ELENCO JOVEM EM FILME QUE REMETE A POLANSKI
Viagem Sem Volta é o primeiro de dois filmes que o jovem ator americano Michael Cera fez no Chile, ao lado do diretor Sebastián Silva, a chegar ao Brasil. O segundo filme da dupla em terras latino-americanas é a comédia Crystal Fairy e o Cacto Mágico, aventura entorpecida que será exibida no Festival do Rio 2013. Já o thriller psicológico Viagem Sem Volta recebeu por aqui um lançamento direto em vídeo. Exibido em Festivais no início do ano, como Sundance e Cannes, a produção teve um lançamento restrito nos EUA.
Na trama, cinco amigos vão passar uma temporada na casa de campo no Chile de dois deles, os irmãos Augustín e Bárbara, interpretados respectivamente por Augustín Silva e pela colombiana indicada ao Oscar, Catalina Sandino Moreno (Maria Cheia de Graça). Por ser a mais velha do grupo, Bárbara, a personagem de Moreno, não participa muito da ação, ficando apenas com a parte da adulta responsável. Para isso o roteiro a tem muito em casa, lendo, ou fazendo qualquer outra atividade que a impossibilite de estar dentro dos principais acontecimentos da trama.
Augustín é namorado de Sara, papel da subestimada Emily Browning (Beleza Adormecida). Ela leva consigo a única integrante da turma que ninguém conhecia, Alicia, papel da inglesinha Juno Temple (Killer Joe – Matador de Aluguel). Fechando o quinteto, temos o amalucado Brink, papel de Michael Cera (da série Arrested Development), na performance mais estranha e bizarra de toda a sua carreira. Aliás, tais adjetivos servem muito bem para definir Viagem Sem Volta, uma obra que mistura o terror psicológico de clássicos de Roman Polanski, como Repulsa ao Sexo e O Inquilino, com filmes de jovens.
Esse é um filme no qual o suspense é latente durante toda a projeção, embora nunca saibamos de onde virá. E isso é um grande feito, conseguir arrancar tensão e inquietude sem ter verdadeiramente uma ameaça ou antagonista, apenas a própria mente humana. Ao final da exibição, grande parte do público poderá achar que essa é uma obra vazia, e a acusação será a de que não apresentou realmente nada durante sua projeção. Ledo engano. Viagem Sem Volta ganha muitos pontos por apresentar o monstro mais assustador de todos, os relacionamentos humanos.
O interessante aqui é que o diretor Silva, autor do roteiro também, apresenta sob todas as perspectivas e ângulos, a loucura. Ele transforma todos os personagens em vítimas e antagonistas ao mesmo tempo, e isso sem apresentar grandes motivos, apenas em coisas pequenas e situações corriqueiras. Situações que sempre acabam mal quando não ocorre o entrosamento necessário entre duas pessoas. A problemática Alicia (Temple) é deixada sozinha com a turma, mesmo seu único elo sendo Sara (Browning), que precisa se ausentar temporariamente.
Daí, devido a uma série de mal entendidos, e o comportamento inadequado (principalmente do personagem de Cera), a loirinha começa a surtar e pouco a pouco entrar em variados níveis de seu inferno pessoal. Pense na sociopatia de personagens como os de Catherine Deneuve e do próprio Polanski, em seus filmes citados anteriormente, e teremos definido grande parte do comportamento de Temple aqui. Mesmo com a chegada de sua grande amiga, que retorna ao grupo, as coisas não parecem melhorar. Junte a mistura uma espécie de hipnose, verídica ou não, da menina.
Mesmo sem ser perfeito, aliás, bem longe disso (sendo o principal defeito a chance de explorar devidamente todos os seus personagens – com Browning e Moreno totalmente sem função aqui), Viagem Sem Volta é um interessante estudo psicológico e sociológico, que funciona como um coquetel molotov esperando para explodir. O filme nos deixa sem saber aonde ficar e por quem torcer, já que os delírios são constantes. O desfecho é surpreendente e impactante. Mesmo deixando um grande gosto amargo na boca do público.