quinta-feira, abril 25, 2024

Crítica | Lady Gaga e Tony Bennett criam uma obra-prima com o evocativo ‘Love for Sale’

Lady Gaga e Tony Bennett colaboraram pela primeira vez ainda em 2011, quando a lenda do jazz convidou a Mother Monster para uma aclamada rendição de “The Lady is a Tramp”. Não demorou muito até que os artistas unissem forças para um álbum completo; intitulado ‘Cheek to Cheek’ e lançado em 2014, o disco serviu como divisor de águas para a carreira de Gaga, que se afastou do pop e do electro-rock e provou sua versatilidade, além de ter servido como uma elogiada adição ao prolífico percurso trilhado por Bennett. Não é surpresa que os dois tenham conquistado o Grammy de Melhor Álbum Vocal Pop Tradicional e o topo das paradas da Billboard, quebrando inúmeros recordes e conquistando ouvintes das mais diversas gerações.

Sete anos mais tarde, os icônicos performers resolveram se juntar mais uma vez com um segundo álbum colaborativo, intitulado ‘Love for Sale’. Após as belíssimas homenagens feitas a nomes como George Gershwin, Cole Porter, Jerome Kern e Irving Berlin, Gaga e Bennett resolveram continuar o projeto de apresentar a universalidade do jazz ao público mais jovem com um tributo especial a Porter, separando doze faixas (na versão deluxe, vale lembrar) pinceladas com uma química apaixonantes e com um sabor agridoce que acompanha a despedida de Tony do cenário fonográfico após ser diagnosticado em 2016 com Alzheimer. Por essa razão e por tudo o que o cantor e compositor representa para a história, não podemos deixar de nos emocionar track a track, ainda que a construção e a progressão sejam divertidas e dançantes.

A produção pode não ser a primeira opção dos apaixonados pela carreira mainstream de Gaga ou daqueles que não tem um apreço significativo pelo jazz e pelo blues. Entretanto, principalmente a seus fãs mais antigos, é necessário apreciar as várias formas com que ela se entrega de corpo e alma – e ‘Love for Sale’ não seria diferente. Gaga sempre se mostrou fã do gênero e comentou em inúmeras entrevistas que Bennett havia salvado sua vida (afinal, não podemos nos esquecer da injusta represália que ela sofreu pouco depois do lançamento de ‘ARTPOP’). Tony ajudou-a a reencontrar o gosto pela música e pelo canto e permitiu que ela ousasse sair dos rótulos a que se restringia. Enquanto ‘Cheek to Cheek’ de fato teve alguns problemas estruturais, essa nova e antecipada colaboração acertou em cheio no que se propôs a entregar e arrancou uma química invejável de duas das vozes mais potentes de suas respectivas gerações.

O álbum se inicia da maneira mais inteligente e instigante possível, com  uma interpretação irretocável de “It’s De-Lovely”. A canção original foi lançada em 1936 e tornou-se uma das assinaturas de Porter; acompanhada do classicismo do pré-guerra, a iteração é considerada um dos maiores sucessos do compositor e foi adotada com respeito aplaudível por Gaga e Bennett. A versão é marcada pelo impacto de vocais tão diferentes entre si e que, contrariando todas as expectativas, se complementam em uma deliciosa explosão sensorial. É notável como a dupla demonstra estar se divertindo, quebrando as barreiras engessadas da música e conversando um com o outro em meio aos neologismos “de-lightful, de-licious, de-lirious, de-lovely” e ao nostálgico som do trompete e do baixo.

Felizmente, a atemporal jornada a que eles nos convidam não se dispôs sem um breve material promocional que incluiu a música titular e o lead single “I Get A Kick Out Of You”. Esta aposta em uma reclusão intimista e romântica que enlaça gerações tão diferentes e mostra que, mesmo aos 95 anos de idade e sofrendo de um mal irrefreável e irrecuperável, Bennett ainda tem paixão pelo que faz e emociona a cada sílaba proferida; aquela, por sua vez, carrega as memórias de Kathryn Crawford no musical ‘The New Yorkers’ e deixa que o cantor carregue a primeira metade e prepare o terreno para a fluidez da mezzo-soprano. O resultado é inenarrável e transcende os meros comentários técnicos, como o pungente solo do saxofone, pavimentando uma mandatória experiência pessoalista que nos arranca da cruel realidade e nos leva numa viagem onírica e muito especial.

Bem como ‘Cheek to Cheek’, Gaga toma as rédeas de uma performance solo de tirar o fôlego e, aqui, mergulha nas profundezas de “Do I Love You”. A cantora estende suas incursões para Barbra Streisand numa teatralidade surpreendente e que há muito não era vista no escopo fonográfico, declamando seu amor por Bennett e agradecendo por todos os momentos que ele lhe proporcionou – como se estivesse se despedindo (por ora, e não para sempre). Bennett também demonstra sua força com a fabulesca e surpreendente atmosfera de “So in Love”, uma das melhores tracks do álbum, e em “Just One of Those Things”. E, depois de se renderem à bossa-nova de “I Concentrate on You”, retornam no prenúncio conclusivo de “Dream Dancing” antes de encerrarem a candura e a elegância dessa aventura com a animada “You’re the Top”.

Não deixe de assistir:

‘Love for Sale’ é uma colaboração que deve e que merece ficar marcada para a história, reunindo dois nomes incríveis e necessários em uma obra-prima do começo ao fim. Mais do que isso, o álbum funciona como um plástico escape cuja importância vai para muito além do lugar-comum e desconstrói as formulaicas ideias do que significa fazer arte.

Nota por faixa (versão deluxe):

1. It’s De-Lovely – 5/5
2. Night And Day – 4,5/5
3. Love For Sale – 5/5
4. Do I Love You – 5/5
5. I’ve Got You Under My Skin – 3,5/5
6. I Concentrate On You – 4/5
7. I Get A Kick Out of You – 4,5/5
8. So In Love – 5/5
9. Let’s Do It – 5/5
10. Dream Dancing – 4/5
11. Just One of Those Things – 5/5
12. You’re The Top – 5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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