Não é de hoje que crítica e público se desentendem. De Transformers a Crepúsculo, passando por Velozes e Furiosos, parte da filmografia de gente como Stallone e Schwarzenegger, e nem precisamos falar sobre os inúmeros filmes de terror slasher que surgiram na década de 80, como as franquias Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo. O que todos tem em comum é o desdém dos críticos, mas um amor incessante dos fãs. Isso é o que de fato importa para os executivos de Hollywood: saber se o filme gerou dinheiro suficiente para seguirem sendo produzidos.
Sim, não se engane amiguinho, é o dinheiro que fala mais alto sempre. Obras cinematográficas são caras, afinal você teria em torno de US$20 milhões para investir em algo que não dê retorno? O que pode acontecer, embora sejam casos raros, é o status de culto que determinada obra adquiriu ao longo dos anos para que justificar o investimento. Foi assim com Blade Runner, Tron, e até grandes franquias como Rambo e Rocky. Nada como o tempo, e aí sim, entra em jogo também a insistência dos fãs. Estas, no entanto, foram produções que, senão tiveram a crítica caindo a seus pés no lançamento, a conquistou ao longo dos anos, ou possuem outros capítulos elogiados em sua franquia.
Toda esta introdução para falarmos sobre As Aventuras de Sharkboy e Lavagirl em 3D (2005), que está completando 15 anos de seu lançamento, e imediato fracasso retumbante, nos cinemas. Projeto de vaidade do cineasta Robert Rodriguez, o longa infantil nasceu de uma parceria entre o diretor e… seu filho Racer de sete anos! Sabe quando dizemos “este filme parece ter sido criado por uma criança”? Pois bem, este de fato foi! E como já aprendemos no passado, quando os papais babões deixam seu nepotismo e egocentrismo falar mais alto, o resultado é quase sempre desastroso: vide A Dama na Água (2006), história de ninar que M. Night Shyamalan contava para seus filhos; e Depois da Terra (2013), que Will Smith bancou para seu filhão Jaden estrelar.
Bem, e porque estamos falando desta superprodução quase esquecida pelo tempo? Por alguns motivos muito curiosos. O primeiro é que Sharkboy e Lavagirl saiu das sombras recentemente, com o anúncio de uma continuação, As Aventuras de Sharkboy e Lavagirl 2: Podemos ser Heróis (We Can be Heroes), pronta para ser lançada no dia 1º de janeiro de 2021 na Netflix, exatos 16 anos depois do original. Novamente escrito e dirigido por Rodriguez, com Taylor Dooley reprisando seu papel principal, e um elenco de nomes como Pedro Pascal, Boyd Holbrook (a dupla de Narcos), Priyanka Chopra, Christian Slater e a mexicana indicada ao Oscar Adriana Barraza. Nada contra a boa intenção de Rodriguez, que faz um trabalho válido junto à criançada, produzindo com e para elas. O cineasta, desde 2001 alterna seus filmes ultraviolentos com produções para toda a família. O pontapé foi Pequenos Espiões, o qual Rodriguez transformou numa franquia de 4 filmes, e de onde Sharkboy e Lavagirl bebeu muito da fonte. Dentro do mesmo gênero, o diretor ainda lançaria A Pedra Mágica (2009).
O segundo ponto é: Sharkboy e Lavagirl (2005) foi então o filme mais caro da carreira de Robert Rodriguez, custando pesados US$50 milhões, e chegando a sequer se pagar nas bilheterias norte-americanas, onde arrecadou US$39 milhões. Pelo mundo, arrecadou mais US$32 milhões, ficando basicamente quite com sua despesa. Porém, o que chama atenção mesmo, e o que motivou esta matéria, é o terceiro tópico a ser abordado agora. Sharkboy e Lavagirl é considerado um dos piores filmes de todos os tempos na opinião… não dos críticos, mas do grande público, ocupando a posição de número 66 nesta lista nada glamorosa.
Na bíblia do cinema na rede, o banco de dados IMDB, podemos encontrar a lista dos 250 filmes mais bem avaliados de todos os tempos, por milhões de usuários, onde Um Sonho de Liberdade (1994) reina absoluto em primeira posição há anos. Mas o site também faz o trabalho sujo, e lista o fundo o baú, com os 100 piores filmes (aqui foram mais benevolentes não dando tantos “nomes aos bois”) da história do cinema na opinião de seus usuários, ou seja, do grande público. Nesta “lista do lixo”, quem “reina absoluto” em primeiro lugar, ou seria em último lugar, é a patacoada Super-Heróis: A Liga da Injustiça (2008) – título em português para Disaster Movie quase tão ruim quanto o filme em si -, parte do acervo dos filmes paródia pra lá de sem-graça que infestaram os cinemas na década de 2000.
E justamente nesta lista da vergonha alheia que se encontra o filme que Robert Rodriguez carinhosamente arquitetou ao lado da prole. E aí caímos em outra questão, aqui não são os críticos massacrando (já que no agregador Rotten Tomatoes, mesmo com baixos 19% de aprovação, o filme está longe de ser o fundo do poço), mas os fãs de cinema (votando contra o longa) e o público (não comparecendo para fazer dele um sucesso de bilheteria). A pergunta é: como uma produção “tão maldita” consegue se levantar ao ponto de despertar e gerar interesse por uma nova investida. Uma possível resposta pode ser que Rodriguez não declara, ao menos no título original We Can Be Heroes, que esta é uma continuação de Sharkboy e Lavagirl, quem sabe se comportando mais como um derivado. A segunda possibilidade é que seu público-alvo, crianças de até, digamos, 5 ou 6 anos de idade não podem ir ao cinema sozinhas e não usam o IMDB para votar a favor do longa.
Não é de hoje que os críticos não são muito cordiais com algumas produções infantis, mas o que podemos notar por esta “lista da desonra” no IMDB é que alguns dos filmes mais odiados pelo grande público são justamente produções para toda a família, vide Bebês Geniais (1999) e sua sequência (2004), O Filho do Máskara (2005), Kazaam (1996), Cada um Tem a Gêmea que Merece (2011), Emoji – O Filme (2017), Bratz – O Filme (2007) e por aí vai. Se Robert Rodriguez começar a ditar tendências e se a moda pegar, poderemos em breve ver continuações destes filmes citados. Você já imaginou?
Brincadeiras à parte, esperamos sinceramente que o novo infantil do diretor não amargue a sorte do original. Saberemos em breve e você, com certeza, poderá ler tudo sobre o filme aqui no CinePOP quando a data de lançamento estiver se aproximando.