Pelas lentes criativas de Ryan Murphy e Ian Brennan, o serial killer americano Jeffrey Dahmer ganhou proporções até então inatingidas, com a geração de assinantes da Netflix tendo a oportunidade de conhecer de forma mais intimista a extensão assombrosa de seus crimes. E sob esse mesmo embalo de popularidade, Joe Berlinger retorna como a sua franquia documental Conversando com um Serial Killer, dessa vez revisitando o caso deste jovem de boa aparência, olhos claros e madeixas loiras que passou despercebido pelos olhos de uma polícia relapsa e partidária.
Conversando com um Serial Killer: O Canibal de Milwaukee tenta preencher as lacunas que naturalmente a série Dahmer: Um Canibal Americano foi incapaz de preencher. Trazendo figuras chave que participaram de todo o processo pós-prisão de Jeffrey, Berlinger resgata as mais de 30 horas de gravações que detalham todas as 17 horrendas mortes cometidas pelo psicopata. Trazendo ainda outras figuras que possuem algum tipo de ligação com algumas das vítimas, o documentarista e cineasta faz um compilado histórico e jornalístico que analisa o contexto sociocultural da época de seus crimes, à medida em que brevemente tenta compreender a mente deste homem que orbitou entre a loucura e a sanidade, sendo eventualmente condenado como um homem são que tinha domínio de sua faculdades mentais enquanto cometia seus crimes.
E independente de qual seja a opinião pública a respeito da sanidade mental (ou falta dela) de Dahmer, a minissérie de Berlinger serve como um estudo de caso, que faz levantamos semelhantes à obra biográfica de Murphy e Brennan – mas sem o glamour natural das produções do prolífico criador. E conforme reprisa as incontáveis horas de relatos registrados pela jovem advogada incubida de acompanhar o assassino, Conversando com um Serial Killer traz detalhes mais viscerais e gráficos do que realmente gostaríamos de testemunhas e repete as mesmas sensações que Dahmer: Um Canibal Americano nos trouxe, elevando sua intensidade à potências ainda maiores.
E embora a minissérie original da Netflix seja o bastante para suprir o apetite dos apaixonados por produções do gênero true crime, não espere que Conversando com um Serial Killer: O Canibal de Milwaukee entregue reflexões profundas a respeito das motivações do assassino e do impacto do cenário nacional norte-americano à época. Ainda que tente levantar um importante debate sobre as questões raciais que inevitavelmente impactaram o contexto social em que Jeffrey Dahmer cometeu seus crimes, a série falha por não ir tão além nesse aspecto e por deixar de fora os questionamentos ligados à negligência à comunidade gay, algo que a própria série de Ryan Murphy aborda.
Deixando o debate mais nas entrelinhas, a minissérie de Joe Berlinger se preocupa em apenas narrar os fatos, revisando a história por uma ótica que chega a ser até mesmo… compreensiva demais com os impulsos demoníacos do criminoso. Mas com uma boa direção e uma montagem e edição excelentes, que reforçam a qualidade técnica do trabalho do documentarista, Conversando com um Serial Killer: O Canibal de Milwaukee pode não ser tudo que esperamos, mas é um complemento fundamental àquela série que se tornou a mais assistida da Netflix no final do mês de setembro.