Quase vinte anos se passaram desde que o primeiro ‘Doze é Demais’ estreou nos cinemas e fez um enorme sucesso entre a garotada – não só por trazer Steve Martin no papel principal, como também por contar uma divertida aventura que envolvia uma família com dez crianças e adolescentes. entretanto, as primeiras duas versões da história basicamente eram centradas em uma família de raça branca, e abordavam situações comuns à classe média branca. Apesar de ter funcionado muito bem no início do milênio, essa abordagem acabou excluindo os outros tipos de famílias do mundo. Numa tentativa de incluir outras possibilidades para esta história consagrada, chegou recentemente à DisneyPlus o novo ‘Doze é Demais’.
Paul (Zach Braff) e Zoey Baker (Gabrielle Union) são um casal interracial perfeito, dinâmico e totalmente sincronizado. Os dois são pais de oito crianças, dentre as quais quatro do relacionamento deles e quatro fruto de relacionamento com outras pessoas – o astro do basquete Clayton (Timon Kyle Durrett) e Kate (Erika Christensen), que está sempre pela casa fazendo as vezes de baby-sitter da molecada. Paul e Zoey também gerenciam o próprio restaurante familiar, onde molho especial de Paul é um grande sucesso. Porém, sentindo-se ameaçado com o retorno de Clayton na vida da família, Paul decide finalmente tomar coragem e tentar empreender a marca de seu próprio molho, e o resultado desse investimento mudará a rotina dessa grande família.
Em cerca de uma hora e quarenta de duração, a sensação que temos ao final de ‘Doze é Demais’ é que o longa de Gail Lerner tenta abordar todos os temas da cartilha da inclusão, sem aprofundar quase nada com propriedade. Assim, o que vemos é uma história completamente picotada, tão retalhada que acaba desandando. O primeiro arco do longa se demora por demais, construindo a rotina agitada da família, mas sem dificuldades ou desafios, o que dá uma entediada; quando Paul tenta vender o molho, a coisa toda gira pra todos os lados, tentando trazer os dramas individuais das crianças, mas focando em apenas duas, deixando todos os outros soltos na trama; no fim, a resolução é acelerada, desfazendo o pouco que tentou construir.
O roteiro de Craig Titley parece ter sido escrito para o formato serial, mas que, após a gravação, foi super editado para encaixar ‘Doze é Demais’ em menos de duas horas. Exemplo disso é uma das filhas, Harley (Caylee Blosenski), que é cadeirante, não só não ter cenas no enredo, como também, quando se mudam para a mansão, a mãe comenta com ela “Olha Harley, você tem seu próprio elevador”. A frase é para fazer menção à uma suposta, ainda que evidente, dificuldade anterior da jovem cadeirante que morava numa casa com escada, e que agora terá sua vida facilitada, mas nada disso é dito, trabalhado ou sequer mencionado no filme, ficando solto como uma referência a algo anterior que parece ter sido gravado mas não foi mostrado ao espectador.
Ainda que retalhado, a nova versão de ‘Doze é Demais’ tem importantes discursos sobre racismo e sobre o abismo que é a experiência de classe média para pais negros e pais brancos. A conversa entre os dois pais, Paul e Clayton, é o momento em que o filme chama a responsabilidade para si e dialoga diretamente com as famílias contemporâneas sobre a seriedade de criar crianças negras e brancas entendendo que as trajetórias delas são diferentes, mas que ambas devem ser criadas para serem boas pessoas. É uma boa mensagem, colocada de maneira direta em uma já consagrada história infantil.