sexta-feira , 15 novembro , 2024

Anticristo

 

O internauta deve ter ouvido glórias e pedradas sobre Anticristo, novo trabalho de Lars Von Trier. Em parte, foram reações provocadas pelas sequências finais, que se aproximam do cinema extremo. São as tão faladas cenas de mutilação dos genitais. Outro motivo foi o diretor ter feito o filme ainda se recuperando de uma depressão. Some-se a sua declaração de que não explicaria nada sobre o filme. Pronto, o suficiente para parte da crítica atacá-lo.



Apesar das circunstâncias da produção, Anticristo se mantém de pé. Considerando um autor como Von Trier, que vem de obras como Dogville, não podemos esperar algo fácil. Se o cinéfilo quiser o doce da bandeja, deverá se levantar e buscá-lo. Se o espectador amarrar as pontas, poderá sair do cinema com uma sensação mais nauseabunda que a maioria.

O filme se concentra na depressão sofrida por uma mulher após a morte do filho e como o marido tenta ajudá-la. E, principalmente, nas consequência. A primeira sequência é um belo prólogo em câmera lenta e fotografia em preto-e-branco. Enquanto uma cena de sexo entre o casal é mostrada, o filho Nic se dirige para a janela e cai. O acontecimento provoca profunda depressão na mãe (Charlotte Gainsbourg) – em nenhum momento, homem ou mulher são nomeados.

Muito se falou da atuação de Gainsbourg; realmente consegue expor todas as dores de uma mulher que perdeu o filho. Porém, Dafoe não fica atrás. Ocorre que sua atuação não é histriônica. O ator demonstra o afastamento do marido em relação à situação com pequenos gestos e voz burocrática, sempre buscando racionalizar as reações da espora. As dúvidas provocadas pelos acontecimentos no Éden (casa de campo do casal) aprofundam a psicologia da personagem, impedindo que ele se torne um tipo.

A película, contudo, é mais que um “filme de ator”. A marca de Von Trier se faz notar na profundidade da história. Caso o leitor não queria saber o final, pare aqui, porque vamos entregar tudo.

O diretor deixa muitas pontas soltas. Nada de final redondinho. O filme permite muitas interpretações, sempre em torno do que provoca a insanidade da mulher.

A fase inicial de depressão da personagem de Gainsbourg é seguida por reações díspares. Ela acusa o marido de esquecer a familiar, depois declara amor eterno e em seguida tortura-o; há sua relação ambígua com o sexo, ora como uma ninfomaníaca ora culpando-se pelo ato.

A morte do filho seria a primeira causa. Outro agente seria a natureza. Von Trier consegue personificá-la. Ruídos, gritos, animais falantes tornam o Éden um ambiente de horror e claustrofóbico. Constantemente se escuta o barulho das sementes das árvores caindo no telhado, dando a impressão de que a casa será invadida. É quase impulsivo culpar a natureza pelo caos reinante. A própria mulher diz que a natureza é a morada de Satanás.

Todas essas interpretações são permitidas. Porém, uma terceira resposta é possível por conta das pontas deixadas pelo direito.

Primeiro, descobrimos que a mãe já maltratava o filho. Isso explicaria tanto para seus atos quanto para a ideia que faz da natureza em torno do Éden. A morte do filho seria apenas a gota final.

Outro elemento é a culpa pelo falecimento do filho. Próximo do fim, o diretor intercala cenas do prólogo e o rosto de Gainsbourg. Depois, em um close, ela corta sua vagina. Antes, tratou o sexo de forma ambígua e impôs torturas ao marido.

Nada gratuito!

Em um curto espaço de tempo, com fragmentos do prólogo, Von Trier dá a entender que ela podia ter salvado o filho, mas preferiu o sexo. Assim, a agressão ao marido seria uma maneira de culpá-lo. A automutilação seria o reconhecimento de sua culpa.

No fim, o marido mata a esposa. O julgamento que o espectador fará desse ato influirá a interpretação do epílogo. Novamente em preto e branco e com a mesma música, a persona de Dafoe desce o monte do Éden enquanto uma legião de mulheres caminha em sentido oposto. Se o leitor achar que o marido agiu com fúria, essas mulheres seriam a sua danação; se pensar que ele tentava livrar a esposa do sofrimento, a legião seria um bálsamo. Coisas para se discutir na hora do lanche!

Crítica por: Georgenor de S. Franco Neto

 

 

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Apesar das circunstâncias da produção, Anticristo se mantém de pé. Considerando um autor como Von Trier, que vem de obras como Dogville, não podemos esperar algo fácil. Se o cinéfilo quiser o doce da bandeja, deverá se levantar e buscá-lo. Se o espectador amarrar as pontas, poderá sair do cinema com uma sensação mais nauseabunda que a maioria.

O filme se concentra na depressão sofrida por uma mulher após a morte do filho e como o marido tenta ajudá-la. E, principalmente, nas consequência. A primeira sequência é um belo prólogo em câmera lenta e fotografia em preto-e-branco. Enquanto uma cena de sexo entre o casal é mostrada, o filho Nic se dirige para a janela e cai. O acontecimento provoca profunda depressão na mãe (Charlotte Gainsbourg) – em nenhum momento, homem ou mulher são nomeados.

Muito se falou da atuação de Gainsbourg; realmente consegue expor todas as dores de uma mulher que perdeu o filho. Porém, Dafoe não fica atrás. Ocorre que sua atuação não é histriônica. O ator demonstra o afastamento do marido em relação à situação com pequenos gestos e voz burocrática, sempre buscando racionalizar as reações da espora. As dúvidas provocadas pelos acontecimentos no Éden (casa de campo do casal) aprofundam a psicologia da personagem, impedindo que ele se torne um tipo.

A película, contudo, é mais que um “filme de ator”. A marca de Von Trier se faz notar na profundidade da história. Caso o leitor não queria saber o final, pare aqui, porque vamos entregar tudo.

O diretor deixa muitas pontas soltas. Nada de final redondinho. O filme permite muitas interpretações, sempre em torno do que provoca a insanidade da mulher.

A fase inicial de depressão da personagem de Gainsbourg é seguida por reações díspares. Ela acusa o marido de esquecer a familiar, depois declara amor eterno e em seguida tortura-o; há sua relação ambígua com o sexo, ora como uma ninfomaníaca ora culpando-se pelo ato.

A morte do filho seria a primeira causa. Outro agente seria a natureza. Von Trier consegue personificá-la. Ruídos, gritos, animais falantes tornam o Éden um ambiente de horror e claustrofóbico. Constantemente se escuta o barulho das sementes das árvores caindo no telhado, dando a impressão de que a casa será invadida. É quase impulsivo culpar a natureza pelo caos reinante. A própria mulher diz que a natureza é a morada de Satanás.

Todas essas interpretações são permitidas. Porém, uma terceira resposta é possível por conta das pontas deixadas pelo direito.

Primeiro, descobrimos que a mãe já maltratava o filho. Isso explicaria tanto para seus atos quanto para a ideia que faz da natureza em torno do Éden. A morte do filho seria apenas a gota final.

Outro elemento é a culpa pelo falecimento do filho. Próximo do fim, o diretor intercala cenas do prólogo e o rosto de Gainsbourg. Depois, em um close, ela corta sua vagina. Antes, tratou o sexo de forma ambígua e impôs torturas ao marido.

Nada gratuito!

Em um curto espaço de tempo, com fragmentos do prólogo, Von Trier dá a entender que ela podia ter salvado o filho, mas preferiu o sexo. Assim, a agressão ao marido seria uma maneira de culpá-lo. A automutilação seria o reconhecimento de sua culpa.

No fim, o marido mata a esposa. O julgamento que o espectador fará desse ato influirá a interpretação do epílogo. Novamente em preto e branco e com a mesma música, a persona de Dafoe desce o monte do Éden enquanto uma legião de mulheres caminha em sentido oposto. Se o leitor achar que o marido agiu com fúria, essas mulheres seriam a sua danação; se pensar que ele tentava livrar a esposa do sofrimento, a legião seria um bálsamo. Coisas para se discutir na hora do lanche!

Crítica por: Georgenor de S. Franco Neto

 

 

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