Jim Carrey. Jeff Daniels. Irmãos Farrelly. 20 anos depois
O mundo mudou muito desde 1994. Mas algumas coisas não mudam. A comédia segue como gênero de grande apelo no gosto popular. No Brasil, por exemplo, os filmes do humorista Leandro Hassum lideram as bilheterias a cada ano. Nos EUA, surgiram nomes como Seth Rogen, Judd Apatow, Melissa McCarthy, Tina Fey, Edgar Wright (inglês, mas que ressoa forte na América e no mundo), entre outros. Adam Sandler, surgido na década de 1990, se estabeleceu no fim da mesma e vem se mantendo, produzindo o mesmo tipo de filme repetidamente até hoje.
Já Jim Carrey foi membro da realeza de Hollywood, mesmo que momentaneamente. Na época de sua explosão, o ator canadense chegou a ganhar o maior salário oferecido na indústria, por filme. Debi & Lóide: Dois Idiotas em Apuros (1994) foi o responsável por catapultar Carrey e transformá-lo no rei das bilheterias. Mesmo que não agradasse a todos, por ser considerado por muitos um bufão ou canastrão, todo estúdio queria uma parte do comediante com cara de borracha.
O mundo dá voltas, e vinte anos depois de estar no topo, Carrey não é mais relevante. O ator não emplaca um sucesso há dez anos – de público com Todo Poderoso (2003) e de crítica com Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (2004). Eis que surge a oportunidade de volta por cima, provida pela tendência atual de sequências passadas muitos anos depois, vide Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme e Tron: O Legado. Novamente dirigido pelos irmãos Peter e Bobby Farrelly (que no original estreavam na direção de um longa), Harry (Jeff Daniels) e Lloyd (Jim Carrey) retornam para uma nova aventura com muitos neurônios a menos.
Debi & Lóide 2 mantém o nível do humor incorreto da produção de 1994, ou de qualquer obra dos irmãos cineastas. Conhecidos por irem até o fim do aceitável, e muitas vezes ultrapassá-lo, em nome de risadas, é bom ver que os Farrelly não ficaram doces e açucarados nesses tempos politicamente corretos. Mesmo que nem tudo funcione, a dupla continua jogando muito na tela para ver se cola, e são diversos acertos durante a projeção. Debi & Lóide segue a linha de humor escrachado de clássicos modernos como Apertem os Cintos… O Piloto Sumiu (1980) e Corra que a Polícia Vem Aí (1988).
A intenção, obviamente, não é passar uma mensagem, edificar ou ter qualquer conteúdo. Assim como num show humorístico de stand up (muito populares atualmente), a proposta é entreter e fazer a audiência gargalhar incessantemente durante a exibição. De certo que uma plateia mais refinada e com pouca tolerância para o popularesco, deverá passar longe. Debi & Lóide não é humor inteligente, simplesmente engraçado. E essa é a principal diferença em relação aos filmes recentes de Adam Sandler, igualmente idiotas, porém, sem a mesma graça. Humor precisa funcionar, não importa qual seja ele.
Na trama, Harry descobre uma possível herdeira e ao lado do companheiro inseparável parte em nova aventura pelas estradas do país. Ao longo, ganhamos todas as vertentes da comédia, desde o pastelão, passando pela escatologia, gags, tiradas, trocadilhos, até mesmo o mais sofisticado e clássico (a cena da ligação telefônica entre os dois no mesmo cômodo é digna dos Três Patetas e irmãos Marx). Carrey e Daniels continuam com a química invejável, de amigos de décadas que não se veem há anos, mas basta um reencontro para tudo continuar de onde parou.
A coragem dos protagonistas, hoje cinquentões, em retornar a papéis diminutos e incorretos a essa altura de suas vidas e carreira deve ser adereçada. Afinal, é tudo em nome dos fãs. E apesar das rugas a mais, o comprometimento da dupla é tamanho que realmente parecem ter saído diretamente de algum túnel do tempo. O filme reserva ainda a participação de Kathleen Turner (musa da década de 1980), brincando com sua aparência atual, e da novata Rachel Melvin (Penny, a filha), que não faz feio perante a dupla com seu empenho. Mesmo não causando o impacto histérico em mim (na época do original, um menino entrando na adolescência), Debi & Lóide 2 é uma comédia digna de muitas risadas.