domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Anitta cria uma miscelânea musical com o divertido álbum ‘Versions of Me’

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Anitta possui uma das carreiras mais anômalas e, por essa razão, de maior sucesso não apenas brasileiro, mas mundial. Começando sua carreira cantando na Igreja de Santa Luzia, no Rio de Janeiro, a cantora e compositora mergulhou de cabeça no funk e promoveu uma revolução estética que se afastava do maniqueísmo de gênero, mostrando com todas as palavras e toda a sensualidade que as mulheres poderiam, assim como os homens, expressar sua sexualidade sem serem desrespeitadas e sem serem diminuídas por, é claro, parcelas conservadoras da sociedade. Não é surpresa, pois, que, desde então, tenha sofrido com comentários machistas que condenavam seu status apenas por falar abertamente sobre uma temática que, em pleno século XXI, não deveria ser tratada como tabu.

Ao longo dos anos, Anitta começou a dominar o cenário fonográfico por suas constantes reinvenções e, em 2019, lançou ‘Kisses’ (uma miscelânea de gêneros e singles que não concordavam em estilo ou em incursões musicais, apesar de demonstrarem um apreço da artista pela variedade sonora que se apossava da comunidade brasileira). Três anos depois, ela se consagraria com um merecido reconhecimento internacional que a fez quebrar inúmeros recordes e calcar um nome que seria adotado e explorado pelo mainstream da indústria norte-americana (ora, é só vermos as dezenas de entrevistas que fez a programas de talk show ou então em seus shows que alavancaram público estupendo nos Estados Unidos e em tantos outros países). E, pensando dessa maneira, não haveria melhor momento de divulgar seu quinto álbum de estúdio, Versions of Me – uma amálgama de sua trajetória até agora que reitera sua sagacidade e seu voraz apetite por fazer o que bem entender.



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O compilado de originais desenrola-se em quinze faixas e breves 45 minutos – e reúne canções que já vinham sido promovidas desde 2020, como “Me Gusta”, colaboração com a rapper vencedora do Grammy Cardi B e com o rapper porto-riquenho Myke Towers, ou então a recente “Boys Don’t Cry”, uma homenagem ao synth-pop e electro-pop dos anos 1980 que, apesar de apoiada em fórmulas, é dançante e envolvente no melhor dos sentidos. De fato, algumas escolhas para compor o disco podem parecer fragmentadas; mas o resultado emerge com surpresa pela simplicidade da produção e pela supervisão inesperada de Ryan Tedder, vocalista da banda One Republic e um dos realizadores mais prolíficos da atualidade, que tem a mão certa para criar sucessos e investir esforços em algo que beira o conceitual, sem abandonar as raízes que colocaram tanto ele quanto Anitta no centro dos holofotes.

Assista também:
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Versions of Me parte do mesmo princípio identitário de ‘Kisses’ e explode em uma vibração trilíngue que, como sabemos, se tornou parte intrínseca da personalidade da lead singer. Não é surpresa que a canção de abertura seja o tremendo sucesso “Envolver”, que dominou as paradas mundiais e atualmente reside no ranking da Hot 100 da Billboard. Aqui, notamos similaridades entre iterações predecessoras de Anitta pelo uso impactante do reggaeton, esquadrinhando uma rendição sensual e indesculpável que fala sobre um relacionamento sexual e romântico que nos convida a uma narcótica pista de dança. Tal sonoridade é marca do álbum e é reintegrada como linha coesiva em várias tracks, incluindo “Maria Elegante”, cantada com Afro B, e “Ur Baby”, com Khalid (por mais que percebamos elementos diferenciados.

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Felizmente, Anitta não se limita a fazer uma coisa só e não tem medo de se arriscar. O emblemático aspecto da produção, reformulado entre fusões interessantes de gêneros musicais diversos, é um de seus pontos altos – e é notável como a performer, elevada ao patamar de ícone ultranacional, não abandona sua história e incremente os convencionalismos do funk ao trap, por exemplo: temos a sinestesia de “Faking Love”, que acrescenta ambos os estilos ao rap de Saweetie, ainda que fique no meio do caminho pela unidimensionalidade; “Turn It Up”, um dos ápices do CD, encarna o R&B com as notas demarcadas do violão e de um pop latino apaixonante; “Girl From Rio” resgata o classicismo da bossa-nova com o conhecido sample de “Garota de Ipanema” e um latin-trap inebriante que apresenta o mundo em que Anitta nasceu e cresceu.

É certo dizer que a primeira metade da obra é a que chama nossa atenção, pela multiplicidade de construções e pelo jogo entre minimalismo e exagero que permite à voz da artista destaque maior. “Gata”, cantada ao lado de Chencho Corleone, é divertida pela própria despreocupação – algo que nos remete às hipérboles de Joey Montana, por exemplo. A ideia aqui é focar no que a conjunção de palavras e de rimas contribui para a progressão arquitetada por Tedder. Anitta também se volta para o estilo outrora imortalizado por Charli XCX e Kim Petras, por exemplo, para gestar a rítmica “I’d Rather Have Sex”, a ode pop-rock da supracitada “Boys Don’t Cry” e a irretocável faixa-titular, cujo incremento com o baixo e os sintetizadores retoma o trabalho feito por Katy Perry nos anos 2010.

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É necessário dizer que os deslizes ocorrem, mas não com força o bastante para ofuscarem o que se foi criado no álbum: dessa maneira, “Que Rabão”, que finca Anitta novamente aos estilos brasileiros, destoa das faixas conterrâneas – apesar de ter sido colocada em um lugar estratégico; “Gimme Your Number” faz uma escolha controversa em transformar a icônica “La Bamba” em uma espécie de salsa-trap que vale a pena, com honestidade, apenas pelos versos da cantora. E “Love Me, Love Me”, por sua vez, é uma maneira sólida de encerrar essa jornada, a despeito de uma falta de ousadia que termina de forma frustrante.

Versions of Me funciona como testamento de Anitta a si mesma e a seus fãs, que a ajudaram a ter o sucesso que têm hoje. Goste ou não dela, é inegável aplaudir sua inteligência identitária e suas sagazes escolhas, que servem de base para uma permanência que, com este álbum, é mais do que justificada. Ademais, é nesse brilhante contexto que sua versatilidade sonora deve ser apreciada – e sua crueza diabolicamente ácida e arrebatadora em falar o que pensa sem se preocupar com a opinião dos outros.

Nota por faixa:

1. Envolver – 4/5
2. Gata, feat. Chencho Corleone – 4/5
3. I’d Rather Have Sex – 4,5/5
4. Gimme Your Number, com Ty Dolla $ign – 3/5
5. Maria Elegante, feat. Afro B – 4/5
6. Love You – 4/5
7. Boys Don’t Cry – 4,5/5
8. Versions of Me – 5/5
9. Turn It Up – 4,5/5
10. Ur Baby, feat. Khalid – 4/5
11. Girl From Rio – 4/5
12. Faking Love, feat. Saweetie – 2,5/5
13. Que Rabão, feat. Mr. Catra, YG, Papatinho, MC Kevin o Chris – 2/5
14. Me Gusta, com Cardi B e Myke Towers – 3,5/5
15. Love, Love Me – 3,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Anitta possui uma das carreiras mais anômalas e, por essa razão, de maior sucesso não apenas brasileiro, mas mundial. Começando sua carreira cantando na Igreja de Santa Luzia, no Rio de Janeiro, a cantora e compositora mergulhou de cabeça no funk e promoveu uma revolução estética que se afastava do maniqueísmo de gênero, mostrando com todas as palavras e toda a sensualidade que as mulheres poderiam, assim como os homens, expressar sua sexualidade sem serem desrespeitadas e sem serem diminuídas por, é claro, parcelas conservadoras da sociedade. Não é surpresa, pois, que, desde então, tenha sofrido com comentários machistas que condenavam seu status apenas por falar abertamente sobre uma temática que, em pleno século XXI, não deveria ser tratada como tabu.

Ao longo dos anos, Anitta começou a dominar o cenário fonográfico por suas constantes reinvenções e, em 2019, lançou ‘Kisses’ (uma miscelânea de gêneros e singles que não concordavam em estilo ou em incursões musicais, apesar de demonstrarem um apreço da artista pela variedade sonora que se apossava da comunidade brasileira). Três anos depois, ela se consagraria com um merecido reconhecimento internacional que a fez quebrar inúmeros recordes e calcar um nome que seria adotado e explorado pelo mainstream da indústria norte-americana (ora, é só vermos as dezenas de entrevistas que fez a programas de talk show ou então em seus shows que alavancaram público estupendo nos Estados Unidos e em tantos outros países). E, pensando dessa maneira, não haveria melhor momento de divulgar seu quinto álbum de estúdio, Versions of Me – uma amálgama de sua trajetória até agora que reitera sua sagacidade e seu voraz apetite por fazer o que bem entender.

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O compilado de originais desenrola-se em quinze faixas e breves 45 minutos – e reúne canções que já vinham sido promovidas desde 2020, como “Me Gusta”, colaboração com a rapper vencedora do Grammy Cardi B e com o rapper porto-riquenho Myke Towers, ou então a recente “Boys Don’t Cry”, uma homenagem ao synth-pop e electro-pop dos anos 1980 que, apesar de apoiada em fórmulas, é dançante e envolvente no melhor dos sentidos. De fato, algumas escolhas para compor o disco podem parecer fragmentadas; mas o resultado emerge com surpresa pela simplicidade da produção e pela supervisão inesperada de Ryan Tedder, vocalista da banda One Republic e um dos realizadores mais prolíficos da atualidade, que tem a mão certa para criar sucessos e investir esforços em algo que beira o conceitual, sem abandonar as raízes que colocaram tanto ele quanto Anitta no centro dos holofotes.

Versions of Me parte do mesmo princípio identitário de ‘Kisses’ e explode em uma vibração trilíngue que, como sabemos, se tornou parte intrínseca da personalidade da lead singer. Não é surpresa que a canção de abertura seja o tremendo sucesso “Envolver”, que dominou as paradas mundiais e atualmente reside no ranking da Hot 100 da Billboard. Aqui, notamos similaridades entre iterações predecessoras de Anitta pelo uso impactante do reggaeton, esquadrinhando uma rendição sensual e indesculpável que fala sobre um relacionamento sexual e romântico que nos convida a uma narcótica pista de dança. Tal sonoridade é marca do álbum e é reintegrada como linha coesiva em várias tracks, incluindo “Maria Elegante”, cantada com Afro B, e “Ur Baby”, com Khalid (por mais que percebamos elementos diferenciados.

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Felizmente, Anitta não se limita a fazer uma coisa só e não tem medo de se arriscar. O emblemático aspecto da produção, reformulado entre fusões interessantes de gêneros musicais diversos, é um de seus pontos altos – e é notável como a performer, elevada ao patamar de ícone ultranacional, não abandona sua história e incremente os convencionalismos do funk ao trap, por exemplo: temos a sinestesia de “Faking Love”, que acrescenta ambos os estilos ao rap de Saweetie, ainda que fique no meio do caminho pela unidimensionalidade; “Turn It Up”, um dos ápices do CD, encarna o R&B com as notas demarcadas do violão e de um pop latino apaixonante; “Girl From Rio” resgata o classicismo da bossa-nova com o conhecido sample de “Garota de Ipanema” e um latin-trap inebriante que apresenta o mundo em que Anitta nasceu e cresceu.

É certo dizer que a primeira metade da obra é a que chama nossa atenção, pela multiplicidade de construções e pelo jogo entre minimalismo e exagero que permite à voz da artista destaque maior. “Gata”, cantada ao lado de Chencho Corleone, é divertida pela própria despreocupação – algo que nos remete às hipérboles de Joey Montana, por exemplo. A ideia aqui é focar no que a conjunção de palavras e de rimas contribui para a progressão arquitetada por Tedder. Anitta também se volta para o estilo outrora imortalizado por Charli XCX e Kim Petras, por exemplo, para gestar a rítmica “I’d Rather Have Sex”, a ode pop-rock da supracitada “Boys Don’t Cry” e a irretocável faixa-titular, cujo incremento com o baixo e os sintetizadores retoma o trabalho feito por Katy Perry nos anos 2010.

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É necessário dizer que os deslizes ocorrem, mas não com força o bastante para ofuscarem o que se foi criado no álbum: dessa maneira, “Que Rabão”, que finca Anitta novamente aos estilos brasileiros, destoa das faixas conterrâneas – apesar de ter sido colocada em um lugar estratégico; “Gimme Your Number” faz uma escolha controversa em transformar a icônica “La Bamba” em uma espécie de salsa-trap que vale a pena, com honestidade, apenas pelos versos da cantora. E “Love Me, Love Me”, por sua vez, é uma maneira sólida de encerrar essa jornada, a despeito de uma falta de ousadia que termina de forma frustrante.

Versions of Me funciona como testamento de Anitta a si mesma e a seus fãs, que a ajudaram a ter o sucesso que têm hoje. Goste ou não dela, é inegável aplaudir sua inteligência identitária e suas sagazes escolhas, que servem de base para uma permanência que, com este álbum, é mais do que justificada. Ademais, é nesse brilhante contexto que sua versatilidade sonora deve ser apreciada – e sua crueza diabolicamente ácida e arrebatadora em falar o que pensa sem se preocupar com a opinião dos outros.

Nota por faixa:

1. Envolver – 4/5
2. Gata, feat. Chencho Corleone – 4/5
3. I’d Rather Have Sex – 4,5/5
4. Gimme Your Number, com Ty Dolla $ign – 3/5
5. Maria Elegante, feat. Afro B – 4/5
6. Love You – 4/5
7. Boys Don’t Cry – 4,5/5
8. Versions of Me – 5/5
9. Turn It Up – 4,5/5
10. Ur Baby, feat. Khalid – 4/5
11. Girl From Rio – 4/5
12. Faking Love, feat. Saweetie – 2,5/5
13. Que Rabão, feat. Mr. Catra, YG, Papatinho, MC Kevin o Chris – 2/5
14. Me Gusta, com Cardi B e Myke Towers – 3,5/5
15. Love, Love Me – 3,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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