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Que Ryan Murphy é incapaz de tirar qualquer tempo para respirar e dar uma pausa na carreira, já sabemos. O prolífico e exaltado realizador é dono de um número gigantesco de produções originais que incluem as famosas antologias ‘American Horror Story’ e ‘American Crime Story’, bem como o drama musical adolescente ‘Glee’ e minissérie como ‘Ratched’ e ‘Halston’. E é claro que, em plena pandemia, Murphy faria o possível para nos deixar bastante ocupados com inúmeros títulos chamativos – incluindo o ambicioso spin-off ‘American Horror Stories’.
Ambientada no universo de ‘AHS’, a série derivada prometia expandir as inúmeras histórias arrepiantes apresentadas ao longo de mais de uma década, trazendo narrativas similares e bastante diferentes das que estávamos acostumados, mas nunca abandonando a premissa bizarra e tenebrosa que Murphy e Brad Falchuk, seu parceiro de longa data, arquitetaram em um passado não muito distante. Com sete breves episódios, a produção demonstrava potencial enorme para ser divertida e envolvente de seu modo único, mas o resultado foi extremamente aquém do esperado e deu vida a uma investida pedante, previsível e sem um mínimo elemento que valesse a pena – transformando a experiência em uma exaustiva viagem sem destino e sem propósito.
Construir histórias de terror não é uma tarefa fácil – ainda mais quando consideramos que, desde os primórdios do cinema, tais enredos sempre caíram no gosto popular e foram explorados ad nauseam por realizadores das mais diversas escolas artísticas. O gênero, eventualmente, tornou-se um escape ideal que subverteu a si próprio em ramificações como o giallo, o slasher, o thriller e tantos outros – caindo em uma mediocridade repetitiva e frustrante que estenderia consequências até os dias de hoje (com exceções bastante interessantes que partem de uma premissa metafórica, crítica e psicológica). E, apesar da melhor das intenções, o mesmo acontece com ‘American Horror Stories’, desde a primeira cena de abertura do episódio piloto à desmotivada season finale.
Murphy e Falchuk já deixaram bem claro que têm um apreço significativo e afadigoso pelo cenário em que tudo começou – a infame Casa dos Assassinatos (Murder House). Além de ser referenciada em quase todas as temporadas, a perigosa e complexa construção apareceu em ‘Hotel’, ‘Apocalypse’ e, como se não bastasse, em três episódios do spin-off. Os dois primeiros funcionam como complemento um do outro, pegando ideias já utilizadas no ciclo de estreia e talhando uma inversão de papéis centrada na psicótica personalidade de Scarlett (Sierra McCormick), que se muda com os pais para o casarão em questão e encontra uma roupa de látex que a transforma na Mulher de Borracha – lançando-a em uma matança desenfreada e um envolvimento tão tóxico quanto o relacionamento de Tate e Violet com a problemática Ruby (Kaia Gerber); capítulos mais tarde, os personagens retornam às telinhas dentro de uma vazia metalinguagem que sai de nenhum lugar a lugar nenhum, como se tivesse sido pensada às pressas.
A verdade é que nem mesmo um elenco de peso consegue salvar o desânimo contagiante de um roteiro cru e sem vida. Nenhum dos episódios é digno o suficiente de entrar para o envolvente panteão que os criadores outrora nos apresentaram, emergindo como ideias descartadas e sem qualquer indício de capricho – salvo os instigantes créditos de abertura (os únicos pontos altos da temporada). Billy Lourd se entrega o máximo que pode ao papel da traumatizada Liv em “BA’AL”, cuja fraca mitologia desconstrói uma das figuras mais famosas do paganismo em prol de algo que emula pifiamente o estilo camp de ‘Creepshow’; Aaron Tveit, Tiffany Dupont e Cody Fern conseguem roubar a cena no rip-off amalgamado de ‘Pânico na Floresta’ e ‘Abismo do Medo’, apesar da conclusão ser óbvia demais para ser levada a sério; e Danny Trejo se sujeita a um Papai Noel serial killer risível em “The Naughty List”, um dos piores episódios televisivos das últimas décadas.
Fora a evidente temática que une as iterações, nem mesmo a estética se mostra coesa o suficiente para nos lembrar de que estamos assistindo a uma antologia; pelo contrário, há uma espécie de fragmentação estilística que afasta os episódios uns dos outros e cria pequenos filmes que tentam ser maiores do que conseguem e, quando ousam para uma originalidade que simplesmente não existe, tropeçam em um ridículo exagero. Nem Murphy e Falchuk querem “sujar as mãos” com a bola de neve que criaram, cedendo espaço para um inconsistente Manny Coto e para diretores que só querem terminar o que começaram, como Loni Peristere – o que engraçado, considerando o trabalho excepcional que fizeram em outras séries. A verdade é que cada parte do processo criativo falhou em um aspecto determinante, gestando um “monstro de Frankenstein” em esteroides.
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‘American Horror Stories’ é, de longe, um dos piores títulos da carreira de Murphy – e isso levando em conta o monótono drama coming-of-age ‘Comer, Rezar, Amar’. Apagada por narrativas muito mais envolventes de um universo exuberante, a série derivada desperdiçou um potencial gigantesco em uma repetição exacerbada de temas que já cansamos de ver.
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