quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica com Spoilers | ‘Pânico’ honra o legado de Wes Craven da maneira mais voraz possível

YouTube video

Pânico não se tornou uma das franquias mais emblemáticas do cinema por qualquer motivo – mas sim pela genial mente de Wes Craven, um dos nomes mais conhecidos do entretenimento contemporâneo. Duas décadas e meia atrás, o realizador eternizou a figura do serial killer Ghostface e de atores e atrizes memoráveis ao construir um épico slasher metalinguístico que revolucionava o modo de se contar histórias e influenciava uma geração de diretores e roteiristas nos anos seguintes. Depois de sua morte, coube a Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett revisitarem os filmes e entregarem um dos melhores capítulos da saga – que honrou a memória de Craven em um diabólico e delicioso banho de sangue.

A cena de abertura do longa, que recebeu o mesmo título do original em uma homenagem ainda mais concisa, remonta à icônica sequência com Drew Barrymore – mas, dessa vez, abrindo espaço para a primeira personagem original, Tara (Jenna Ortega). Diferente do que poderíamos esperar, Tara não é uma coadjuvante desperdiçada; pelo contrário, ela sofre brutais ataques de um Ghostface muito mais impiedoso, sobrevivendo e resguardando as forças que sobraram para catalisar o retorno de Sam (Melissa Barrera), sua irmã afastada que retorna a Woodsboro depois de saber que a irmã quase morreu pelas mãos de um assassino em série.



Melissa Barrera (“Sam”) stars in Paramount Pictures and Spyglass Media Group’s “Scream.”

A concepção mais inteligente da obra é não se aventurar no caminho sem volta de deixar os personagens clássicos roubarem os holofotes. Pelo contrário, não é até o começo do segundo ato que Sidney Prescott (Neve Campbell), Dewey Riley (David Arquette) e Gale Weathers (Courteney Cox) dão as caras. Os diretores, que se aliam ao roteiro espetacular de James Vanderbilt e Guy Busick, levam o tempo necessário para que o grupo de novas vítimas ganhe a nossa atenção e demonstre que veio para ficar. Nesse quesito, Ortega e Barrera fazem um trabalho espetacular, mas não posam como artistas egoístas que não deixam os outros brilhar – e talvez o aspecto mais interessante é o confronto geracional que emerge com essas vibrantes introduções.

É claro que, quando pensamos em Pânico, não podemos esquecer de alguns deslizes problemáticos que ocorreram nas iterações predecessoras: Pânico 3’ tentou expandir a mitologia de Ghostface ao criar um filme dentro de um filme e, mesmo com as boas intenções, falhou em cumprir com o prometido; Pânico 4’ atualizou a narrativa criada por Craven, mas descartou personas bem construídas em prol de deixar o legado vivo – livrando-se sem pensar duas vezes de Jill (Emma Roberts) e Charlie (Rory Culkin) e impedindo que qualquer continuidade fosse dada ao novo enredo. Mas não é isso que acontece na incursão de 2022: os cineastas conseguem manter a identidade da franquia, lapidar os excessos do passado e deixar claro que têm todas as intenções de voltar mais vezes.

David Arquette (“Dewey Riley”), left, and Courteney Cox (“Gale Weathers”) star in Paramount Pictures and Spyglass Media Group’s “Scream.”

O teor autorreferenciativo é constante, como é de se esperar, mas aqui ele engloba termos relativamente recentes na indústria cinematográfica, como os requels (reboot e sequência, ao mesmo tempo). De um lado, temos a extensão temática que encantou as audiências desde meados dos anos 1990; de outro, considerações tão precisas sobre como as coisas irão funcionar: ninguém está a salvo, e isso fica óbvio com a chocante morte de Dewey, já premeditada desde o primeiro trailer oficial, ou da xerife Judy (Marley Shelton), cuja carga emotiva fornece um dramático desfecho para os chamados “personagens-legado”. E tudo fica ainda mais comovente quando o brusco desfecho desperta ações imediatas em Sidney e Gale, que vestem seus trajes bad-ass mais uma vez para derrotar Ghostface de uma vez por todas.

Bettinelli-Olpin e Gillett já provaram seu apreço e seu respeito pelo terror no elogiado e divertido Casamento Sangrento, que superou as expectativas e consagrou-se como uma sólida aventura slasher e sobrenatural. E, enquanto alguns pensavam que isso poderia ser “sorte de principiante”, eles provaram errado e mergulharam de cabeça numa miscelânea equilibrada e explosiva de alusões a títulos atemporais do gênero: o gore Sean S. Cunningham e John Carpenter se fundem à elegância de Alfred Hitchcock e ao despojo estético do próprio Craven, deixando que as reviravoltas corram soltas por quase duas horas. E, no topo de tudo isso, há uma quantidade considerável de fan-service que revisita o saudosismo do público mais velho e introduz os novos espectadores a um mundo perigoso e feroz.

A eficácia de longa é notável, mas não livre de algumas problemáticas. As viradas no roteiro são inúmeras e fornecem ritmo para a trama, ainda que a revelação final venha acompanhada de uma previsibilidade perceptível (colocar o namorado e uma adolescente conturbada como os homicidas não é original, mas utiliza os clichês a favor de um elogio ao que já foi apresentado). E, no que a produção peca em fórmulas, procura ofuscá-las com uma voraz e crua imagética que tira o nosso fôlego e que se rende a um proposital exagero.

Pânicoé o capítulo da saga que todos queríamos – e seu sucesso provém de uma total despreocupação em revolucionar um gênero que não pode mais ser revolucionado, e sim prestigiado. A obra não quer entregar nada além do quer e, por esse motivo, funciona com uma surpreendente honestidade que merece ser reconhecida em sua completude.

YouTube video

YouTube video

Mais notícias...

Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

Siga-nos!

2,000,000FãsCurtir
372,000SeguidoresSeguir
1,620,000SeguidoresSeguir
195,000SeguidoresSeguir
162,000InscritosInscrever

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

MATÉRIAS

CRÍTICAS

Crítica com Spoilers | ‘Pânico’ honra o legado de Wes Craven da maneira mais voraz possível

YouTube video

Pânico não se tornou uma das franquias mais emblemáticas do cinema por qualquer motivo – mas sim pela genial mente de Wes Craven, um dos nomes mais conhecidos do entretenimento contemporâneo. Duas décadas e meia atrás, o realizador eternizou a figura do serial killer Ghostface e de atores e atrizes memoráveis ao construir um épico slasher metalinguístico que revolucionava o modo de se contar histórias e influenciava uma geração de diretores e roteiristas nos anos seguintes. Depois de sua morte, coube a Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett revisitarem os filmes e entregarem um dos melhores capítulos da saga – que honrou a memória de Craven em um diabólico e delicioso banho de sangue.

A cena de abertura do longa, que recebeu o mesmo título do original em uma homenagem ainda mais concisa, remonta à icônica sequência com Drew Barrymore – mas, dessa vez, abrindo espaço para a primeira personagem original, Tara (Jenna Ortega). Diferente do que poderíamos esperar, Tara não é uma coadjuvante desperdiçada; pelo contrário, ela sofre brutais ataques de um Ghostface muito mais impiedoso, sobrevivendo e resguardando as forças que sobraram para catalisar o retorno de Sam (Melissa Barrera), sua irmã afastada que retorna a Woodsboro depois de saber que a irmã quase morreu pelas mãos de um assassino em série.

Melissa Barrera (“Sam”) stars in Paramount Pictures and Spyglass Media Group’s “Scream.”

A concepção mais inteligente da obra é não se aventurar no caminho sem volta de deixar os personagens clássicos roubarem os holofotes. Pelo contrário, não é até o começo do segundo ato que Sidney Prescott (Neve Campbell), Dewey Riley (David Arquette) e Gale Weathers (Courteney Cox) dão as caras. Os diretores, que se aliam ao roteiro espetacular de James Vanderbilt e Guy Busick, levam o tempo necessário para que o grupo de novas vítimas ganhe a nossa atenção e demonstre que veio para ficar. Nesse quesito, Ortega e Barrera fazem um trabalho espetacular, mas não posam como artistas egoístas que não deixam os outros brilhar – e talvez o aspecto mais interessante é o confronto geracional que emerge com essas vibrantes introduções.

É claro que, quando pensamos em Pânico, não podemos esquecer de alguns deslizes problemáticos que ocorreram nas iterações predecessoras: Pânico 3’ tentou expandir a mitologia de Ghostface ao criar um filme dentro de um filme e, mesmo com as boas intenções, falhou em cumprir com o prometido; Pânico 4’ atualizou a narrativa criada por Craven, mas descartou personas bem construídas em prol de deixar o legado vivo – livrando-se sem pensar duas vezes de Jill (Emma Roberts) e Charlie (Rory Culkin) e impedindo que qualquer continuidade fosse dada ao novo enredo. Mas não é isso que acontece na incursão de 2022: os cineastas conseguem manter a identidade da franquia, lapidar os excessos do passado e deixar claro que têm todas as intenções de voltar mais vezes.

David Arquette (“Dewey Riley”), left, and Courteney Cox (“Gale Weathers”) star in Paramount Pictures and Spyglass Media Group’s “Scream.”

O teor autorreferenciativo é constante, como é de se esperar, mas aqui ele engloba termos relativamente recentes na indústria cinematográfica, como os requels (reboot e sequência, ao mesmo tempo). De um lado, temos a extensão temática que encantou as audiências desde meados dos anos 1990; de outro, considerações tão precisas sobre como as coisas irão funcionar: ninguém está a salvo, e isso fica óbvio com a chocante morte de Dewey, já premeditada desde o primeiro trailer oficial, ou da xerife Judy (Marley Shelton), cuja carga emotiva fornece um dramático desfecho para os chamados “personagens-legado”. E tudo fica ainda mais comovente quando o brusco desfecho desperta ações imediatas em Sidney e Gale, que vestem seus trajes bad-ass mais uma vez para derrotar Ghostface de uma vez por todas.

Bettinelli-Olpin e Gillett já provaram seu apreço e seu respeito pelo terror no elogiado e divertido Casamento Sangrento, que superou as expectativas e consagrou-se como uma sólida aventura slasher e sobrenatural. E, enquanto alguns pensavam que isso poderia ser “sorte de principiante”, eles provaram errado e mergulharam de cabeça numa miscelânea equilibrada e explosiva de alusões a títulos atemporais do gênero: o gore Sean S. Cunningham e John Carpenter se fundem à elegância de Alfred Hitchcock e ao despojo estético do próprio Craven, deixando que as reviravoltas corram soltas por quase duas horas. E, no topo de tudo isso, há uma quantidade considerável de fan-service que revisita o saudosismo do público mais velho e introduz os novos espectadores a um mundo perigoso e feroz.

A eficácia de longa é notável, mas não livre de algumas problemáticas. As viradas no roteiro são inúmeras e fornecem ritmo para a trama, ainda que a revelação final venha acompanhada de uma previsibilidade perceptível (colocar o namorado e uma adolescente conturbada como os homicidas não é original, mas utiliza os clichês a favor de um elogio ao que já foi apresentado). E, no que a produção peca em fórmulas, procura ofuscá-las com uma voraz e crua imagética que tira o nosso fôlego e que se rende a um proposital exagero.

Pânicoé o capítulo da saga que todos queríamos – e seu sucesso provém de uma total despreocupação em revolucionar um gênero que não pode mais ser revolucionado, e sim prestigiado. A obra não quer entregar nada além do quer e, por esse motivo, funciona com uma surpreendente honestidade que merece ser reconhecida em sua completude.

YouTube video

YouTube video
Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

Siga-nos!

2,000,000FãsCurtir
372,000SeguidoresSeguir
1,620,000SeguidoresSeguir
195,000SeguidoresSeguir
162,000InscritosInscrever

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

MATÉRIAS

CRÍTICAS