra entre prisões sem grades e artimanhas de sobrevivência.
O trabalho do elenco é impecável, com óbvio destaque aos protagonistas. Slater encarna uma complexa jovem que se recusa a seguir os mandamentos do irmão, agora apossado do “trono” do clã e almejando recuperar a glória política e social do império do pai, enquanto Fraser posa como um humilde e ingênuo rapaz que se vê numa corda bamba entre os caprichos do pai e o desejo de trilhar o próprio caminho. Porém, Irvine e Corfield usurpam a atenção dos espectadores através de uma química explosiva e poética, construindo um microcosmos que os envolve em uma epopeica jornada de encontros e desencontros e que nos petrifica do começo ao fim.
Os três primeiros capítulos de ‘Outlander: Blood of My Blood’ não apenas honram o legado deixado pela série original, como brilha com uma luz única e com uma paixão cinemática de tirar o fôlego – não devendo nada à narrativa de Claire e Jamie e garantindo que cada cena e cada gancho nos deixe ansiosos por mais e nos embebede com uma inebriante dose artística de criatividade e de honestidade.
Lembrando que a série já está disponível no Disney+.
