terça-feira, abril 30, 2024

Artigo | Se você nunca assistiu a ‘O Príncipe Dragão’, não sabe o que está perdendo

‘O Príncipe Dragão’, pelo próprio título, já emula inúmeras obras de fantasia das últimas décadas e séculos – e confesso que, antes de começar a assistir, pensei que a trama giraria em torno de um príncipe transformado na lendária criatura. Entretanto, Aaron Ehasz resolveu levar a série à conotação literal, iniciando o episódio piloto com um prólogo muito interessante: de acordo com a mitologia que criou, o mundo vivia em harmonia até que um humano corrompido pela ambição deu origem à Magia das Trevas levou as raças mágicas a banirem os homens para uma terra longínqua, separada por um rio escaldante de lava guardado por um temível dragão. Entretanto, o frágil acordo de paz acabou quando seu herdeiro, ainda dentro do ovo, foi aparentemente assassinado, marcando o início de uma guerra que ainda alcançaria proporções drásticas.

Logo nos primeiros minutos, é possível mergulhar num cosmos totalmente nostálgico e envolvente, o qual primeiro nos mostra as cartas do jogo, apresentando os cenários, os futuros embates e as questões políticas e sociais que envolvem cada um dos grupos. De um lado, temos os humanos, cujas províncias são lideradas pelo rei Harrow de Katolis (Luc Roderique), ciente da batalha que se aproxima e aconselhado pelo misterioso Viren (Jason Simpson), um mago que esconde muito mais do que aparenta. De outro, temos o avanço élfico comandado por Runaan (Jonathan Holmes), chefe do clã assassino que pretende vingar a morte do príncipe herdeiro. O roteiro e a direção combinam-se em essa fragmentação dupla que arquiteta uma atmosfera densa, complexa e, por vezes, aterrorizante por inúmeros motivos. É claro que, sendo esta a primeira temporada, os levantes catárticos ainda se contêm para melhor explicar ao público o que está acontecendo.

Seguindo uma lógica compreensível e que nem ao menos ousa tangenciar acontecimentos ocasionais, os dois mundos se cruzam nas figuras dos filhos do rei, Callum (Jack de Sena) e Ezran (Sasha Rojen), e na da jovem aprendiz elfa Rayla (Paula Burrows num sotaque escocês delicioso e inebriante). Ainda que o encontro não seja um dos melhores, seus objetivos em comum de cessar os conflitos e retornar o ovo (escondido em segredo durante todo esse tempo nas masmorras do castelo) dão força para o fortalecimento de laços de confiança e de uma amizade imprevisível. Basicamente, o time criativo vale-se muito do confronto de personalidades para fornecer ritmo e orquestrar cada um dos atos com a maestria necessária para nos satisfazer.

A ambiência nostálgica não é mera coincidência: Ehasz é responsável por uma das séries mais aclamadas das décadas passadas – Avatar: A Lenda de Aang’ -, e é óbvio que usaria de vários elementos miméticos para compor sua mais nova aventura. Desde o prólogo até a concepção imagética mantêm paralelismos estruturais – por exemplo, a separação das raças e as vestimentas entre os clãs dos elementos em Avatar’ e em O Príncipe Dragão’ são praticamente as mesmas. Entretanto, aqui o showrunner vale-se de uma fórmula clássica e contínua em detrimento de acontecimentos episódicos, o que se afasta do revestimento antológico para uma progressão seriada. Não estou falando que uma opção é melhor que outra, mas sim que ambas funcionam em suas respectivas obras, ainda mais levando em conta que o intuito de cada uma é relativamente diferente.

A primeira temporada é bem mais dinâmica e profunda do que lhe damos crédito: o trio protagonista lida com inseguranças próprias, ilusões acerca de sua própria história, mentiras, descréditos e ilusões que podem ser tanto positivas quanto negativas para o fomento dos arcos. Tudo isso, ainda que peque um pouco em diálogos excessiva e desnecessariamente cômicos, é respaldado por sequências bem coreografadas de luta e de magia, contribuindo para a manutenção da atmosfera fantástica. Além disso, é notável o amadurecimento dos personagens principais à medida que se aproximam de seu destino – e como o mais otimista dos sentimentos não é páreo para o que está por vir. Tal premissa inclusive serve de cliffhanger para uma quase confirmada continuação que tem tudo para ser tão boa quanto ou melhor que a primeira iteração.

As técnicas de animação estranham à prima vista, visto que se aproximam muito de uma linguagem 2D dos videogames clássicos. Entretanto, é compreensível sua utilização para nos manter vidrados em um cosmos com traços de RPG e que permitem a conexão entre público e série. A fluidez, por muitas vezes, dá lugar a uma truncada delineação que, por mais bizarra que pareça, aumenta o clima nostálgico de modo inenarrável.

Não deixe de assistir:

‘O Príncipe Dragão’ pode não ser perfeito, mas é certamente um produto audiovisual com gigantesco potencial. Ainda que satisfatório, penso duas vezes antes de falar que já vimos tudo o que a nova série tem a oferecer: a jornada de Rayla, Callum e Ezran é recheada de perigos e de uma sensação nostálgica que aposta com força no saudosismo e na originalidade.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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