Vidas que se Cruzam
Com o slogan “Miséria adora a família”, Álbum de Família chega ao Brasil bem a tempo das festividades de fim de ano. Extremamente identificável por trazer as desventuras de uma grande família reunida para um evento, esmiuçando cada característica de seus membros, assim como na minha ou na sua reunião de parentes. Aqui, no entanto, a época não é a de celebração do Natal ou qualquer festividade de fim de ano, mas sim um inesperado e traumático funeral.
Baseado numa peça de 2007 ganhadora dos prêmios Pulitzer e Tony, escrita por Tracy Letts (responsável pelo roteiro dos ótimos Possuídos, 2007, e Killer Joe – Matador de Aluguel, 2012), o filme é adaptado ao cinema pelo próprio dramaturgo; que traz para as telonas as amarguras em ponto de ebulição da família Weston. Sua reunião ocorre na casa campestre na qual cresceram, em Oklahoma, no condado de Osage – que dá título à obra. Lá, três irmãs voltam a se reunir e a enfrentar seu maior demônio: a mãe Violet Weston, uma mulher amargurada, cruel, e repressora.
Porém, o chamariz para o grande público, e o que todos irão atrás, é a presença das Oscarizadas Meryl Streep (Um Divã para Dois) e Julia Roberts (Espelho, Espelho Meu) – divas desta geração do cinema, dividindo a cena pela primeira vez. Streep é a matriarca intransigente citada, e a atriz não encontra dificuldade para brilhar mais uma vez e basicamente garantir uma nova indicação ao Oscar. Ela está indicada no Globo de Ouro, embora Álbum de Família não seja mais comédia do que Blue Jasmine ou Walt nos Bastidores de Mary Poppins, categorizados como drama – vai entender…
Já Roberts, indicada igualmente ao prêmio – na categoria de coadjuvante, possui um papel menos chamativo, o da sofredora primogênita Barbara Weston. Sua personagem precisa lidar com a recente separação do marido, Ewan McGregor (Jack – O Caçador de Gigantes), ainda um fato que precisa ser mantido em segredo; e os conflitos constantes com a filha adolescente, Abigail Breslin (Ender´s Game – O Jogo do Exterminador). Com tudo isso, a personagem de Roberts começa a exibir traços da personalidade da mãe.
Temos também a negligenciada e introvertida filha do meio Ivy, vivida por um dos rostos menos conhecidos do elenco, mas que vem chamando mais atenção por sua performance, a atriz Julianne Nicholson (da série Masters of Sex). Existe muito falatório de que Nicholson passará a perna na mais famosa Roberts, por uma indicação de coadjuvante no Oscar. E por fim, a caçula Karen Weston, vivida pela atriz e cantora Juliette Lewis (Angie), papel anteriormente oferecido às atrizes Renée Zellweger (A Minha Canção de Amor) e Andrea Riseborough (Oblivion).
Além do duelo de gigantes oferecido por Streep e Roberts, que a certa altura se digladiam fisicamente quando mãe e filha lutam pela posse de um remédio até caírem no chão (cena estampada num dos cartazes), Álbum de Família também providencia um dos melhores elencos de 2013; e traz gente como Chris Cooper (Sem Proteção), Sam Shepard (Amor Bandido), Benedict Cumberbatch (O Hobbit – A Desolação de Smaug), Margo Martindale (da série The Millers), Misty Upham (Jimmy P.), e Dermot Mulroney (Jobs) – num papel que poderia ter ficado com Jim Carrey (Kick-Ass 2).
Martindale e Upham também merecem destaque por seus desempenhos. Uma curiosidade é que Roberts e Mulroney formavam um casal em O Casamento do Meu Melhor Amigo (1997), filme que revigorou a carreira da atriz, e agora se reencontram em um filme bem diferente. Álbum de Família mescla humor e tragédia, muita tragédia, oferecendo também momentos inquietantes – como a cena entre Mulroney e a menina Breslin. A obra funciona melhor como drama, no entanto, errando muitas vezes o alvo com seu timing cômico, justamente por fazer uso de um tipo de humor muito ácido e negro.
Álbum de Família soa também como uma novela muitas vezes, por suas picuinhas familiares e reviravoltas escandalosas e mirabolantes. O fato promete ressoar muito próximo ao público brasileiro, adepto dos folhetins diários da TV aberta. Em sua defesa, a obra do diretor John Wells (A Grande Virada) não é tão ruim, repetitiva ou caricata quanto a melhor das telenovelas Globais. Além de exibir muita coragem e crueza em seu desfecho. Nessa época de festividades de fim de ano, ao olharmos de perto para a família Weston, sem dúvidas agradeceremos pela que temos.