domingo , 22 dezembro , 2024

Boneco de Neve | Relembre o péssimo suspense com Michael Fassbender que se vem fazendo SUCESSO nos streamings

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Histórias de mistério talvez sejam aquelas cujo poder de persuasão e de envolvimento são imprescindíveis para serem consideradas boas. Desde o surgimento e a ascensão da indústria cinematográfica como império mundial, tais vertentes narrativas sempre foram muito bem exploradas, ao lado da ficção fantástica, para serem traduzidas em produtos audiovisuais que sempre almejavam à satisfação do público. É claro que, volta e meia, os filmes e séries desse gênero acabam por optar pelas saídas clássicas e consideradas clichês, sem ao menos se preocupar em fornecer uma perspectiva mais original ou uma mudança no desfecho do último ato – e é exatamente isso o que acontece com Boneco de Neve.

Primeiro, devemos nos lembrar de que Jo Nesbø, romancista responsável pela obra em questão, é um dos autores noruegueses mais famosos de sua geração. Seus livros, que já venderam mais de 130 milhões de cópias, não ganham respeito pela crítica e pelo público por valerem-se de escopos mal pensados ou mal arquitetados, mas sim pela complexidade da atmosfera que consegue criar – uma mistura convincente de thriller, ação e até mesmo algumas sacadas de humor negro; isso sem mencionar os incríveis personagens que atuam dentro de um microcosmos ao mesmo tempo verossímil e sobrenatural, perscrutados por perigos mortais que os levam a testar os próprios limites e encontrar meios de sobreviver.



Tomas Alfredson é um nome interessante no circuito fílmico contemporâneo. O cineasta já mostrou suas habilidades no terror Deixe Ela Entrar’ e no thriller de espionagem O Espião que Sabia Demais’. Ambas as narrativas, muito diferentes entre si, mas que carregavam suas inclinações para uma nova reformulação do cinema moderno em suas próprias identidades, parecem ter sido esquecidas por Alfredson nessa nova investida: Boneco de Neve já começa de uma forma insípida – um prólogo desnecessário e picotado que não segue uma linha de raciocínio lógica e opta pela criação forçosa de elementos catárticos, os quais não funcionam nem um pouco bem.

A falta de condução e o desprezo por uma decupagem envolvente e que nos aproxime mais da realidade do filme é contínua e não parece mudar até os momentos finais. A concepção imagética é completamente posta de lado, e nem mesmo o roteiro assinado por Peter Straughan consegue salvar esse fiasco, desenrolando-se a partir de uma construção que preza pela trama principal em detrimento dos protagonistas e das subnarrativas – as quais, dentro de um cosmos de suspense e mistério, são essenciais para o endossamento de conexões com o público e entre os personagens. Nem mesmo o detetive Harry Hole (Michael Fassbender) nos consegue manter presos o suficiente dentro do mistério principal, e olha que, no universo narrativo, sua psique e personalidade são extremamente humanas e perscrutadas por erros e arrependimentos.

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Não é possível nem mesmo discorrer sobre a real trama do filme, porque ela basicamente não existe. Em essência, Hole deveria desenterrar casos antigos sobre mulheres desaparecidas e traçar um paralelo entre os eventos do passado com os recentes acontecimentos. Entretanto, quem assegura que o corpo de investigadores da cidade de Oslo não abandone esses casos há muito arquivados é a inspetora Katrine Bratt (Rebecca Ferguson), cuja linearidade em cena é, por falta de outra palavra, insuportável. Ao invés de seguir um resquício dos inúmeros e icônicos coadjuvantes das histórias de mistério – como Dr. Watson ou Robin Venetia -, ela mais se aproxima de Dakota Johnson na franquia Cinquenta Tons de Cinza’ que de alguém que realmente utiliza de suas habilidades para resolver os crimes.

De forma geral, cada um dos protagonistas mantém-se ao estereótipo do que representa na gama do gênero em questão. Nem mesmo Hole consegue afastar-se de seus problemas para enxergar com clareza ou para ligar os pontos deixados por um antagonista tão insosso quanto sua própria motivação. A fórmula mocinho-vilão mais uma vez é posta em xeque, mas nem ao mesmo deixa-se mascarar por um brilho momentâneo, preferindo se levar a sério e tornar-se um emaranhado de presunções que, eventualmente, não funcionam. Todas as revelações e os chamados “clímaxes” – que em momento algum trazem transformações irreversíveis para os personagens principais – são pautados em deus ex machina, uma resposta divina que magicamente aparece aos pés de alguém em desespero.

É claro que o conturbado passado de nosso protagonista seria desenterrado. Mas essa subtrama que revolve Hole não tem nem um pingo de seu real potencial explorado, primeiro pelo fato de todo o universo não ser convidativo ou envolvente em nenhum aspecto; segundo, porque simplesmente não há química. Mesmo que dentro de suas próprias superficialidades, os personagens funcionam bem (encerrados em si mesmos). Quando dependentes das ações dos outros, o confronto de personalidades extremistas e escrachadas não é harmônico e não se completa, deixando falhas imperdoáveis para o funcionamento da obra. Nem mesmo a versatilidade de Charlotte Gainsbourg como a ex-namorada do detetive, Rakel, consegue nos puxar de um abismo interminável de deslizes – e não culpo sua atuação, mas sim os diálogos autoexplicativos e grotescos.

O ápice desse épico desnecessário é, sem sombra de dúvida, Mathias. Interpretado por Jonas Karlsson, o antagonista da história tem uma motivação inescrupulosa e que se prova cômica com o passar dos atos, mesmo que tenha bases em um tema interessante – a negligência paternal e a polêmica do aborto. Entretanto, ele não é carismático, não tem um bom desenvolvimento, e seu desfecho não conversa com o arco da tragédia nem com o de redenção, visto que ele simplesmente encontra um fim muito mal arquitetado e que parece ter entrado como único modo de impedi-lo de continuar seus homicídios. E como se não bastasse, as pérolas do filme também contam com aparições de J.K. Simmons e Val Kilmer no que podemos chamar de um dos piores momentos de suas carreiras, dando vida a personalidade tão insossas quanto inúteis na trama.

Boneco de Neve é um filme forçado. Um produto melancólico e bruto que não faz jus à obra da qual deriva, mas que faz o público ficar com um pé atrás para conhecer o universo criado por Nesbo. Alfredson não apenas desencanta a todos com uma investida fracassada dentro do gênero de mistério, como também deixa à vista uma decadência iminente das adaptações literário-cinematográficas contemporâneas.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Primeiro, devemos nos lembrar de que Jo Nesbø, romancista responsável pela obra em questão, é um dos autores noruegueses mais famosos de sua geração. Seus livros, que já venderam mais de 130 milhões de cópias, não ganham respeito pela crítica e pelo público por valerem-se de escopos mal pensados ou mal arquitetados, mas sim pela complexidade da atmosfera que consegue criar – uma mistura convincente de thriller, ação e até mesmo algumas sacadas de humor negro; isso sem mencionar os incríveis personagens que atuam dentro de um microcosmos ao mesmo tempo verossímil e sobrenatural, perscrutados por perigos mortais que os levam a testar os próprios limites e encontrar meios de sobreviver.

Tomas Alfredson é um nome interessante no circuito fílmico contemporâneo. O cineasta já mostrou suas habilidades no terror Deixe Ela Entrar’ e no thriller de espionagem O Espião que Sabia Demais’. Ambas as narrativas, muito diferentes entre si, mas que carregavam suas inclinações para uma nova reformulação do cinema moderno em suas próprias identidades, parecem ter sido esquecidas por Alfredson nessa nova investida: Boneco de Neve já começa de uma forma insípida – um prólogo desnecessário e picotado que não segue uma linha de raciocínio lógica e opta pela criação forçosa de elementos catárticos, os quais não funcionam nem um pouco bem.

A falta de condução e o desprezo por uma decupagem envolvente e que nos aproxime mais da realidade do filme é contínua e não parece mudar até os momentos finais. A concepção imagética é completamente posta de lado, e nem mesmo o roteiro assinado por Peter Straughan consegue salvar esse fiasco, desenrolando-se a partir de uma construção que preza pela trama principal em detrimento dos protagonistas e das subnarrativas – as quais, dentro de um cosmos de suspense e mistério, são essenciais para o endossamento de conexões com o público e entre os personagens. Nem mesmo o detetive Harry Hole (Michael Fassbender) nos consegue manter presos o suficiente dentro do mistério principal, e olha que, no universo narrativo, sua psique e personalidade são extremamente humanas e perscrutadas por erros e arrependimentos.

Não é possível nem mesmo discorrer sobre a real trama do filme, porque ela basicamente não existe. Em essência, Hole deveria desenterrar casos antigos sobre mulheres desaparecidas e traçar um paralelo entre os eventos do passado com os recentes acontecimentos. Entretanto, quem assegura que o corpo de investigadores da cidade de Oslo não abandone esses casos há muito arquivados é a inspetora Katrine Bratt (Rebecca Ferguson), cuja linearidade em cena é, por falta de outra palavra, insuportável. Ao invés de seguir um resquício dos inúmeros e icônicos coadjuvantes das histórias de mistério – como Dr. Watson ou Robin Venetia -, ela mais se aproxima de Dakota Johnson na franquia Cinquenta Tons de Cinza’ que de alguém que realmente utiliza de suas habilidades para resolver os crimes.

De forma geral, cada um dos protagonistas mantém-se ao estereótipo do que representa na gama do gênero em questão. Nem mesmo Hole consegue afastar-se de seus problemas para enxergar com clareza ou para ligar os pontos deixados por um antagonista tão insosso quanto sua própria motivação. A fórmula mocinho-vilão mais uma vez é posta em xeque, mas nem ao mesmo deixa-se mascarar por um brilho momentâneo, preferindo se levar a sério e tornar-se um emaranhado de presunções que, eventualmente, não funcionam. Todas as revelações e os chamados “clímaxes” – que em momento algum trazem transformações irreversíveis para os personagens principais – são pautados em deus ex machina, uma resposta divina que magicamente aparece aos pés de alguém em desespero.

É claro que o conturbado passado de nosso protagonista seria desenterrado. Mas essa subtrama que revolve Hole não tem nem um pingo de seu real potencial explorado, primeiro pelo fato de todo o universo não ser convidativo ou envolvente em nenhum aspecto; segundo, porque simplesmente não há química. Mesmo que dentro de suas próprias superficialidades, os personagens funcionam bem (encerrados em si mesmos). Quando dependentes das ações dos outros, o confronto de personalidades extremistas e escrachadas não é harmônico e não se completa, deixando falhas imperdoáveis para o funcionamento da obra. Nem mesmo a versatilidade de Charlotte Gainsbourg como a ex-namorada do detetive, Rakel, consegue nos puxar de um abismo interminável de deslizes – e não culpo sua atuação, mas sim os diálogos autoexplicativos e grotescos.

O ápice desse épico desnecessário é, sem sombra de dúvida, Mathias. Interpretado por Jonas Karlsson, o antagonista da história tem uma motivação inescrupulosa e que se prova cômica com o passar dos atos, mesmo que tenha bases em um tema interessante – a negligência paternal e a polêmica do aborto. Entretanto, ele não é carismático, não tem um bom desenvolvimento, e seu desfecho não conversa com o arco da tragédia nem com o de redenção, visto que ele simplesmente encontra um fim muito mal arquitetado e que parece ter entrado como único modo de impedi-lo de continuar seus homicídios. E como se não bastasse, as pérolas do filme também contam com aparições de J.K. Simmons e Val Kilmer no que podemos chamar de um dos piores momentos de suas carreiras, dando vida a personalidade tão insossas quanto inúteis na trama.

Boneco de Neve é um filme forçado. Um produto melancólico e bruto que não faz jus à obra da qual deriva, mas que faz o público ficar com um pé atrás para conhecer o universo criado por Nesbo. Alfredson não apenas desencanta a todos com uma investida fracassada dentro do gênero de mistério, como também deixa à vista uma decadência iminente das adaptações literário-cinematográficas contemporâneas.

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Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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