Em um gênero que constantemente peleja pela falta de originalidade, Continência ao Amor surge como uma inesperada surpresa da Netflix – que se apropria dos clássicos clichês românticos para envolver um público mais diverso em uma história apaixonante sobre redenção e cura. A adaptação da obra de Tess Wakefield inicialmente aparenta ser um filme ultra feminino, perfeito para cativar os corações mais sonhadores. Mas ao alicerçar sua trama em uma premissa essencialmente masculina – a jornada de um problemático jovem no exército norte-americano -, o drama romântico encontra um fôlego novo e traz vida a um conto que vale a pena ser assistido por qualquer um.
Não se engane pelo título piegas, que naturalmente remete aos amados e elogiados doramas. Continência ao Amor, dirigido por Elizabeth Allen Rosenbaum, vai além de um romance sobre duas pessoas completamente opostas na esfera sociopolítica. Na trama, uma promissora e feminista cantora e um jovem fuzileiro de direita decidem forjar um casamento a fim de resolver seus problemas financeiros. Naturalmente, as inesperadas circunstâncias transformarão o arranjo firmado entre eles em um inesperado e sensível amor – nascido a partir do sofrimento e de suas diferenças.
Abordando as visões políticas de direita e esquerda de forma majoritariamente indireta, a produção ainda faz uma breve reflexão sobre posicionamentos extremistas de ambos os lados e sobre como a linha que separa os dois contrastes é mais tênue do que aparenta. Não desperdiçando tempo de tela em divagações desnecessárias a respeito deste assunto, o roteiro de Kyle Jarrow e Liz W. Garcia faz uma metáfora sobre o amor em tempos tão polarizados, à medida em que se dedica a contar uma história delicada e simbólica sobre restauração familiar, recomeços, cura e redenção.
Trazendo alguns elementos que compõem a tradicional jornada do herói, Continência ao Amor homenageia as tropas norte-americanas – constantemente levadas para guerras incompreensíveis – e faz da música um detalhe inesperado que dita o tom e o ritmo da trama. Com Sofia Carson estampando seu talento em canções originais, o drama faz uma justaposição entre duas figuras tão diferentes unidas por um amor jamais planejado.
E mesmo em meio a clichês batidos e alguns erros de roteiro que prejudicam o terceiro ato do filme com reviravoltas excessivas, o longa é capaz de emergir acima de todos os seus problemas a partir de uma contagiante dinâmica entre Carson e Nicholas Galitzine. Com uma química palpável, a dupla de atores nos faz ansiar por mais momentos de alívio e leveza entre eles e é capaz de transformar o previsível roteiro em uma jornada de autodescoberta focada no desenvolvimento de seus personagens.
E embalando a audiência até seus minutos finais, Continência ao Amor é um refrigério que ainda se permite trazer lições valiosas sobre a vida à dois e o significado de família. Formulaico, mas ainda assim identificável, o novo original Netflix pode até não inovar no gênero de drama romântico, mas é capaz de revigorar os maneirismos cafonas com preciosidade e muito carisma.