Se você já está na casa dos 20, provavelmente, já não é a mesma pessoa que era aos 15 ou 17 anos (bom, esperamos, não é mesmo?). É que, ao longo do tempo, todo mundo passa por uma série de transformações físicas e emocionais e por mais um tanto de experiências boas ou ruins que afetam, diretamente, a personalidade e visão de mundo. Tem quem diga que a fase em que acontecem as principais mudanças – a adolescência – está entre as piores da vida; tem quem sinta falta da disposição da época e daquela sensação de que ainda há muitas possibilidades e escolhas pela frente… Mas, independentemente da resposta correta (se é que existe uma) ou de que lado você está, uma coisa é certa: o cinema aproveita o melhor e o pior desse período para contar histórias incríveis de amadurecimento. E a frequência com que elas aparecem é tão grande que esse estilo recebeu até nome: roubou um termo da literatura e ficou popularmente conhecido como Coming of Age ( “chegada da idade”, em tradução livre).
Mesmo que só tenha descoberto esse conceito agora, pode ter certeza de que você já viu algum filme do tipo. Sabe aquelas histórias com protagonistas adolescentes – ou da infância para a adolescência – em uma jornada que termina com um arco de evolução? Então. À primeira vista, podem até parecer produções rasas; mas, com um olhar mais atento, a gente percebe que, na verdade, a maioria desses longas entrega reflexões profundas que podem ajudar até em dilemas da vida adulta. Para quem ainda tem dúvidas desse mérito , é só observar a lista de indicados ao Oscar deste ano: Lady Bird – A Hora de Voar e Me Chame Pelo Seu Nome são representantes do gênero e disputam as categorias principais – incluindo a de Melhor Filme – ao lado de dramas considerados mais sérios.
O primeiro – protagonizado por Saoirse Ronan e uma das obras mais bem avaliadas do Rotten Tomatoes – é sobre uma adolescente no último ano de colégio que não vê a hora de sair de sua cidade natal, Sacramento, para começar a viver de verdade em Nova York. Já o segundo – que conta com a dupla Timothée Chalamet e Armie Hammer como protagonistas – traz os anos 80 como pano de fundo e narra as transformações do jovem Elio enquanto ele vive um intenso romance com Oliver, um acadêmico que fica hospedado na casa de verão da sua família para ajudar seu pai com uma pesquisa. A premissa dos dois é simples e a narrativa não é do tipo que tem grandes clímax e reviravoltas, mas um bom coming of age não precisa disso: a força está nos diálogos, nas reflexões sobre a vida e, principalmente, nos ritos de passagem dos seus protagonistas.
John Hughes e seus clássicos dos anos 80 se destacam no gênero
“Só por um instante, adoraria que minha vida fosse como nos filmes dos anos 80;
De preferência, com um número musical fantástico e sem motivo aparente.
Mas não, não…
John Hughes não dirigiu a minha vida”
– Quote de “A Mentira” (2010), de Will Gluck, um coming of age moderno que faz referência aos filmes do diretor.
Embora não tenha sido o inventor da roda – já que existem filmes desse estilo antes de suas produções, como Juventude Transviada (1955) -, John Hughes é um dos maiores representantes do gênero coming of age. Se você, assim como eu, é apaixonado pelos anos 80 e conhece os longas do diretor, sabe bem do que eu estou falando: está para nascer alguém que consiga colocar tão bem a alma dos adolescentes nas telonas.
Não lembro bem qual foi o primeiro filme que vi dele; mas, considerando meu histórico com a Sessão da Tarde, é bem provável que tenha sido o clássico Curtindo a Vida Adoidado, de 1986 (Save Ferris!). Tudo bem, o protagonista (Matthew Broderick) pode não ter terminado a história aprendendo uma grande lição – na verdade, ele é que nos ensina que é bom dar uma desacelerada às vezes para aproveitar a vida -, mas não dá para negar a evolução de seu melhor amigo Cameron (Alan Ruck). O jovem, que começa o filme depressivo e enclausurado em casa, termina com a vontade de ficar livre das amarras de seu rígido pai (e se você ainda não viu e está chateado porque falei demais, um aviso: a lei que torna qualquer spoiler liberado após dois anos e a quantidade de vezes que esse filme passou na TV me permitem dar essa informação, ok? Ok!).
Outro que me marcou demais e que, particularmente, considero um dos melhores filmes do gênero por causa da construção dos personagens é o aclamado “Clube dos Cinco” (1985). Juntando os tipos mais comuns nas panelinhas dos colégios americanos e nos filmes com temática adolescente – o atleta, o CDF, o rebelde, a esquisita e a patricinha -, a história escrita e dirigida por John Hughes se passa toda dentro da biblioteca em que os cinco alunos ficam presos em pleno sábado para cumprirem uma detenção. Com 97 minutos de puro diálogo e um único cenário, o longa tinha tudo para acabar monótono, mas nada disso acontece: ele prende e conquista com os dilemas de seus personagens e a revelação de que eles vão muito além do que seus estereótipos podem indicar. Não é à toa que The Breakfast Club, no título original, é um dos mais lembrados quando se fala nessa temática… Ele é uma verdadeira aula de coming of age e, certamente, referência para muitos outros filmes desse estilo.
E não para por aí: além desses dois, também tem Gatinhas e Gatões (1984) e A Garota de Rosa Shocking (1986) que seguem essa mesma linha. Por que você também não dirigiu minha adolescência, John Hughes?
Muito mais que filmes sobre patricinhas: Meninas Malvadas também é clássico
“Chamar alguém de gorda não nos torna mais magra.
Chamar alguém de estúpida não nos faz mais espertas.
Arruinar a vida da Regina não me fez mais feliz.
Na vida, temos de resolver nossos próprios problemas”.
– Cady Heron em “Meninas Malvadas”
Populares versus nerds. Uma abelha rainha contra uma CDF esquisita. Falsidade entre garotas. O quarterback mais bonito da turma. Baile do colégio. Você já deve estar cansado de ver filmes com todos esses elementos e, talvez, até torça o nariz para eles por não aguentar mais essa fórmula repetida (não julgo!). Mas, entre tantas produções coming of age que seguem esse estilo, não dá para deixar de destacar uma que consegue ultrapassar o lugar comum com sua genialidade e humor ácido: Meninas Malvadas (2004).
Escrito pela maravilhosa Tina Fey e dirigido por Mark Waters, Mean Girls foi o primeiro filme adolescente que vi com essa pegada diferente (só fui descobrir Atração Mortal, de 1988, muito tempo depois e não me orgulho disso – inclusive, veja se ainda não assistiu para não cometer o mesmo erro). Estava na oitava série e lembro de ter assistido, pela primeira vez, em uma festa do pijama com as amigas – ou seja, cenário perfeito para filmes do tipo. Como acontecia com tudo que eu gostava muito, revi umas 100 vezes; e, a cada nova exibição, percebia um detalhe e uma crítica nova que me faziam soltar aquele clássico “caramba, é isso mesmo que acontece!” (e, como você bem sabe, essa catarse é uma das melhores coisas que o cinema nos proporciona).
Com o passar do tempo, continuei amando o filme e revendo, pelo menos, uma vez ao ano; porém, já cheguei a me perguntar se eu gostaria tanto dele se já tivesse visto nos meus atuais 20 e tantos anos. Bom, nunca terei essa resposta, mas realmente não consigo me imaginar olhando para esse clássico e ficando indiferente à sua leitura incrível do mundo das garotas – onde nos ensinam a ser competitivas umas com as outras desde bem novinhas; a disputar a atenção de garotos; a falar pelas costas; e se sentir superior à outra colega por causa da aparência ou da quantidade maior ou menor de amigos. Ah, e o melhor é que, graças ao humor único da Tina Fey, tudo isso é mostrado sem ficar didático ou piegas.
Meninas Malvadas é feminismo before it was cool. É uma comédia adolescente, aparentemente simples, que faz uso do clichê para lançar críticas e mostrar o amadurecimento de sua protagonista – que fica bem claro na cena final da Olimpíada de Matemática e no discurso do baile de formatura. É tudo tão bem pensado que, quando paro para relembrar todos esses detalhes, não consigo me imaginar ignorando esse hino de filme que virou referência para tantas outras produções. Então, pensando bem, acho que tenho, sim, minha resposta: gostaria da história de Regina George e as poderosas ainda hoje, mesmo já tendo sobrevivido e passado pelos tempos de Ensino Médio. E, se você não concorda, é aquilo que a Gretchen Wieners já avisou no filme: “você não pode sentar com a gente!”. Ou comigo, no caso.
5 filmes coming of age para refletir:
Como já ficou claro no texto, vejo os filmes de John Hughes e Meninas Malvadas como clássicos atemporais, que continuam com o seu devido valor para o público de qualquer idade. No entanto, quem já passou dessa fase e enfrenta a lista de contas pra pagar da vida adulta pode cometer o erro de ficar bem longe desses longas – caso ainda não tenha assistido até hoje – por acreditar que não faz mais parte do público a que eles se destinam. E, bom, dependendo dos seus gêneros preferidos no cinema, isso até pode ser uma verdade mesmo (e, tudo bem, vou entender).
Porém, se você é do tipo que ama produções cinematográficas que conseguem ser simples e cheias de significados ao mesmo tempo, não faltam opções para conferir e se identificar com os dilemas dos personagens. Então, pensando nisso, preparei uma lista com 5 filmes do gênero que seguem um viés mais dramático e reflexivo – como é o caso de Lady Bird e Me Chame Pelo Seu Nome, que citei lá no começo do texto. Alguns são mais complexos, outros leves… Porém, todos ótimos. Veja:
1 – Boyhood: Da Infância à Juventude (2014), de Richard Linklater
Para começar a lista, nada melhor que um dos filmes que funciona quase como uma explicação do gênero. Ainda que você não tenha visto, já deve ter ouvido falar no longa de Linklater que foi filmado por 12 anos para acompanhar, em tempo real, a evolução de seus protagonistas da infância à maturidade. E a sinopse é essa mesmo: as diferentes fases da vida e a maneira como passamos por todos elas para nos tornar quem somos hoje. É poético, sensível, faz refletir e entrou de cara para a minha lista de favoritos.
Protagonizado por Ellar Coltrone e com nomes de peso no elenco (Ethan Hawke e Patricia Arquette estão bons para você?), o filme foi uma das maiores promessas do Oscar de 2014. Mas, no final das contas, acabou esnobado na premiação e levou para casa apenas o título de Melhor Atriz Coadjuvante pela atuação de Arquette. Confesso que fiquei feliz com a vitória de Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) na categoria principal (meu coração estava dividido entre os dois), mas ainda acho que Boyhood merecia um pouco mais de reconhecimento. Veja para ver se concorda comigo!
2- As Melhores Coisas do Mundo (2010), de Laís Bodanzky
Como já tinha virado fã da brasileira Laís Bondanzky por causa do seu trabalho em Bicho de Sete Cabeças (2001), fui ver As Melhores Coisas do Mundo cheia de expectativas – que, felizmente, foram atendidas. Superadas, na verdade. É que, até então, ainda não tinha assistido a nenhum filme brasileiro que tratasse sobre a delicada fase da adolescência sem acabar caindo no lugar comum ou na estereotipação dos personagens. E isso é tudo o que não acontece nesse belíssimo roteiro assinado por Luiz Bolognesi, que traz o ótimo Francisco Miguez como protagonista.
O foco da história é Mano, um garoto de 15 anos, classe média, que leva a vida como qualquer outro adolescente da idade – ou seja, colégio, balada, grupinho de amigos, estresse com a família e primeiras descobertas amorosas. Mas, como se não bastasse ter que lidar com todas as transformações que acompanham essa fase, ele ainda é surpreendido por uma revelação que muda, drasticamente, toda a dinâmica da sua família: após anos de casamento, seu pai (interpretado pelo ator Zé Carlos Machado) conta que é gay e que está em um relacionamento com um de seus orientandos da faculdade – em uma época em que esses assuntos não eram discutidos tão abertamente, vale ressaltar.
Lembro de ter saído do cinema com um sorriso no rosto e uma imensa vontade de indicar esse filme para todo mundo. Então, se ainda não viu e curte o gênero, faça esse favor para você mesmo! Ah, e já aviso: depois de assistir ao longa, prepare-se para ficar cantarolando Something, dos Beatles, por um longo tempo.
3 – Quase 18 (2017), de Kelly Fremon Craig
À primeira vista, Quase 18 parece um filme simples e sem muita reflexão para oferecer – e, para ser sincera, essa impressão continua até um certo ponto da história. Mas, quando a narrativa se desenvolve e a gente começa a entender os dilemas da personagem principal (vivida pela maravilhosa Hailee Steinfeld – que, para mim, é uma das melhores atrizes dessa nova geração), The Edge of Seventeen surpreende e se mostra bem mais profundo que o esperado. Para você ter uma ideia: coloquei para assistir em um domingo só para passar o tempo e acabei limpando algumas lágrimas em uma das cenas mais importantes da evolução da personagem.
A protagonista é Nadine, uma adolescente de 17 anos que, desde muito nova, não se identifica com as pessoas da sua idade e tem dificuldades de fazer amizade. Mas, para não dizer que é totalmente solitária, ela tem uma única e fiel melhor amiga de anos, Krista (Haley Lu Richardson). No entanto, quando a jovem começa a se envolver com o seu irmão mais velho (Darian, interpretado por Blake Jenner), a dupla fica estremecida porque Nadine não consegue suportar a ideia de dividir a atenção da garota com outras pessoas – ainda mais seu irmão, com quem mantém uma relação complicada.
Não vou falar muito além disso para não entrar em detalhes, mas já adianto que um dos maiores méritos desse longa é a narrativa com uma heroína nada perfeita (você vai se irritar com ela em vários momentos, fique sabendo) e sua proposta de nos fazer lançar um segundo olhar sobre as situações – afinal, amadurecimento também tem a ver com tudo isso. Quer mais motivos para ver? Te dou três! Hailee Steinfeld foi indicada ao Globo de Ouro e ao Critic’s Choice Awards de Melhor Atriz em Comédia; o filme também foi indicado para Melhor Comédia nessa segunda premiação; e tem o ótimo Woody Harrelson no elenco, interpretando um professor que todo mundo gostaria de ter.
4 – Moonlight: Sob a Luz do Luar (2017), de Barry Jenkins
Moonlightnão é só o filme que, literalmente, tirou o prêmio das mãos de La La Land: Cantando Estaçõesno Oscar do ano passado: ele é um dos mais lembrados quando se fala em representatividade negra (até por ter levado para casa o maior prêmio da Academia na época das críticas sobre o “Oscar So White”) e, também, um ótimo exemplo de coming of age.
Dividido em três atos – infância, adolescência e fase adulta – , o longa acompanha a trajetória de Chiron (Trevante Rhodes na última fase), um garoto negro da periferia de Miami que atravessa a vida tentando encontrar o seu lugar e o seu próprio “eu” no mundo. Abordando assuntos como droga, homossexualidade e problemas em família, Moonlight nos apresenta uma jornada de amadurecimento e, principalmente, autoconhecimento de seu protagonista – e tudo isso acompanhado por uma das fotografias mais bonitas que já tive o prazer de ver nos filmes. Se você quer uma opção diferente e com reflexões ainda mais profundas, já pode começar por esse!
5 – Cinema Paradiso (1988), de Giuseppe Tornatore
Para fechar a lista, não poderia deixar de citar esse filme italiano que é uma verdadeira homenagem ao cinema. Confesso que, quando comecei a fazer minha seleção, nem tinha me dado conta que ele também era um coming of age – porque, antes de conseguir pensar em qualquer outro foco, logo o vejo como um longa metalinguístico sobre a sétima arte. Mas, sim, Cinema Paradiso também está entre os representantes do gênero. E é um dos melhores e mais bonitos.
A história começa quando Toto (vivido por Jacques Perrin na fase adulta) recebe a notícia do falecimento do seu velho amigo Alfredo (Philippe Noiret) e volta à cidade em que nasceu, a pequena Sicilia, para dar seu último adeus. Quando chega lá, após anos longe de casa, é tomado pela nostalgia e começa a relembrar os melhores momentos que os dois viveram juntos na época de sua infância e juventude.
A partir daí, a narrativa volta para o passado – mais especificamente, para meados da década de 40, no período pós-Segunda Guerra Mundial e um pouco antes da chegada da televisão. O Toto adulto dá lugar à criança e passa a ser interpretado por Salvatore Cascio (também conhecido como “o garoto mais fofo dessa vida”) para que a gente acompanhe tudo o que aconteceu desde o início: a improvável amizade com o rabugento Alfredo, que era projecionista do cinema de rua da cidade; o amor cada vez maior de Toto pela sétima arte – ao mesmo tempo que ela ia perdendo um pouco seu espaço entre os demais moradores -; a chegada do amadurecimento; o primeiro amor; e as difíceis escolhas que precisaram ser feitas para que, já jovem, ele pudesse ir atrás de seu sonho. Assista com um lencinho!
Se você já está na casa dos 20, provavelmente, já não é a mesma pessoa que era aos 15 ou 17 anos (bom, esperamos, não é mesmo?). É que, ao longo do tempo, todo mundo passa por uma série de transformações físicas e emocionais e por mais um tanto de experiências boas ou ruins que afetam, diretamente, a personalidade e visão de mundo. Tem quem diga que a fase em que acontecem as principais mudanças – a adolescência – está entre as piores da vida; tem quem sinta falta da disposição da época e daquela sensação de que ainda há muitas possibilidades e escolhas pela frente… Mas, independentemente da resposta correta (se é que existe uma) ou de que lado você está, uma coisa é certa: o cinema aproveita o melhor e o pior desse período para contar histórias incríveis de amadurecimento. E a frequência com que elas aparecem é tão grande que esse estilo recebeu até nome: roubou um termo da literatura e ficou popularmente conhecido como Coming of Age ( “chegada da idade”, em tradução livre).
Mesmo que só tenha descoberto esse conceito agora, pode ter certeza de que você já viu algum filme do tipo. Sabe aquelas histórias com protagonistas adolescentes – ou da infância para a adolescência – em uma jornada que termina com um arco de evolução? Então. À primeira vista, podem até parecer produções rasas; mas, com um olhar mais atento, a gente percebe que, na verdade, a maioria desses longas entrega reflexões profundas que podem ajudar até em dilemas da vida adulta. Para quem ainda tem dúvidas desse mérito , é só observar a lista de indicados ao Oscar deste ano: Lady Bird – A Hora de Voar e Me Chame Pelo Seu Nome são representantes do gênero e disputam as categorias principais – incluindo a de Melhor Filme – ao lado de dramas considerados mais sérios.
O primeiro – protagonizado por Saoirse Ronan e uma das obras mais bem avaliadas do Rotten Tomatoes – é sobre uma adolescente no último ano de colégio que não vê a hora de sair de sua cidade natal, Sacramento, para começar a viver de verdade em Nova York. Já o segundo – que conta com a dupla Timothée Chalamet e Armie Hammer como protagonistas – traz os anos 80 como pano de fundo e narra as transformações do jovem Elio enquanto ele vive um intenso romance com Oliver, um acadêmico que fica hospedado na casa de verão da sua família para ajudar seu pai com uma pesquisa. A premissa dos dois é simples e a narrativa não é do tipo que tem grandes clímax e reviravoltas, mas um bom coming of age não precisa disso: a força está nos diálogos, nas reflexões sobre a vida e, principalmente, nos ritos de passagem dos seus protagonistas.
John Hughes e seus clássicos dos anos 80 se destacam no gênero
“Só por um instante, adoraria que minha vida fosse como nos filmes dos anos 80;
De preferência, com um número musical fantástico e sem motivo aparente.
Mas não, não…
John Hughes não dirigiu a minha vida”
– Quote de “A Mentira” (2010), de Will Gluck, um coming of age moderno que faz referência aos filmes do diretor.
Embora não tenha sido o inventor da roda – já que existem filmes desse estilo antes de suas produções, como Juventude Transviada (1955) -, John Hughes é um dos maiores representantes do gênero coming of age. Se você, assim como eu, é apaixonado pelos anos 80 e conhece os longas do diretor, sabe bem do que eu estou falando: está para nascer alguém que consiga colocar tão bem a alma dos adolescentes nas telonas.
Não lembro bem qual foi o primeiro filme que vi dele; mas, considerando meu histórico com a Sessão da Tarde, é bem provável que tenha sido o clássico Curtindo a Vida Adoidado, de 1986 (Save Ferris!). Tudo bem, o protagonista (Matthew Broderick) pode não ter terminado a história aprendendo uma grande lição – na verdade, ele é que nos ensina que é bom dar uma desacelerada às vezes para aproveitar a vida -, mas não dá para negar a evolução de seu melhor amigo Cameron (Alan Ruck). O jovem, que começa o filme depressivo e enclausurado em casa, termina com a vontade de ficar livre das amarras de seu rígido pai (e se você ainda não viu e está chateado porque falei demais, um aviso: a lei que torna qualquer spoiler liberado após dois anos e a quantidade de vezes que esse filme passou na TV me permitem dar essa informação, ok? Ok!).
Outro que me marcou demais e que, particularmente, considero um dos melhores filmes do gênero por causa da construção dos personagens é o aclamado “Clube dos Cinco” (1985). Juntando os tipos mais comuns nas panelinhas dos colégios americanos e nos filmes com temática adolescente – o atleta, o CDF, o rebelde, a esquisita e a patricinha -, a história escrita e dirigida por John Hughes se passa toda dentro da biblioteca em que os cinco alunos ficam presos em pleno sábado para cumprirem uma detenção. Com 97 minutos de puro diálogo e um único cenário, o longa tinha tudo para acabar monótono, mas nada disso acontece: ele prende e conquista com os dilemas de seus personagens e a revelação de que eles vão muito além do que seus estereótipos podem indicar. Não é à toa que The Breakfast Club, no título original, é um dos mais lembrados quando se fala nessa temática… Ele é uma verdadeira aula de coming of age e, certamente, referência para muitos outros filmes desse estilo.
E não para por aí: além desses dois, também tem Gatinhas e Gatões (1984) e A Garota de Rosa Shocking (1986) que seguem essa mesma linha. Por que você também não dirigiu minha adolescência, John Hughes?
Muito mais que filmes sobre patricinhas: Meninas Malvadas também é clássico
“Chamar alguém de gorda não nos torna mais magra.
Chamar alguém de estúpida não nos faz mais espertas.
Arruinar a vida da Regina não me fez mais feliz.
Na vida, temos de resolver nossos próprios problemas”.
– Cady Heron em “Meninas Malvadas”
Populares versus nerds. Uma abelha rainha contra uma CDF esquisita. Falsidade entre garotas. O quarterback mais bonito da turma. Baile do colégio. Você já deve estar cansado de ver filmes com todos esses elementos e, talvez, até torça o nariz para eles por não aguentar mais essa fórmula repetida (não julgo!). Mas, entre tantas produções coming of age que seguem esse estilo, não dá para deixar de destacar uma que consegue ultrapassar o lugar comum com sua genialidade e humor ácido: Meninas Malvadas (2004).
Escrito pela maravilhosa Tina Fey e dirigido por Mark Waters, Mean Girls foi o primeiro filme adolescente que vi com essa pegada diferente (só fui descobrir Atração Mortal, de 1988, muito tempo depois e não me orgulho disso – inclusive, veja se ainda não assistiu para não cometer o mesmo erro). Estava na oitava série e lembro de ter assistido, pela primeira vez, em uma festa do pijama com as amigas – ou seja, cenário perfeito para filmes do tipo. Como acontecia com tudo que eu gostava muito, revi umas 100 vezes; e, a cada nova exibição, percebia um detalhe e uma crítica nova que me faziam soltar aquele clássico “caramba, é isso mesmo que acontece!” (e, como você bem sabe, essa catarse é uma das melhores coisas que o cinema nos proporciona).
Com o passar do tempo, continuei amando o filme e revendo, pelo menos, uma vez ao ano; porém, já cheguei a me perguntar se eu gostaria tanto dele se já tivesse visto nos meus atuais 20 e tantos anos. Bom, nunca terei essa resposta, mas realmente não consigo me imaginar olhando para esse clássico e ficando indiferente à sua leitura incrível do mundo das garotas – onde nos ensinam a ser competitivas umas com as outras desde bem novinhas; a disputar a atenção de garotos; a falar pelas costas; e se sentir superior à outra colega por causa da aparência ou da quantidade maior ou menor de amigos. Ah, e o melhor é que, graças ao humor único da Tina Fey, tudo isso é mostrado sem ficar didático ou piegas.
Meninas Malvadas é feminismo before it was cool. É uma comédia adolescente, aparentemente simples, que faz uso do clichê para lançar críticas e mostrar o amadurecimento de sua protagonista – que fica bem claro na cena final da Olimpíada de Matemática e no discurso do baile de formatura. É tudo tão bem pensado que, quando paro para relembrar todos esses detalhes, não consigo me imaginar ignorando esse hino de filme que virou referência para tantas outras produções. Então, pensando bem, acho que tenho, sim, minha resposta: gostaria da história de Regina George e as poderosas ainda hoje, mesmo já tendo sobrevivido e passado pelos tempos de Ensino Médio. E, se você não concorda, é aquilo que a Gretchen Wieners já avisou no filme: “você não pode sentar com a gente!”. Ou comigo, no caso.
5 filmes coming of age para refletir:
Como já ficou claro no texto, vejo os filmes de John Hughes e Meninas Malvadas como clássicos atemporais, que continuam com o seu devido valor para o público de qualquer idade. No entanto, quem já passou dessa fase e enfrenta a lista de contas pra pagar da vida adulta pode cometer o erro de ficar bem longe desses longas – caso ainda não tenha assistido até hoje – por acreditar que não faz mais parte do público a que eles se destinam. E, bom, dependendo dos seus gêneros preferidos no cinema, isso até pode ser uma verdade mesmo (e, tudo bem, vou entender).
Porém, se você é do tipo que ama produções cinematográficas que conseguem ser simples e cheias de significados ao mesmo tempo, não faltam opções para conferir e se identificar com os dilemas dos personagens. Então, pensando nisso, preparei uma lista com 5 filmes do gênero que seguem um viés mais dramático e reflexivo – como é o caso de Lady Bird e Me Chame Pelo Seu Nome, que citei lá no começo do texto. Alguns são mais complexos, outros leves… Porém, todos ótimos. Veja:
1 – Boyhood: Da Infância à Juventude (2014), de Richard Linklater
Para começar a lista, nada melhor que um dos filmes que funciona quase como uma explicação do gênero. Ainda que você não tenha visto, já deve ter ouvido falar no longa de Linklater que foi filmado por 12 anos para acompanhar, em tempo real, a evolução de seus protagonistas da infância à maturidade. E a sinopse é essa mesmo: as diferentes fases da vida e a maneira como passamos por todos elas para nos tornar quem somos hoje. É poético, sensível, faz refletir e entrou de cara para a minha lista de favoritos.
Protagonizado por Ellar Coltrone e com nomes de peso no elenco (Ethan Hawke e Patricia Arquette estão bons para você?), o filme foi uma das maiores promessas do Oscar de 2014. Mas, no final das contas, acabou esnobado na premiação e levou para casa apenas o título de Melhor Atriz Coadjuvante pela atuação de Arquette. Confesso que fiquei feliz com a vitória de Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) na categoria principal (meu coração estava dividido entre os dois), mas ainda acho que Boyhood merecia um pouco mais de reconhecimento. Veja para ver se concorda comigo!
2- As Melhores Coisas do Mundo (2010), de Laís Bodanzky
Como já tinha virado fã da brasileira Laís Bondanzky por causa do seu trabalho em Bicho de Sete Cabeças (2001), fui ver As Melhores Coisas do Mundo cheia de expectativas – que, felizmente, foram atendidas. Superadas, na verdade. É que, até então, ainda não tinha assistido a nenhum filme brasileiro que tratasse sobre a delicada fase da adolescência sem acabar caindo no lugar comum ou na estereotipação dos personagens. E isso é tudo o que não acontece nesse belíssimo roteiro assinado por Luiz Bolognesi, que traz o ótimo Francisco Miguez como protagonista.
O foco da história é Mano, um garoto de 15 anos, classe média, que leva a vida como qualquer outro adolescente da idade – ou seja, colégio, balada, grupinho de amigos, estresse com a família e primeiras descobertas amorosas. Mas, como se não bastasse ter que lidar com todas as transformações que acompanham essa fase, ele ainda é surpreendido por uma revelação que muda, drasticamente, toda a dinâmica da sua família: após anos de casamento, seu pai (interpretado pelo ator Zé Carlos Machado) conta que é gay e que está em um relacionamento com um de seus orientandos da faculdade – em uma época em que esses assuntos não eram discutidos tão abertamente, vale ressaltar.
Lembro de ter saído do cinema com um sorriso no rosto e uma imensa vontade de indicar esse filme para todo mundo. Então, se ainda não viu e curte o gênero, faça esse favor para você mesmo! Ah, e já aviso: depois de assistir ao longa, prepare-se para ficar cantarolando Something, dos Beatles, por um longo tempo.
3 – Quase 18 (2017), de Kelly Fremon Craig
À primeira vista, Quase 18 parece um filme simples e sem muita reflexão para oferecer – e, para ser sincera, essa impressão continua até um certo ponto da história. Mas, quando a narrativa se desenvolve e a gente começa a entender os dilemas da personagem principal (vivida pela maravilhosa Hailee Steinfeld – que, para mim, é uma das melhores atrizes dessa nova geração), The Edge of Seventeen surpreende e se mostra bem mais profundo que o esperado. Para você ter uma ideia: coloquei para assistir em um domingo só para passar o tempo e acabei limpando algumas lágrimas em uma das cenas mais importantes da evolução da personagem.
A protagonista é Nadine, uma adolescente de 17 anos que, desde muito nova, não se identifica com as pessoas da sua idade e tem dificuldades de fazer amizade. Mas, para não dizer que é totalmente solitária, ela tem uma única e fiel melhor amiga de anos, Krista (Haley Lu Richardson). No entanto, quando a jovem começa a se envolver com o seu irmão mais velho (Darian, interpretado por Blake Jenner), a dupla fica estremecida porque Nadine não consegue suportar a ideia de dividir a atenção da garota com outras pessoas – ainda mais seu irmão, com quem mantém uma relação complicada.
Não vou falar muito além disso para não entrar em detalhes, mas já adianto que um dos maiores méritos desse longa é a narrativa com uma heroína nada perfeita (você vai se irritar com ela em vários momentos, fique sabendo) e sua proposta de nos fazer lançar um segundo olhar sobre as situações – afinal, amadurecimento também tem a ver com tudo isso. Quer mais motivos para ver? Te dou três! Hailee Steinfeld foi indicada ao Globo de Ouro e ao Critic’s Choice Awards de Melhor Atriz em Comédia; o filme também foi indicado para Melhor Comédia nessa segunda premiação; e tem o ótimo Woody Harrelson no elenco, interpretando um professor que todo mundo gostaria de ter.
4 – Moonlight: Sob a Luz do Luar (2017), de Barry Jenkins
Moonlightnão é só o filme que, literalmente, tirou o prêmio das mãos de La La Land: Cantando Estaçõesno Oscar do ano passado: ele é um dos mais lembrados quando se fala em representatividade negra (até por ter levado para casa o maior prêmio da Academia na época das críticas sobre o “Oscar So White”) e, também, um ótimo exemplo de coming of age.
Dividido em três atos – infância, adolescência e fase adulta – , o longa acompanha a trajetória de Chiron (Trevante Rhodes na última fase), um garoto negro da periferia de Miami que atravessa a vida tentando encontrar o seu lugar e o seu próprio “eu” no mundo. Abordando assuntos como droga, homossexualidade e problemas em família, Moonlight nos apresenta uma jornada de amadurecimento e, principalmente, autoconhecimento de seu protagonista – e tudo isso acompanhado por uma das fotografias mais bonitas que já tive o prazer de ver nos filmes. Se você quer uma opção diferente e com reflexões ainda mais profundas, já pode começar por esse!
5 – Cinema Paradiso (1988), de Giuseppe Tornatore
Para fechar a lista, não poderia deixar de citar esse filme italiano que é uma verdadeira homenagem ao cinema. Confesso que, quando comecei a fazer minha seleção, nem tinha me dado conta que ele também era um coming of age – porque, antes de conseguir pensar em qualquer outro foco, logo o vejo como um longa metalinguístico sobre a sétima arte. Mas, sim, Cinema Paradiso também está entre os representantes do gênero. E é um dos melhores e mais bonitos.
A história começa quando Toto (vivido por Jacques Perrin na fase adulta) recebe a notícia do falecimento do seu velho amigo Alfredo (Philippe Noiret) e volta à cidade em que nasceu, a pequena Sicilia, para dar seu último adeus. Quando chega lá, após anos longe de casa, é tomado pela nostalgia e começa a relembrar os melhores momentos que os dois viveram juntos na época de sua infância e juventude.
A partir daí, a narrativa volta para o passado – mais especificamente, para meados da década de 40, no período pós-Segunda Guerra Mundial e um pouco antes da chegada da televisão. O Toto adulto dá lugar à criança e passa a ser interpretado por Salvatore Cascio (também conhecido como “o garoto mais fofo dessa vida”) para que a gente acompanhe tudo o que aconteceu desde o início: a improvável amizade com o rabugento Alfredo, que era projecionista do cinema de rua da cidade; o amor cada vez maior de Toto pela sétima arte – ao mesmo tempo que ela ia perdendo um pouco seu espaço entre os demais moradores -; a chegada do amadurecimento; o primeiro amor; e as difíceis escolhas que precisaram ser feitas para que, já jovem, ele pudesse ir atrás de seu sonho. Assista com um lencinho!