Vivemos uma era áurea para o audiovisual. Produções voltadas ao entretenimento são mais populares do que nunca. Parte dessa receita de sucesso vem da conversa harmoniosa que o cinema possui hoje com a TV. Antes, mídias distintas e rivais, as duas se unem com a chegada da internet, misturando tudo num caldeirão de possibilidades infinitas. A prova disso é a via de mão dupla de ideias, artistas e produções que transitam da TV para o cinema e vice versa. Seriados como Game of Thrones mostraram que a TV atual não tem nada de pequena, e pode ser inclusive muito maior do que grande parte dos filmes para o cinema.
As mídias se homenageiam, e se no passado tínhamos adaptações de famosos seriados para as telonas (segmento que continua operacional e lucrativo), agora a telinha retribui o carinho adaptando no seu formato obras cinematográficas, vide Westworld e Stranger Things (grande homenagem aos filmes dos anos 1980). Pensando nisso, baseado numa matéria de nossos colegas do Digital Spy, formulamos uma nova lista. Pegando essa ideia e mostrando que nem sempre essa junção funciona bem, reunimos algumas séries de TV baseadas em filmes cultuados, cuja vida foi tão curta que nem chegaram a ser produzidas. Muitas delas você provavelmente nem ouviu falar. Então, não anote no caderninho e tente achar essas preciosidades online (as que existirem) por sua própria conta e risco.
Um Dia a Casa Cai (The Money Pit, 1986)
Clássico da Sessão da Tarde da minha geração, este filme tem produção de ninguém menos que Steven Spielberg e sua Amblin Entertainment (produtora do diretor). Curiosamente, ninguém mais fala na comédia hoje em dia. É bem verdade que o filme não é um dos mais memoráveis nas carreiras do diretor e dos protagonistas Tom Hanks e Shelley Long (então recém-saída do sucesso televisivo Cheers – 1982 a 1993). A trama fala sobre um casal recém-casado e as desventuras que passam para reformar sua grande casa nova. Tentando dar novos ares para a ideia, a rede NBC começou a desenvolver a série baseada no longa, com roteiro escrito por Justin Spitzer (The Office) e produção da Amblin TV, do mesmo Spielberg. Um piloto estava pronto para começar a ser rodado em 2014, mas devido a problemas com o elenco, precisou ser freado. Três anos depois e a série continua estagnada.
Advogado do Diabo (1997)
Cult por excelência, este suspense com doses sobrenaturais dividiu público e críticos na época de seu lançamento, justamente por não se decidir entre um caminho plausível ou um terror com elementos fantásticos. Seja como for, hoje a produção é venerada como obra cult por novas gerações. Ei, temos muita coisa boa para tirar daqui. Primeiro, Al Pacino tomado na maldade e na surtação máxima. Segundo, um dos primeiros papéis de destaque da musa Charlize Theron, que já demonstrava talento. Terceiro, uma Connie Nielsen igualmente inspirada, deliciosamente sedutora e maléfica. Em 2014, a mesma NBC ordenou um piloto da série que seria baseada no filme dirigido por Taylor Hackford (Ray), e escrita por Matt Venne, roteirista de continuações de terror dispensáveis, vide Luzes do Além (2007), Espelhos do Medo 2 (2010) e A Hora do Espanto 2 (2013). As filmagens, no entanto, nem chegaram a ocorrer. Talvez tenham olhado para o roteiro. Seria o caso de contratar alguém mais talentoso.
Fargo (1996)
Peraí, você diz. A série Fargo existe e é uma das grandes vencedoras de prêmios voltados para a TV (vide Globo de Ouro e Emmy) desde seu lançamento. Calma, jovem. Antes do seriado de antologia, produzido pelos próprios irmãos Coen, e lançado em 2014 (este ano está aparecendo muito por aqui, não?), um programa de TV baseado no filme indicado ao Oscar foi produzido. Ou quase. Logo no ano seguinte, em 1997, um piloto foi gravado e trazia os mesmos personagens do longa. Edie Falco (antes da estreia de Família Soprano) viveu a xerife Marge Gunderson, papel pelo qual Frances McDormand levou seu Oscar de melhor atriz, e Bruce Bohne reprisava seu papel do policial Lou. Os irmãos Coen, porém, não tiveram nada com a produção. Curiosamente, o episódio piloto teve direção da atriz vencedora do Oscar, Kathy Bates (Louca Obsessão). Assista abaixo o episódio:
Hellraiser – Renascido do Inferno (1987)
Há anos menções sobre uma nova roupagem para o clássico do terror de Clive Barker enchem os corações dos fãs de empolgação. Mas o dia de reviver uma das obras mais interessantes do gênero parece nunca chegar. Em 2012, a produtora Sonar Television anunciou seus planos de levar a obra de Barker para as telinhas, com a promessa inclusive de que atores dos filmes originais iriam voltar. Hellraiser é uma franquia cujos três primeiros filmes são os únicos que verdadeiramente prestam, mesmo assim decaindo de qualidade a cada episódio da trilogia.
Depois disso, inúmeras sequências foram produzidas direto para o mercado de vídeo. Stewart Till, o presidente da Sonar Television chegou a dar declarações sobre a excelência da suposta série, alegando que o abismo entre uma grande série e uma apenas ok estava cada vez maior – obviamente, sua aspiração era pela primeira categoria. Até hoje o piloto nunca chegou a ser rodado, e Clive Barker, sabiamente, se manteve bem longe de tudo em relação a série. Barker planeja uma versão cinematográfica que esquecerá todas as continuações e seguirá de onde seu filme de 1987 parou.
Um Tira da Pesada (1984)
Muita gente não sabe, mas o filme Um Tira da Pesada inicialmente foi pensado como um veículo de ação para o astro Sylvester Stallone. Uma vez que Sly desistiu do projeto, optando logo depois por Cobra (1986), um dos maiores prazeres culposos da VIDA, a produção recebeu tintas de comédia e sátira, caindo no colo de Eddie Murphy e se tornando o primeiro, e um dos maiores sucessos da carreira do humorista. Duas continuações depois (a segunda, bem execrada), e Axel Foley parecia aposentado de vez. Mas hei que 20 anos depois o policial engraçadinho, nas formas de Murphy, ressurge para o piloto de uma série. E esse foi o grande problema, segundo o próprio.
A série de Beverly Hills Cop, título original do filme, seria centrada no filho de Foley, Aaron, interpretado por Brandon T. Jackson (Trovão Tropical), e Murphy fez apenas uma aparição no episódio piloto. Quando os produtores assistiram ao primeiro episódio, ficaram mais do que empolgados com a aparição do veterano comediante, desejando o ator como personagem recorrente da série. Murphy cordialmente recusou, devido a sua agenda (sério mesmo? O que ele têm feito ultimamente?). Dessa forma, Um Tira da Pesada, a série, ficou só no primeiro episódio – surpreendentemente dirigido por Barry Sonnenfeld (da trilogia Homens de Preto).
Segundas Intenções (1999)
Produção jovem adorada pela geração anos 1990, o que muitos não sabem provavelmente é que Segunda Intenções foi livremente inspirado no clássico da literatura Ligações Perigosas, produzido incansavelmente por diversas mídias, como filmes e teatro – sendo uma das mais conhecidas, um filme homônimo de 1988, com Michelle Pfeiffer. Apesar do status de culto, Segundas Intenções não foi, por assim dizer, um grande sucesso de público ou crítica. O longa gerou duas continuações, de 2000 e 2004, sendo a primeira dirigida pelo mesmo Roger Kumble do original e protagonizada por Amy Adams, atriz 5 vezes indicada ao Oscar.
Ano passado, uma série que iria funcionar como continuação do longa de 1999 (e não como um reboot da história) quase vingou. Um episódio piloto chegou a ser rodado, escrito e dirigido pelo próprio Kumble e com Sarah Michelle Gellar reprisando o papel da beijoqueira Kathryn Merteuil do filme, dezoito anos depois, agora com quase 40. Reese Wtiherspoon, por outro lado, se manteve distante do projeto, e sua personagem foi interpretada por Kate Levering, a Kim Kaswell da série Drop Dead Diva (2009 – 2014). A trama centraria nas manipulações da personagem de Gellar, em especial em relação ao sobrinho Bash, enquanto tentava ganhar controle da empresa da família, a Valmont International. A atriz chegou a publicar uma foto como a personagem em uma banheira, nas redes sociais – que você pode conferir abaixo. Uma pena. Mas queremos ver este piloto!
BÔNUS:
Geração X (1996)
Muito antes desta onda de produções do subgênero dos super-heróis que assola o mundo, seja na TV ou no cinema, tais ideias amargavam completo ostracismo na década de 1990. Um dos casos mais notórios ocorreu com Geração X, piloto que pretendia levar os mutantes (secundários) da Marvel para as telinhas semanalmente. Antes de X-Men (2000) dar o pontapé em um subgênero que não tem hora para acabar, personagens do time B do mesmo universo visavam um lugar ao sol.
O episódio inicial de 1h30min de duração chegou a ser lançado no Brasil e no mundo como um filme feito para a TV. Eu tive a oportunidade (e o desprazer) de assistir a esta pérola na época e compreender um pouco o motivo pelo qual os investidores pularam fora. Na trama, Emma Frost (Finola Hughes) e Banshee (Jeremy Ratchford) faziam às vezes do Professor Xavier no comando da escola e dos jovens mutantes. Entre os alunos, Jubileu (Heather McComb) era uma das protagonistas. Nada de Wolverine, Mística ou Magneto. Uma curiosidade é que a mesma locação usada para a mansão dos mutantes, depois foi reaproveitada nos longas para o cinema. E dizem que nada de bom se aproveitou de Geração X…
Mulher-Maravilha (2011)
Mulher Maravilha foi um dos maiores sucessos desta primeira metade do ano e a salvação da DC no cinema. No entanto, antes do fenômeno mundial, a personagem amargava um fracasso nas telinhas. Seguindo os passos da série protagonizada pela estonteante Linda Carter (que durou de 1975 a 1979), a heroína ensaiou retorno em 2011, nas formas da azarada Adrianne Palicki (G.I. Joe – Retaliação). Usando calças, ao invés do short ou saia, o traje da heroína era pior do que um cospobre. Além disso, trazia uma versão mais descolada de Diana Prince, inserida no mundo moderno como empresária, dona de uma grande corporação. Algo parecido com o que foi conquistado em Supergirl, com Kara inserida num mercado de trabalho crível. As imagens de Palicki uniformizada estão espalhadas pela rede. Já o episódio piloto, talvez você precise de sorte para encontrar.