domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Animais Noturnos

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História Sem Fim

A cena de abertura revela corpos nus de mulheres em uma dança sensual. A cena é provocativa, mas não exatamente da forma que você está pensando. Esta entrelinha serve de grande paralelo para todo o restante de Animais Noturnos, novo filme exuberante de Tom Ford. O cineasta adapta o livro de Austin Wright para o cinema, assinando o roteiro, e utiliza bem seu background como estilista da Gucci para criar imagens belíssimas, dotadas de muito charme e elegância. Em tal quesito era esperado que o longa não desafinasse.

Como dito, Animais Noturnos guarda inúmeras surpresas, a maior delas para quem assistiu aos trailers de divulgação ou simplesmente leu a sinopse. Tais prévias dão erroneamente a ideia deste ser um thriller de vingança. Bem, pode ser dito que o é, mas não da forma intensa, explícita e rotineira na qual estamos acostumados a ver os suspenses serem moldados.



Na trama, a cinco vezes indicada ao Oscar Amy Adams (Retratos de Família, Dúvida, O Vencedor, O Mestre e Trapaça) interpreta uma rica socialite dona de galeria de arte. Casada com o refinado homem de negócios vivido pelo galã Armie Hammer, e morando em uma mansão, a vida perfeita da protagonista exibe apenas a fachada do que são estruturalmente as ruínas de uma fria existência.

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A vida social com os amigos – que guarda as pontas dos atores britânicos Andrea Riseborough e Michael Sheen – reserva uma das melhores cenas do filme, logo de início, entregando ótimos diálogos. “É ótimo ter uma marido gay. Não preciso me preocupar com outras mulheres, ele me ouve e é meu melhor amigo”, dispara a personagem de Riseborough ao comentar sobre o companheiro para a amiga, que não possui a mesma sorte. “Sou rica, bem sucedida e bem casada. Não tenho motivo para ser infeliz”, profere a protagonista de Adams para o personagem de Sheen, que retruca: “Aproveite o absurdo de nosso mundo. É muito menos doloroso”. Tais diálogos conformistas colidem com o fervor atual do mundo em relação ao discurso social, o que torna a obra de Ford ainda mais contundente e necessária, nem que seja simplesmente pelo desconforto.

 

Desconforto é a palavra que mais define Animais Noturnos, cujo maior êxito é justamente nos colocar na posição que menos desejaríamos estar, em repetidos momentos na projeção, nas quais nos pegamos com a fatídica questão: O que faríamos? O passado da protagonista volta com força quando esta recebe uma cópia do livro intitulado Animais Noturnos em mãos, escrito por seu ex-marido, interpretado pelo talentoso Jake Gyllenhaal. Automaticamente, a personagem de Adams sabe que a obra é sobre ela, já que, não bastasse a dedicatória em seu nome no prefácio, o título era o apelido dado para ela pelo sujeito. Coincidentemente, a protagonista revela estar pensando muito no ex-companheiro nos dias que precedem a surpresa.

Embora relate no livro uma história fictícia, o antigo companheiro explora ao máximo as semelhanças com o relacionamento real, criando uma conexão e traçando uma analogia com o tempo em que passou com a protagonista, que de prontidão percebe as influências. Cada vez mais perturbada com a selvageria e violência contida no texto, a personagem principal entende o recado com pesar, embora a culpa já a tomasse antes do presente.

Animais Noturnos definitivamente não é um filme para todos os gostos ou para todo tipo de público. Sua narrativa funciona em três linhas: uma no presente, uma no passado (através de flashbacks revelando o relacionamento dos personagens de Adams e Gyllenhaal desde seu primeiro encontro) e uma na ficção, num trecho que decorre apenas no livro e toma a maior porcentagem da projeção (o que pode afastar a maioria, com o equivocado argumento “não está acontecendo de verdade” – o que de fato em um filme está?). Talvez este desequilíbrio proposital seja realmente o calcanhar de Aquiles deste que é apenas o segundo longa-metragem de Tom Ford. Ficamos esperando mais cenas com Adams, afinal ela é a protagonista.

Seja como for, o que ganhamos é inteiramente satisfatório, ao ponto de declararmos a obra como um dos ápices de 2016 no cinema. Há muito tempo um filme sobre relacionamentos não era tão cruel, vicioso e dolorido. Há muito não víamos personagens serem destroçados de forma tão unânime ao ponto de não conseguirem seguir com suas vidas, ou ao menos não da mesma forma. Fora o subtexto implícito, Animais Noturnos ainda faz uso de performances inesquecíveis, como as de Michael Shannon (sempre ótimo) e Aaron Taylor-Johnson. Curiosamente, o roteiro não favorece os protagonistas, em especial o desempenho apenas correto de Adams (tirando a dúvida sobre qual performance da atriz em uma produção de 2016 merece atenção nos prêmios).

Cada cena gelada, cada momento tenso, cada situação dilacerante apresentada acrescenta em Animais Noturnos sua substância rica em entrelinhas, dignas de discussões demoradas e do desejo masoquista (no melhor sentido) de voltar para mais incursões em nossas psiques abaladas.

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Como dito, Animais Noturnos guarda inúmeras surpresas, a maior delas para quem assistiu aos trailers de divulgação ou simplesmente leu a sinopse. Tais prévias dão erroneamente a ideia deste ser um thriller de vingança. Bem, pode ser dito que o é, mas não da forma intensa, explícita e rotineira na qual estamos acostumados a ver os suspenses serem moldados.

Na trama, a cinco vezes indicada ao Oscar Amy Adams (Retratos de Família, Dúvida, O Vencedor, O Mestre e Trapaça) interpreta uma rica socialite dona de galeria de arte. Casada com o refinado homem de negócios vivido pelo galã Armie Hammer, e morando em uma mansão, a vida perfeita da protagonista exibe apenas a fachada do que são estruturalmente as ruínas de uma fria existência.

A vida social com os amigos – que guarda as pontas dos atores britânicos Andrea Riseborough e Michael Sheen – reserva uma das melhores cenas do filme, logo de início, entregando ótimos diálogos. “É ótimo ter uma marido gay. Não preciso me preocupar com outras mulheres, ele me ouve e é meu melhor amigo”, dispara a personagem de Riseborough ao comentar sobre o companheiro para a amiga, que não possui a mesma sorte. “Sou rica, bem sucedida e bem casada. Não tenho motivo para ser infeliz”, profere a protagonista de Adams para o personagem de Sheen, que retruca: “Aproveite o absurdo de nosso mundo. É muito menos doloroso”. Tais diálogos conformistas colidem com o fervor atual do mundo em relação ao discurso social, o que torna a obra de Ford ainda mais contundente e necessária, nem que seja simplesmente pelo desconforto.

 

Desconforto é a palavra que mais define Animais Noturnos, cujo maior êxito é justamente nos colocar na posição que menos desejaríamos estar, em repetidos momentos na projeção, nas quais nos pegamos com a fatídica questão: O que faríamos? O passado da protagonista volta com força quando esta recebe uma cópia do livro intitulado Animais Noturnos em mãos, escrito por seu ex-marido, interpretado pelo talentoso Jake Gyllenhaal. Automaticamente, a personagem de Adams sabe que a obra é sobre ela, já que, não bastasse a dedicatória em seu nome no prefácio, o título era o apelido dado para ela pelo sujeito. Coincidentemente, a protagonista revela estar pensando muito no ex-companheiro nos dias que precedem a surpresa.

Embora relate no livro uma história fictícia, o antigo companheiro explora ao máximo as semelhanças com o relacionamento real, criando uma conexão e traçando uma analogia com o tempo em que passou com a protagonista, que de prontidão percebe as influências. Cada vez mais perturbada com a selvageria e violência contida no texto, a personagem principal entende o recado com pesar, embora a culpa já a tomasse antes do presente.

Animais Noturnos definitivamente não é um filme para todos os gostos ou para todo tipo de público. Sua narrativa funciona em três linhas: uma no presente, uma no passado (através de flashbacks revelando o relacionamento dos personagens de Adams e Gyllenhaal desde seu primeiro encontro) e uma na ficção, num trecho que decorre apenas no livro e toma a maior porcentagem da projeção (o que pode afastar a maioria, com o equivocado argumento “não está acontecendo de verdade” – o que de fato em um filme está?). Talvez este desequilíbrio proposital seja realmente o calcanhar de Aquiles deste que é apenas o segundo longa-metragem de Tom Ford. Ficamos esperando mais cenas com Adams, afinal ela é a protagonista.

Seja como for, o que ganhamos é inteiramente satisfatório, ao ponto de declararmos a obra como um dos ápices de 2016 no cinema. Há muito tempo um filme sobre relacionamentos não era tão cruel, vicioso e dolorido. Há muito não víamos personagens serem destroçados de forma tão unânime ao ponto de não conseguirem seguir com suas vidas, ou ao menos não da mesma forma. Fora o subtexto implícito, Animais Noturnos ainda faz uso de performances inesquecíveis, como as de Michael Shannon (sempre ótimo) e Aaron Taylor-Johnson. Curiosamente, o roteiro não favorece os protagonistas, em especial o desempenho apenas correto de Adams (tirando a dúvida sobre qual performance da atriz em uma produção de 2016 merece atenção nos prêmios).

Cada cena gelada, cada momento tenso, cada situação dilacerante apresentada acrescenta em Animais Noturnos sua substância rica em entrelinhas, dignas de discussões demoradas e do desejo masoquista (no melhor sentido) de voltar para mais incursões em nossas psiques abaladas.

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