domingo , 22 dezembro , 2024

Crítica | Era Uma Vez Um Sonho – Amy Adams e Glenn Close têm atuação digna de Oscar em fraca produção

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Tem filme que já nos primeiros cinco ou dez minutos de exibição o cinéfilo já consegue sentir um cheirinho de Oscar no ar – ou ao menos de uma indicação. É o caso de ‘Era Uma Vez Um Sonho’, lançamento da semana na Netflix. Mas isso não significa que o filme seja bom, muito pelo contrário.

J.D. Vance (Gabriel Basso) é um promissor estudante de direito na universidade de Yale que quer acompanhar a namorada, Usha (Freida Pinto), para Washington, e, para isso, J. D. precisa conseguir um estágio de verão em um escritório de advocacia para, com o dinheiro, poder pagar os estudos. Entretanto, justamente na semana de entrevistas decisivas para seu futuro, sua irmã, Lindsay (Haley Bennet), telefona para dizer que a mãe deles, Beverly (Amy Adams) estava internada no hospital após uma overdose. Assim, J. D. se vê obrigado a ter que decidir entre o próprio futuro ou abrir mão de tudo e voltar para a pequena cidade de Middletown, onde mora sua mãe viciada em heroína e sua família disfuncional.



Embora essa seja a sinopse da linha narrativa do longa – uma vez que o espectador acompanha o ponto de vista e as memórias do protagonista J. D. –, ‘Era Uma Vez Um Sonho’ não se resume a isso. Baseado no livro do próprio J. D. Vance (ou seja, em fatos reais) o roteiro de Vanessa Taylor usa suas quase duas horas de duração para trabalhar a péssima relação familiar dos Vance, em especial a relação maternal dessa família, que parece atingir as mulheres de uma maneira completamente desequilibrada. Porém, o roteiro se torna uma bagunça ao tentar contar a história de maneira não linear… e não interessante. Falta profundidade na trama, que já foi contada diversas vezes em produções similares.

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Entre Lindsay e seus filhos há claramente uma falta de autoridade da figura materna para se impor aos três pré-adolescentes; entre Bev e sua mãe, Mamaw (Glenn Close), sobrevive um sentimento de desprezo mútuo que une as duas a contragosto; e entre Bev e J. D. reside um amor protetor por parte de Bev, que simplesmente não consegue expressá-lo da maneira convencional, o que tornou a relação dos dois, ao longo do tempo, bastante tóxica.

E é nesses personagens que encontramos a aposta da Netflix para o Oscar 2021. Amy Adams já vem há um tempo investindo em papéis dramáticos que a permitam desenvolver todo seu potencial como atriz, e em ‘Era Uma Vez Um Sonho’ ela encontra o tom certo de uma jovem mãe que, em quem claramente enxergamos ter algum tipo de problema (ou vários), mas que guarda suas razões diante dos olhos do filho. Isso coloca o espectador junto com J. D. acompanhando as inesperadas e múltiplas explosões de raiva, acompanhadas por um abismo sentimental e distúrbios emocionais, tanto na linha temporal do presente quanto nas memórias de J.D., do verão de 1997. As cenas de Amy com Glenn Close são magníficas: as duas roubam o filme construindo personagens humanos em todos os seus defeitos, completamente imperfeitos. Uma pena que o roteiro irregular não ajuda a história.

Uma vez mais Ron Howard dirige um filme que coloca a câmera na essência dos personagens (algo que ele fez muito bem em ‘Uma Mente Brilhante’), mostrando à Academia que o que carrega mesmo um bom filme é ter uma história impactante, sincera, humana, sem se importar com efeitos especiais. Outro erro é o título em português, que dá a entender qualquer coisa de romance de contos de fadas (ainda mais com Amy Adams e Glenn Close no elenco), quando o título original ‘Hillbilly Elegy’ é muito mais cru e honesto: esse filme é, em sua essência, uma elegia ao estilo “caipira” de ser dos estadunidenses, com todas as limitações modernas nas cidades, porém onde o núcleo familiar ainda vem em primeiro lugar. É uma pena que as atuações grandiosas não salvem o filme da mesmice de várias outras produções que exploram o mesmo tema.

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Janda Montenegrohttp://cinepop.com.br
Escritora, autora de 6 livros, roteirista, assistente de direção. Doutora em Literatura Brasileira Indígena UFRJ.

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Tem filme que já nos primeiros cinco ou dez minutos de exibição o cinéfilo já consegue sentir um cheirinho de Oscar no ar – ou ao menos de uma indicação. É o caso de ‘Era Uma Vez Um Sonho’, lançamento da semana na Netflix. Mas isso não significa que o filme seja bom, muito pelo contrário.

J.D. Vance (Gabriel Basso) é um promissor estudante de direito na universidade de Yale que quer acompanhar a namorada, Usha (Freida Pinto), para Washington, e, para isso, J. D. precisa conseguir um estágio de verão em um escritório de advocacia para, com o dinheiro, poder pagar os estudos. Entretanto, justamente na semana de entrevistas decisivas para seu futuro, sua irmã, Lindsay (Haley Bennet), telefona para dizer que a mãe deles, Beverly (Amy Adams) estava internada no hospital após uma overdose. Assim, J. D. se vê obrigado a ter que decidir entre o próprio futuro ou abrir mão de tudo e voltar para a pequena cidade de Middletown, onde mora sua mãe viciada em heroína e sua família disfuncional.

Embora essa seja a sinopse da linha narrativa do longa – uma vez que o espectador acompanha o ponto de vista e as memórias do protagonista J. D. –, ‘Era Uma Vez Um Sonho’ não se resume a isso. Baseado no livro do próprio J. D. Vance (ou seja, em fatos reais) o roteiro de Vanessa Taylor usa suas quase duas horas de duração para trabalhar a péssima relação familiar dos Vance, em especial a relação maternal dessa família, que parece atingir as mulheres de uma maneira completamente desequilibrada. Porém, o roteiro se torna uma bagunça ao tentar contar a história de maneira não linear… e não interessante. Falta profundidade na trama, que já foi contada diversas vezes em produções similares.

Entre Lindsay e seus filhos há claramente uma falta de autoridade da figura materna para se impor aos três pré-adolescentes; entre Bev e sua mãe, Mamaw (Glenn Close), sobrevive um sentimento de desprezo mútuo que une as duas a contragosto; e entre Bev e J. D. reside um amor protetor por parte de Bev, que simplesmente não consegue expressá-lo da maneira convencional, o que tornou a relação dos dois, ao longo do tempo, bastante tóxica.

E é nesses personagens que encontramos a aposta da Netflix para o Oscar 2021. Amy Adams já vem há um tempo investindo em papéis dramáticos que a permitam desenvolver todo seu potencial como atriz, e em ‘Era Uma Vez Um Sonho’ ela encontra o tom certo de uma jovem mãe que, em quem claramente enxergamos ter algum tipo de problema (ou vários), mas que guarda suas razões diante dos olhos do filho. Isso coloca o espectador junto com J. D. acompanhando as inesperadas e múltiplas explosões de raiva, acompanhadas por um abismo sentimental e distúrbios emocionais, tanto na linha temporal do presente quanto nas memórias de J.D., do verão de 1997. As cenas de Amy com Glenn Close são magníficas: as duas roubam o filme construindo personagens humanos em todos os seus defeitos, completamente imperfeitos. Uma pena que o roteiro irregular não ajuda a história.

Uma vez mais Ron Howard dirige um filme que coloca a câmera na essência dos personagens (algo que ele fez muito bem em ‘Uma Mente Brilhante’), mostrando à Academia que o que carrega mesmo um bom filme é ter uma história impactante, sincera, humana, sem se importar com efeitos especiais. Outro erro é o título em português, que dá a entender qualquer coisa de romance de contos de fadas (ainda mais com Amy Adams e Glenn Close no elenco), quando o título original ‘Hillbilly Elegy’ é muito mais cru e honesto: esse filme é, em sua essência, uma elegia ao estilo “caipira” de ser dos estadunidenses, com todas as limitações modernas nas cidades, porém onde o núcleo familiar ainda vem em primeiro lugar. É uma pena que as atuações grandiosas não salvem o filme da mesmice de várias outras produções que exploram o mesmo tema.

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Escritora, autora de 6 livros, roteirista, assistente de direção. Doutora em Literatura Brasileira Indígena UFRJ.

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