Filme assistido durante o Festival de Sundance 2022
Atemporais, Lucille Ball e Desi Arnaz redefiniram o conceito de entretenimento no auge dos anos 50. Explorando o formato sitcom a partir da comédia pastelão, o amado casal da vida real fez do pacato cotidiano familiar uma sucessão de intermináveis risos, transformando a cultura POP pelo resto de sua história. E em Lucy e Desi, a comediante, atriz e agora também cineasta, Amy Poehler, nos entrega uma carta de amor a um dos casais mais celebrados, amados e saudosos da TV norte-americana.
Lucy e Desi em sua essência já são o princípio da vanguarda na televisão americana. Uma mulher e um homem de origem latina, ambos digladiaram com executivos de estúdios e a própria opinião pública por justamente não corresponderem ao status quo da época. E no longa, Poehler relembra a trajetória de sucesso nas telas e de fracasso no casamento vividos por ambos, a partir de uma coletânea de fitas preciosas e jamais ouvidas. Sob o selo da Amazon Prime Video, a produção não busca trazer o inesperado ou inédito. Aqui, a documentarista nos leva a uma loja de memorabilia em que os próprios artistas e suas memórias nos transportam a um passado hoje tão longínquo, mas ao mesmo tempo presente entre nós.
Celebrando a beleza de um amor que não pôde ser cultivado em sua totalidade – em virtude das atribuições que o trabalho conjunto lhes trouxe -, Lucy e Desi tem um sabor agridoce. Ao mesmo tempo que nos faz suspirar por toda a contribuição histórica da dupla para a indústria do entretenimento, também parte nosso coração em virtude das trágicas consequências que o peso do sucesso trouxe ao seu casamento. Entre lembranças dolorosas e muitas cenas de I Love Lucy e de outros programas feitos pelo casal, o documentário sempre nos deixa com uma proposital sensação de ausência e um sabor agridoce nos lábios.
Bem montada, a produção conta com pouquíssimas entrevistas externas e foca sua construção narrativa em muitas imagens de arquivo e uma edição belíssima e sensível. Sem o compromisso de explicar demais, o longa naturalmente nos leva a refletir sobre a extensão do impacto global que o entretenimento de Lucille Ball e Desi Arnaz ainda exerce no mundo (lembra das referências de WandaVision a I Love Lucy?), inclusive na produção brasileira.
E como uma prazerosa epifania saudosista, o novo original Amazon Prime Video é um tributo louvável de uma comediante diretamente influenciada pelo casal. Lucy e Desi nos reforça a imensidão do carinho existente entre ambos os artistas – que entre desavenças nos bastidores e discrepâncias pessoais que afloravam nos sets, eram essencialmente dois apaixonados que não souberam viver fora dos holofotes o mesmo amor e alegria que nos fizeram encantar por Lucy e Ricky Ricardo.