sábado, abril 27, 2024

Artigo | ‘Great News’ é uma incrível comédia que você provavelmente não conhece

Tina Fey e Robert Carlock parecem ser o time dos sonhos: o duo é responsável por algumas das melhores comédias da televisão contemporânea e já faturou inúmeros prêmios por seus incríveis trabalhos seriados. Fey, por um lado, é responsável pela releitura às telonas de Meninas Malvadas’, um dos mais memoráveis filmes teen do século, enquanto a colaboração com seu conterrâneo se iniciou em 30 Rock’, alcançando um ápice com a aclamada Unbreakable Kimmy Schmidt’ e agora mergulhando em uma investida inusitada – o que já é de praxe. E o resultado pode não ser o melhor de suas carreiras, mas definitivamente não deixa a desejar em nenhum momento, ainda mais pela irreverência narrativa.

Em Great News’, série que tinha tudo para cair no esquecimento e foi recuperada pelo poder incomparável de disseminação da Netflix, a trama principal gira em torno de uma família disfuncional formada pela exagerada e melancólica Katie (Briga Heelan) e sua mãe, Carol (Andrea Martin). Após uma sessão epifânica numa igreja, Katie percebe que deve seguir seus sonhos e lutar para ganhar reconhecimento na emissora de televisão MMC, localizada em Nova Jersey. Entretanto, ela não é a única a encarnar tal revelação, e a própria mãe resolve voltar para a faculdade de jornalismo e contar à sua filha que, para conseguir crédito extra, precisa de um estágio – e é justamente por isso que resolveu tentar a vaga no mesmo lugar em que trabalha!

Já no início do episódio piloto, o modo como a história se desenrola segue padrões inesperados e consegue fugir dos convencionalismos do gênero. A dramédia à qual somos apresentados parece focar apenas em Katie, uma mulher de trinta anos que tenta se desvencilhar das ações superprotetoras de sua família ao mesmo tempo em que não consegue negar seu amor por ela. Entretanto, Carol, quebrando também as fórmulas para seu tipo de personagem, insurge como outro foco principal que ajuda a criar as mais divertidas e impossíveis subtramas. E é a partir disso que Fey e Carlock, atuando como produtores executivos, criam uma mágica rítmica às telinhas que transforma a obra criada por Tracy Wigfield numa divertida jornada do começo ao fim – e detalhe: Wigfield já vem com uma carga cômica considerável, visto que auxiliou a dupla em séries predecessoras.

É claro que, considerando o time artístico por trás da iteração, as coisas nunca seriam tão simples quanto aparentam: eventualmente, Great News’ funciona como uma crítica às corporações jornalísticas e faz inúmeras referências para obras audiovisuais dramáticas e de cunho político. Aqui, esse pano de fundo ganha um revestimento ácido que não se preocupa em rechear com ironias alguns diálogos propositalmente fúteis ao mesmo tempo que desmente estereótipos de gênero – a personagem de Portia (Nicole Richie), por exemplo, é a típica bombshell loira que vem com as ideias mais idiotas devido a uma modelagem de seus chefes, mas que na verdade tem uma profundidade deliciosamente envolvente. John Michael Higgins, dando vida ao âncora Chuck Pierce ao lado de Portia, mostra-se forte e independente durante a primeira metade da temporada, até sofrer uma bruta desconstrução que não o torna superior a ninguém.

Todos ali trabalharam para o funcionamento do programa The Breakdown (uma referência nem um pouco sutil ao momento em que explodimos e queremos desistir de tudo): a dupla supracitada não consegue se entender e vive entrando em conflitos de ego hilários, arquitetando as mais absurdas mentiras para se mostrarem melhores que os outros, enquanto a equipe do backstage também passa por seus próprio problemas. Katie tenta ganhar reconhecimento em meio à polidez excessiva de seu chefe, Greg (Adam Campbell), o qual também lida com o fato – que nos é revelado apenas nos episódios finais – de ser neto da magnata da comunicação que controla todo o canal e mostra ser uma das figuras mais perversas da série (além de ser interpretada pela aplaudível Christina Pickles).

E é claro que, em se tratando de uma comédia, não apenas o roteiro mostra-se quase impecável – com alguns erros estruturais clássicos, mas nada que não seja ofuscado pelo brilho de seu elenco -, como também a construção cênica. As técnicas fílmicas mergulham em uma convergência de inúmeras outras investidas, incluindo a estética excessivamente documental de Veep’, misturado ao hibridismo de The Office’ e até mesmo algumas inclinações mais escondidas a The Newsroom’. As referências aos clássicos cinematográficos, ao contrário do que podemos imaginar, aparecem da forma mais distorcida e explícita possível – e diferente de outras iterações que não sabem como tratar uma mímesis desse tipo, ela funciona em grande parte da história e serve como respaldo de complexidade para a ambiência criada e para os personagens.

Não deixe de assistir:

Não podemos deixar de citar a incrível química de praticamente todo o elenco: Martin retorna com uma força inenarrável após sua temporada de sucesso na Broadway com Pippin’, entregando-se de corpo e alma a uma das personagens mais deliciosas dos últimos anos. As relações que mantém com as outras personas se inserem numa montanha-russa de sentimentos que em nenhum momento são forçadas; o público aceita de bom grado o que lhe é apresentado. Mas é ao lado de Heelan que a mágica ganha uma estrutura mais solidificada – nós não apenas compramos a ideia de serem da mãe e filha, como também melhores amigas, confidentes e colegas de trabalho que definitivamente têm muito a trazer para a vida uma da outra.

‘Great News’ é uma surpresa interessante e que poderia ter sua finalização em apenas essa breve narrativa de autoconhecimento e aceitação composta por dez episódios – mas, felizmente, a produção ganhou uma segunda e breve temporada que também merece ser apreciada em todos os seus aspectos.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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