terça-feira , 3 dezembro , 2024

Crítica 2 | Força Maior

SUECO EXPÕE AS CONSEQUÊNCIAS DA QUEBRA DE EXPECTATIVAS

 

Até que aconteça, jamais temos certeza de como agiremos. Achamos de que diante de algo, faremos assado e não cozido. Só que não… Em Força Maior (Force Majeure), Tomas (Johannes Kuhnke) está com sua família de férias em uma estação de esqui na França. Durante o café, uma avalanche vem em direção ao restaurante. Na confusão, Tomas foge, deixando mulher e filhos para trás. Tudo alarme falso! Antes da neve baixar, ele volta e senta como se nada tivesse acontecido.



Com a narrativa dividida em 5 partes, uma para cada dias da viagem, o diretor e roteirista sueco Ruben Östlund faz uma construção elegante para expor os efeitos da quebra de uma expectativa.  Na primeira, tudo são flores. Östlund mostra a relação afetuosa entre Tomas e Ebba (Lisa Loven Kongsli) e seus filhos Harry (Vincent Wettergren) e Vera (Clara Wettergren). A avalanche ocorre no segundo dia. Ebba grita pelo marido enquanto protege os filhos. Depois do susto, todos passam o dia em silêncio, como se um elefante tivesse sido posto na mala de viagem.

forcamaior-1

Nessas duas primeiras partes, há uma rima visual que a sintetiza: no primeiro dia, a família está em uma esteira conversando amenidades, com o ruído da esteira ao fundo. No segundo dia, na mesma esteira, todos estão em silêncio. O ruído da esteira fica em primeiro plano, deixando clara a tensão presente. A terceira parte do filme é focada mais em Ebba, já na quarta, o destaque fica mais em Tomas. A quinta é reservada à conclusão.

Força Maior equilibra drama e humor negro, instantes de ternura com outros de lavação de roupa suja – em público de preferência. Tomas nega que tenha fugido. Entre a compreensão e a raiva, Ebba ora tenta entender o marido, ora joga na cara dele o que fez.  Ebba não esperava a fuga de Tomas. Tomas não esperava sua reação e nega – ou talvez creia que realmente tenha ficado na mesa. Ela tenta, mas não consegue aceitar a frouxidão dele.

forcamaior-3

Em uma leitura mais rasa, o filme fala apenas sobre a desconstrução dos papais sociais.  Mas, ficar dizendo que Tomas é um homem que não atende aos padrões machistas de um macho bem machão é pobre, não alcança as nuances do filme. Ebba não suporta perceber que Tomas não atende às suas expectativas; para Tomas também é insuportável, talvez até mais, pois nunca sabemos se ele realmente acredita em suas desculpas.

A fuga de Tomas quebrou toda a imagem que Ebba tinha. Socialmente, é difícil suportar ser vista junto a um homem covarde. Mas, como falei, não é apenas papeis sociais que estão em jogo – até porque, Ebba faz questão de expor seu ressentimento para o primeiro casal que topa um jantar com eles. Suas expectativas de esposa, mãe e mulher é que foram afetadas.

As regras tácitas de um casamento foram rompidas. Ebba esperava que seu marido a protegesse e, como pai, aos filhos. Saber que não pode contar com aquele que se escolheu para dividir a vida e ter seus descendentes é um misto de traição, covardia e solidão. Ebba fica atônita, impotente, sem conseguir compreender. Harry e Vera também sentem o impacto, expressando seus medos de forma difusa, com um misto de raiva e medo.

Tomas também não suporta seu ato. Sua autoimagem não foi compatível com a realidade. Tomas não estava preparado para isso. O instinto (por isso mesmo chamado de instinto) paterno é uma realidade biológica e moral. Seu ato covarde lhe expôs um lado com o qual não consegue lidar. De que serve ser um pai se não age como pai?

forcamaior-2

O filme tem um humor negro muito curioso, que realça a confusão interna por qual passa os membros da família, todos com dificuldade de decifrar seus sentimentos e seus eus. Passagens como as explosões públicas de Ebba, o choro de Tomas ou as cenas com o clássico as Quatro Estações, de Vivaldi, provocam um humor de vergonha alheia que revela o grotesco e contraditório da situação.

Certa vez, um amigo disse que a mulher aceita tudo em um homem, menos o fracasso. Eu concordei, mas logo arrematei: a mulher até suporta o fracasso de seu companheiro, o que não perdoa nele é a aceitação do fracasso. Saber que Tomas é covarde é difícil, mas vá lá; Ebba só não suportaria descobrir um marido conformado com a derrota. A resignação, ah, isto elas não perdoam.

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Até que aconteça, jamais temos certeza de como agiremos. Achamos de que diante de algo, faremos assado e não cozido. Só que não… Em Força Maior (Force Majeure), Tomas (Johannes Kuhnke) está com sua família de férias em uma estação de esqui na França. Durante o café, uma avalanche vem em direção ao restaurante. Na confusão, Tomas foge, deixando mulher e filhos para trás. Tudo alarme falso! Antes da neve baixar, ele volta e senta como se nada tivesse acontecido.

Com a narrativa dividida em 5 partes, uma para cada dias da viagem, o diretor e roteirista sueco Ruben Östlund faz uma construção elegante para expor os efeitos da quebra de uma expectativa.  Na primeira, tudo são flores. Östlund mostra a relação afetuosa entre Tomas e Ebba (Lisa Loven Kongsli) e seus filhos Harry (Vincent Wettergren) e Vera (Clara Wettergren). A avalanche ocorre no segundo dia. Ebba grita pelo marido enquanto protege os filhos. Depois do susto, todos passam o dia em silêncio, como se um elefante tivesse sido posto na mala de viagem.

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Nessas duas primeiras partes, há uma rima visual que a sintetiza: no primeiro dia, a família está em uma esteira conversando amenidades, com o ruído da esteira ao fundo. No segundo dia, na mesma esteira, todos estão em silêncio. O ruído da esteira fica em primeiro plano, deixando clara a tensão presente. A terceira parte do filme é focada mais em Ebba, já na quarta, o destaque fica mais em Tomas. A quinta é reservada à conclusão.

Força Maior equilibra drama e humor negro, instantes de ternura com outros de lavação de roupa suja – em público de preferência. Tomas nega que tenha fugido. Entre a compreensão e a raiva, Ebba ora tenta entender o marido, ora joga na cara dele o que fez.  Ebba não esperava a fuga de Tomas. Tomas não esperava sua reação e nega – ou talvez creia que realmente tenha ficado na mesa. Ela tenta, mas não consegue aceitar a frouxidão dele.

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Em uma leitura mais rasa, o filme fala apenas sobre a desconstrução dos papais sociais.  Mas, ficar dizendo que Tomas é um homem que não atende aos padrões machistas de um macho bem machão é pobre, não alcança as nuances do filme. Ebba não suporta perceber que Tomas não atende às suas expectativas; para Tomas também é insuportável, talvez até mais, pois nunca sabemos se ele realmente acredita em suas desculpas.

A fuga de Tomas quebrou toda a imagem que Ebba tinha. Socialmente, é difícil suportar ser vista junto a um homem covarde. Mas, como falei, não é apenas papeis sociais que estão em jogo – até porque, Ebba faz questão de expor seu ressentimento para o primeiro casal que topa um jantar com eles. Suas expectativas de esposa, mãe e mulher é que foram afetadas.

As regras tácitas de um casamento foram rompidas. Ebba esperava que seu marido a protegesse e, como pai, aos filhos. Saber que não pode contar com aquele que se escolheu para dividir a vida e ter seus descendentes é um misto de traição, covardia e solidão. Ebba fica atônita, impotente, sem conseguir compreender. Harry e Vera também sentem o impacto, expressando seus medos de forma difusa, com um misto de raiva e medo.

Tomas também não suporta seu ato. Sua autoimagem não foi compatível com a realidade. Tomas não estava preparado para isso. O instinto (por isso mesmo chamado de instinto) paterno é uma realidade biológica e moral. Seu ato covarde lhe expôs um lado com o qual não consegue lidar. De que serve ser um pai se não age como pai?

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O filme tem um humor negro muito curioso, que realça a confusão interna por qual passa os membros da família, todos com dificuldade de decifrar seus sentimentos e seus eus. Passagens como as explosões públicas de Ebba, o choro de Tomas ou as cenas com o clássico as Quatro Estações, de Vivaldi, provocam um humor de vergonha alheia que revela o grotesco e contraditório da situação.

Certa vez, um amigo disse que a mulher aceita tudo em um homem, menos o fracasso. Eu concordei, mas logo arrematei: a mulher até suporta o fracasso de seu companheiro, o que não perdoa nele é a aceitação do fracasso. Saber que Tomas é covarde é difícil, mas vá lá; Ebba só não suportaria descobrir um marido conformado com a derrota. A resignação, ah, isto elas não perdoam.

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