quinta-feira, março 28, 2024

Crítica | A Balada de Buster Scruggs – Relatos Selvagens do Velho Oeste

Com seis contos peregrinos ambientados na temática faroeste, Joel e Ethan Coen dirigem, escrevem e produzem uma das maiores pérolas cinematográficas de 2018. Além do encantamento realizado pela entusiástica fotografia, os personagens de A Balada de Buster Scruggs (The Ballad of Buster Scruggs) são dos mais variados estilos e completamente arrebatadores ao seu proveito.

Com o eixo narrativo baseado nas histórias de um livro, cujo a câmera descortina as páginas e faz a tipografia do papel saltar em radiantes imagens, A Balada de Buster Scruggs inicia-se exatamente com o personagem-título (Tim Blake Nelson), um cavaleiro tagarela que quebra a quarta parede para aproximar o público de sua ousadia. Em 15 minutos de vídeo, o atirador conquista nossa atenção e nos cativa com seus números musicais, sendo o mais contagiante “Surly Joe”.

Mal a sua história dar-se por findada, embarcamos na aventura do ladrão de banco na pele de James Franco (Artista do Desastre) em Near Algodones. Nesta sequência, os irmão Coen misturam o policial e o burlesco de maneira inspiradíssima, relembrando os clássicos de John Ford (1894-1973). A assinatura dos diretores estão alojadas em todos os recantantos da saga, com vestígios de Fargo: Uma comédia de Erros (1996) e Bravura Indômita (2010).

Com o adeus de James Franco, já pegamos carona na charrete de Liam Neeson (As Viúvas). A partir de um tom mais sombrio, o conto Meal Ticket deixa uma impressão amarga e uma flechada no coração. Se esse era o objetivo dos produtores, acertaram em cheio ao baixar o nível da ação e apresentar a comoção, aliada a proclamações esparsas da bíblia e da literatura inglesa. A interpretação de Harry Melling, conhecido pelo papel de Dudley Dursley na saga Harry Potter, é uma das pungentes e inesquecíveis do filme.

Seguindo um caminho mais lírico, o terceiro conto é encabeçado por um velho viajante (Tom Waits) que chega a um ambiente de pura magnitude natural e começa a cavar em busca de pepitas de ouro. Quase em forma de fábula, a narrativa nos carrega à apresentação da curta perenidade dos seres-vivos, em contraposição a infinitude dos minerais. O brilhantismo dos Coen está na transformação de acontecimentos banais em ocasiões totalmente peculiares.

Na próxima página, a amplitude da natureza dá espaço a Alice Longabaugh (Zoe Kazan) e aos latidos do cachorro Presidente Pierce, o qual incute a piada de chamar-se como o político anti-abolicionista considerado um desastre no cargo entre 1853-1857. Em uma caravana, a jovem encontra-se sozinha e endividada por conta da morte do irmão (Jefferson Mays) durante a travessia entre cidades. Neste cenário de desilusão, cria-se uma radiante expectativa pelo futuro da moça. Do singelo ao aterrorizante, os Coen surpreendem o público pela quinta vez.

Para encerar seu arsenal de anedotas, o conto The Mortal Remains imprime mais elegância e uma atmosfera de suspense à la Agatha Christie. De mesma forma que começamos com músicas originais, encerra-se com cantorias que narram as elipses do roteiro. Cinco personagens discutem suas motivações de viagem dentro da carruagem até uma cidade distante. Entre embates e revelações, o desfecho deixa dúvidas pendentes e reticências pelo porvir e, assim, o livro se fecha.

A Balada de Buster Scruggs revive os filmes westerns e mantém o seu tom, apesar das diferentes situações, sem nunca perder o fôlego, a métrica ou o frescor a cada nova perspectiva, do malandro Buster à inocente Alice. Lançamento pela Netflix, este combo de estupendas histórias, tal qual o argentino Relatos Selvagens (2014), é uma ode perversa e cômica aos anti-heróis.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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