Mandy Moore ganhou reconhecimento ao viver a odiosa antagonista do clássico ‘O Diário da Princesa’ e depois ao dublar Rapunzel na animação ‘Enrolados’; entretanto, Moore, que também marcou presença em diversas comédias românticas, tem uma carreira prolífica na indústria fonográfica – apesar de ter se distanciado nos últimos anos por motivos pessoais. Agora, onze anos depois do lançamento de ‘Amanda Leigh’, ela retorna aos holofotes com sua melhor investida musical, intitulada ‘Silver Landings’. Seu sétimo álbum de estúdio não apenas é uma intimista aventura por sua conturbada vida, como também uma declaração de amor ao que lhe faz feliz: cantar e compor.
Abraçando estilos que já foram incorporados em obras predecessoras, a performer resolve se apropriar do cândido liricismo de cada uma das faixas, aliada à competente produção de Mike Viola, o qual abandona em partes sua tendência alternativa ao abrir espaço para a melódica cultura folk – pincelada com algumas dissonâncias interessantes e um mergulho no country-pop que vem tomando conta dessa esfera nos últimos anos (vide os últimos trabalhos de Lady Gaga e Kacey Musgraves, por exemplo). Diferente do que alguns poderiam imaginar, o CD abre com um envolvente ápice que nos arremessa de volta para os anos 2000 e que traz um diálogo quase automático com “Need You Now”: movida pela suavidade da guitarra, do piano de inferências do blues, “I’d Rather Lose” funciona como uma reflexão moralista que analisa o real significado de felicidade e de vitória.
Ainda que repetitivo no ouvido de certos fãs, ‘Silver Landings’ deixa claro que sua identidade é a mais pura possível, por vezes utilizando-se de instrumentais familiares; porém, a condução de Moore e das vozes secundárias é competente o bastante para nos arrebatar logo no primeiro refrão, como acontece no dramático escopo de “Fifteen” e “Easy Target”, que compartilham uma progressão similar, ainda que tragam letras complementares e antitéticas. Mesmo assim, o que nos mais chama a atenção é a delicadeza com a qual a equipe técnica trata todas as tracks, prezando pela expansão vocal da lead singer e por rendições que oscilam do naturalismo blasé até à comovente teatralidade cultivada por uma arte mais sinestésica que meramente consumível.
Moore e Travis também não pensam duas vezes antes de voltar no passado: em “When I Wasn’t Watching”, as potentes guitarras e a retumbante bateria se respalda nas baladas electro-rock dos anos 1970 e 1980, brincando com o decaimento das notas que busca por respostas e que dá espaço a um bem formulado bridge. Em “Forgiveness”, o folk volta a falar mais alto, à medida que é perscrutado com as suaves escolhas do violão e da performance da artista, que ofuscam as repetitivas batidas no pano de fundo. Na verdade, essa faixa em especial funciona como uma homenagem da própria lead singer ao seu eu mais jovem e aqueles que lhe influenciaram no começo da carreira.
A cantora brinca com um niilismo pueril em algumas investidas, resgatando a inocência que outrora regia seus dias e agora não passam de lembranças que carrega no peito. É o caso, por exemplo, de “Stories Reminding Myself of Me”, que, por mais formulaica que soe, nos encanta por uma pureza de detalhes fascinante e emotiva. Por outro lado, as mensagens que Moore deseja nos passar se fincam a uma sutileza sensorial de tirar o fôlego quando absorvidas com maior atenção: em “Trying’ My Best, Los Angeles”, a cidade dos sonhos é convidativa e perigosa ao mesmo tempo, por prometer algo que muitas vezes nos extenua e nos coloca num confinamento frustrante que nos desanima – e que, na verdade, nos deveria ensinar uma lição valiosa (da mesma forma que a ensinou).
O álbum rende-se bastante a cantigas de época que refletem o background de seus compositores, principalmente quando chegamos às últimas canções: “If That’s What It Takes” é uma lullaby pautada num inesperado dueto e nas notas minimalistas do violão antes de “explodir” em uma transição prática o suficiente para anunciar que estamos perto do fim e que, agora, devemos nos valer de momentos que se foram e que estão para chegar (uma investida quase metafísica que envolve justamente por sua profundidade mascarada). Na música-titular, que de forma sagaz foi imprimida com o grand finale do CD, Moore e seu time mostram que sabem trabalhar com a repetição de acordes e até mesmo a reciclagem de construções, transformando algo a princípio encarado como superficial em uma obra-prima que provavelmente não vai agradar a todos, mas que carrega uma identidade própria e exuberante.
‘Silver Landings’ mantém-se coeso o suficiente ao longo de suas breves dez faixas; pautado em estilos que agora vêm dando espaço para o pop e o disco-dance das décadas anteriores, a artista foi ousada em se deixar levar por aquilo que mais lhe chamou a atenção. O resultado, apesar de alguns breves deslizes que se concentram na esquecível “Save a Little for Yourself”, é aplaudível ao ponto de considerarmos este um dos grandes comebacks do ano.
Nota por faixa:
- I’d Rather Lose – 4,5/5
- Save a Little for Yourself – 3/5
- Fifteen – 5/5
- Tryin’ My Best, Los Angeles – 4/5
- Easy Target – 5/5
- When I Wasn’t Watching – 4,5/5
- Forgiveness – 4,5/5
- Stories Reminding Myself of Me – 3,5/5
- If That’s What It Takes – 4,5/5
- Silver Landings – 5/5