quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica | ‘Caleidoscópio’ é uma ambiciosa série que nos fisga desde os primeiros minutos

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Cuidado: spoilers à frente.

Produções que falam sobre grandes roubos são um subgênero do estilo criminal que sempre esteve no gosto popular. Apenas neste século, podemos citar o sucesso gigantesco da franquia ‘Onze Homens e um Segredo’, o subestimado ‘O Plano Perfeito’, a divertida comédia ‘Oito Mulheres e um Segredo’ e a adorada série ‘La Casa de Papel’ como títulos que nos instigaram do começo ao fim e criaram uma competente história regada a reviravoltas, traições, sucessos e fracassos. Agora, chega a hora da Netflix nos entregar uma produção intitulada Caleidoscópio, uma série que já vem sendo trabalhada há anos e que traz um diferencial incrível para o catálogo da gigante do streaming.



A principal ambição da obra é o fato de seus oito episódios poderem ser assistidos em qualquer ordem – como os padrões que criamos ao explorar um caleidoscópio. Cada capítulo nos arremessa para um momento diferente nesta complexa narrativa (seis meses depois do roubo ou vinte e quatro anos antes), apostando fichas em personagens que têm seus próprios motivos para se envolverem com o plano em questão. E, diferente da bagunça que poderíamos esperar, o resultado é coeso, instigante e funciona quase em sua completude – em outras palavras, não importa por onde você comece a assistir à produção: por mais que não queiramos, precisamos descobrir o que aconteceu e qual foram os corolários.

O elemento de atenção primária é Leo Pap (Giancarlo Esposito), um ex-detento que se reúne com conhecidos de seu passado para cometer um dos maiores crimes da história dos Estados Unidos: roubar títulos de um fortificado banco que estão avaliados em mais de US$7 bilhões. E, como percebemos ao longo dos episódios, a ideia não é apenas ficar rico, mas se vingar de Roger Salas (Rufus Sewell), um magnata de Wall Street que lhe passou a perna décadas atrás e que ocasionou sua prisão, a morte da esposa e o afastamento total da filha, Hannah (Tati Gabrielle). Para isso, ele recruta Ava (Paz Vega), sua advogada e parceira de crime, além da química Judy (Rosaline Elbay), o engenhoso Stan (Peter Mark Kendall), o mestre dos cofres Bob (Jai Courtney) e o motorista RJ (Jordan Mendoza), delineando um plano que pode deixá-los e sem a possibilidade de serem pegos.

Quando lidamos com obras desse tipo, sempre torcemos para que o grupo de criminosos saia vitorioso de suas artimanhas – e o mesmo acontece aqui, ao menos nas iterações iniciais. Queremos entender suas motivações e o que os levou a se aventurar nessa faca de dois gumes – e, à medida que o tempo passa, tudo fica mais cabuloso e a podre personalidade dos personagens vem à tona, movidos à ambição desmedida e à total impossibilidade de enxergarem um palmo à frente do nariz.

É por esse motivo que o plano do time dá errado: eles não conseguem confiar em si mesmos e deixam que as emoções falem mais alto, em um turbilhão de raiva que os faz perder aquilo pelo que ansiavam. Leo tem uma vendeta pessoal a travar com Roger, enquanto Hannah intercepta a carga que estavam tirando do cofre para benefício próprio; Bob, por sua vez, posa como um “macho alfa” que encontra sua merecida ruína, enquanto Stan e Judy se envolvem em um relacionamento que não passa de fachada e que culmina em corações quebrados. E RJ, ao que tudo indica, é o único que consegue se safar e se vingar por ser subestimado e jogado a escanteio. E não podemos deixar de mencionar a presença da agente Abassi (Niousha Noor), que carrega um ressentimento pessoal com Leo e Ava e se encarrega de desmascará-los e levá-los à justiça (também se vendo em um beco sem saída que prenuncia sua queda).

Eric Garcia, mente por trás dessa intrincada jornada, sabe como comandar o enredo de modo a não cair na repetição; a série, apesar de não ser impecável, é sólida o bastante para começar o ano com o pé direito. Talvez o único obstáculo enfrentado pela temporada seja seu teor melancólico e niilista, declamando a plenos pulmões que, no final das contas, nada importa e todos vamos morrer. Parte do público pode sentir um frescor de originalidade com uma investida mais melodramática e pessimista, mas acredito que a outra parte se sinta desconfortável e frustrada pelo finale desconcertante. Todavia, isso não é o suficiente para apagar o brilho da história criada.

Caleidoscópio poderia dar muito errado, mas consagra-se como uma ótima entrada da Netflix e um ótimo jeito de começar 2023 – nos relembrando de que até narrativas familiares podem ganhar uma nova roupagem.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A principal ambição da obra é o fato de seus oito episódios poderem ser assistidos em qualquer ordem – como os padrões que criamos ao explorar um caleidoscópio. Cada capítulo nos arremessa para um momento diferente nesta complexa narrativa (seis meses depois do roubo ou vinte e quatro anos antes), apostando fichas em personagens que têm seus próprios motivos para se envolverem com o plano em questão. E, diferente da bagunça que poderíamos esperar, o resultado é coeso, instigante e funciona quase em sua completude – em outras palavras, não importa por onde você comece a assistir à produção: por mais que não queiramos, precisamos descobrir o que aconteceu e qual foram os corolários.

O elemento de atenção primária é Leo Pap (Giancarlo Esposito), um ex-detento que se reúne com conhecidos de seu passado para cometer um dos maiores crimes da história dos Estados Unidos: roubar títulos de um fortificado banco que estão avaliados em mais de US$7 bilhões. E, como percebemos ao longo dos episódios, a ideia não é apenas ficar rico, mas se vingar de Roger Salas (Rufus Sewell), um magnata de Wall Street que lhe passou a perna décadas atrás e que ocasionou sua prisão, a morte da esposa e o afastamento total da filha, Hannah (Tati Gabrielle). Para isso, ele recruta Ava (Paz Vega), sua advogada e parceira de crime, além da química Judy (Rosaline Elbay), o engenhoso Stan (Peter Mark Kendall), o mestre dos cofres Bob (Jai Courtney) e o motorista RJ (Jordan Mendoza), delineando um plano que pode deixá-los e sem a possibilidade de serem pegos.

Quando lidamos com obras desse tipo, sempre torcemos para que o grupo de criminosos saia vitorioso de suas artimanhas – e o mesmo acontece aqui, ao menos nas iterações iniciais. Queremos entender suas motivações e o que os levou a se aventurar nessa faca de dois gumes – e, à medida que o tempo passa, tudo fica mais cabuloso e a podre personalidade dos personagens vem à tona, movidos à ambição desmedida e à total impossibilidade de enxergarem um palmo à frente do nariz.

É por esse motivo que o plano do time dá errado: eles não conseguem confiar em si mesmos e deixam que as emoções falem mais alto, em um turbilhão de raiva que os faz perder aquilo pelo que ansiavam. Leo tem uma vendeta pessoal a travar com Roger, enquanto Hannah intercepta a carga que estavam tirando do cofre para benefício próprio; Bob, por sua vez, posa como um “macho alfa” que encontra sua merecida ruína, enquanto Stan e Judy se envolvem em um relacionamento que não passa de fachada e que culmina em corações quebrados. E RJ, ao que tudo indica, é o único que consegue se safar e se vingar por ser subestimado e jogado a escanteio. E não podemos deixar de mencionar a presença da agente Abassi (Niousha Noor), que carrega um ressentimento pessoal com Leo e Ava e se encarrega de desmascará-los e levá-los à justiça (também se vendo em um beco sem saída que prenuncia sua queda).

Eric Garcia, mente por trás dessa intrincada jornada, sabe como comandar o enredo de modo a não cair na repetição; a série, apesar de não ser impecável, é sólida o bastante para começar o ano com o pé direito. Talvez o único obstáculo enfrentado pela temporada seja seu teor melancólico e niilista, declamando a plenos pulmões que, no final das contas, nada importa e todos vamos morrer. Parte do público pode sentir um frescor de originalidade com uma investida mais melodramática e pessimista, mas acredito que a outra parte se sinta desconfortável e frustrada pelo finale desconcertante. Todavia, isso não é o suficiente para apagar o brilho da história criada.

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