sexta-feira, março 29, 2024

A Evolução da Narrativa – Da Escrita ao Cinema e os Videogames

Historicamente obras populares estão intimamente ligadas a tendências populares e vice versa

Sempre é interessante refletir sobre como grandes obras foram e são criadas de acordo com o tempo em que vivem. Hoje em dia essa linha de pensamento se traduz no conceito do mercado consumidor. Do que é trend e do que o público quer consumir manifestado pelas redes sociais. Apesar da novidade do conceito, a ideia de que os meios influenciam na produção de obras não é nem um pouco nova e está atrelada historicamente ao processo criativo.

Pinturas rupestres por exemplo foram uma forma de comunicação nascida da necessidade que determinada tribo tinha de registrar sua passagem pela região. O conceito de mitologias surgiu da necessidade do homem explicar o mundo e os acontecimentos naturais a seu redor da forma como lhe era acessível até então.

O tempo passou, Gutenberg criou a prensa e a habilidade de ler e escrever se popularizou. Com isso novos pontos de vista começaram a influenciar sobre o que se entendia tradicionalmente como o que era “literatura respeitável”, um exemplo sendo Dom Quixote de Miguel de Cervantes

Jonathan Pryce como Dom Quixote

Uma história que, ainda em 1605, brincou abertamente com o imaginário popular do que era um cavaleiro e até da ideia de cavalaria no geral trazendo um protagonista que se via ainda como membro desse mundo irreal mas capaz de dialogar com o leitor mais diretamente do que qualquer outro personagem mais “digno” poderia.

Mais avanço dos tempos trouxe mais diversificação nas ofertas literárias, como as Penny Dreadfuls em fins do século XIX que mesmo sendo consideradas entretenimento barato e de baixo nível foram capazes de criar uma relação com o leitor ao ambientarem histórias mais próximas dos cenários sujos que a vasta maioria da população inglesa vivia do que a maior parte dos romances tidos como “mais civilizados”.

Um exemplar de penny dreadful

Logo depois viria a revolução narrativa iniciada pela criação do cinema, consolidada com o início do cinema falado e ampliada com as primeiras cores em cenas ainda no século XX. A diferença é que pela primeira vez a imagem e som estavam mais em sincronia do que nunca. Por alguns centavos o sujeito comum poderia assistir a uma narrativa que juntaria, por exemplo, cenários fantasiosos que ele vira em sua literatura popular junto a sons que antes estavam confinados em grandes teatros frequentados pela elite.

Novamente, todas as obras que vieram para consumo de massa no decorrer dos séculos estavam inseridas em um contexto social ou econômico maior. Foram frutos de uma demanda do mercado consumidor. As Penny Dreadful mencionadas anteriormente se popularizaram nos anos da revolução industrial para atender a demanda da classe trabalhadora inglesa por uma diversão e porque seu custo de produção era bastante baixo, o que incentiva o surgimento de diversas editoras para esse segmento.

No cinema, muitas das principais fases que tomaram Hollywood eram para suprir a vontade do público consumidor que respondia muito bem, em termos de bilheteria, a certos estilos de filme. O gênero de Western (faroeste) começou, ainda que não oficialmente, com o filme O Grande Roubo do Trem (1903) no qual o diretor Edwin Porter teve como inspiração tanto um espetáculo da Broadway quanto um caso real de roubo de trem em 1900.

Icônica cena final de O Grande Roubo do Trem

A demanda por mais produtos do gênero foi tão alta nas décadas que se seguiram que no livro Tudo Sobre Cinema, Philip Kemp estabelece que somente na década de 1950, Hollywood fez mais de 800 filmes do gênero Westerns. Alguns anos depois, Hollywood entraria em uma fase de renovação com filmes mais violentos e tramas mais urbanas que refletiam o momento pelo qual a sociedade passava com relação a drogas, violência, guerra e crises.

A partir de 2008, mais especificamente após o início do MCU (Universo Cinematográfico Marvel) com Homem de Ferro, o mercado consumidor passou a requerer mais adaptações de quadrinhos mas não iguais as então recentes trilogia do Homem Aranha ou dos X-Men; o desejo era por produtos individuais que estivessem inseridos em um universo maior. Isso se traduz principalmente na receita gerada por ele; ao todo o MCU arrecadou US$ 22 bilhões segundo uma matéria da CNBC de 2019.

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Universo Cinematográfico Marvel continua a fazer dinheiro

É um modelo de produção que ainda é bastante lucrativo e basicamente todo estúdio passou a cobiçar seu próprio universo compartilhado: a Warner com o Universo da DC Comics e de Invocação do Mal, a Universal com seu Dark Universe, a Sony com o “Aranhaverso” e por aí vai. Mesmo sendo uma tendência forte entre os consumidores isso não significa sucesso automático.

Até a indústria de videogames passou a se adaptar ao desejo do consumidor mesmo que um pouco mais devagar devido a espera de evoluções tecnológicas no setor. Quando Castle Wolfenstein estourou em 1981 os jogos de stealth foram bem recebidos o suficiente para Kojima produzir Metal Gear em 1987, o sucesso em 1992 de Wolfenstein 3D incentivou no ano seguinte o nascimento de Doom no gênero FPS (tiro em primeira pessoa) e por aí segue.

Capa do mais recente lançamento da série Doom

De 2001 para frente se iniciou a era dos jogos de mundo aberto, motivados pela revolução proposta por GTA III. Esse modelo foi o primeiro contato de muitos jogadores com qualquer tipo de jogo eletrônico e a resposta deles foram por mais produtos do tipo. Daí nasceram títulos como Drive, GTA: San Andreas, Saints Row, True Crime e etc.

A partir de 2010, com Heavy Rain, histórias imersivas junto a gameplays relativamente simples se provaram bem aceitos por público e crítica. Focando nisso, três anos depois veio o sucesso de The Last of Us com uma narrativa mais intimista entre dois personagens e que serviu de base para outros jogos de sucesso como God of War 2018 e The Last of Us Part II .

Ellie, a protagonista de The Last of Us Part II

Agora, mais do que nunca, o consumidor tem sua própria voz ampliada por redes sociais e as empresas entenderam que eles não podem mais ser completamente ignorados. Por vezes essas vozes externas trazem bons resultados, como a modificação na estética do Sonic para a adaptação aos cinemas, e em outras apenas expõem as piores faces das pessoas como nos ataques à atriz Kelly Marie Tran que fez a Rose Tico em Os Últimos Jedi.

Independente disso tudo a tendência é que o mercado consumidor se torne ainda mais mesclado com a indústria do entretenimento, influenciando diretamente via posts decisões criativas dentro de produções, assim como a indústria do entretenimento se torne mais ativa entre os próprios consumidores, como foi durante o fenômeno do Pantera Negra e é com Star Wars desde 1977.  

 

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