Nem sempre a vida que sonhamos se realiza da maneira – e no tempo – que queremos. Selecionado para a programação do Festival de Cinema Francês do Brasil, o longa-metragem Mãos à Obra nos mostra um homem e sua série de decepções e aprendizados ao decidir por uma grande virada na vida: trocando a estabilidade e encontrando desilusões. O protagonista dessa história se coloca como observador do que gira ao seu redor, sem nunca perder a esperança – mesmo diante de dificuldades evidentes.
De mãos dadas com a melancolia, a narrativa se torna cada vez mais intimista, com uma narração do ‘eu interior’ compondo os elos dessas correntes emocionais. Nessa densidade, e com ritmo dosado, o malabarismo dos conflitos nunca perde o rumo do discurso de sua premissa sobre reconstruir a vida, encontrando algumas camadas que servem de apoio às reflexões propostas.
Paul (Bastien Bouillon) deixou uma carreira de relativo sucesso na fotografia para se arriscar no universo literário. Pressionado a realizar um grande romance – com seus trabalhos anteriores sendo um sucesso com os críticos e um fracasso de vendas – e com as contas se acumulando, ele precisa enfrentar a situação enquanto lida com a distância dos filhos, que estão indo com a ex-esposa morar no Canadá, além dos questionamentos e preocupações do pai. Enfrentando essas e outras questões para manter seu novo desejo vivo, Paul luta para sobreviver junto a seus sonhos e acaba se cadastrando em um aplicativo que funciona como um leilão de trabalhos mal pagos.
Os estágios da sensação de falta de sentido – ou mesmo de propósito – vão ganhando espaço como se fossem episódios de uma trajetória com altos e baixos. Pendurar quadros, montar objetos, cortar grama e madeira, jogar árvores de natal fora para as pessoas: tudo isso vira sua rotina, enquanto ele se joga no que lhe resta – o sobreviver – e nadando contra a maré das incertezas. O interessante desse roteiro é que não se joga questionamentos, prefere apresentar os fatos e os acasos como uma ferramenta de imersão existencialista, mas sem muito confrontos com o ‘próprio eu’.
Para quem gosta de se encontrar com histórias de fáceis resoluções, esse filme pode ser um grande desafio. Nada em Mãos à Obra acontece depressa; há um reforço do tempo como elemento representativo do aprendizado – algo ligado também à maturidade. Contando ainda com uma competente direção de Valérie Donzelli, esse é um interessante projeto que pode gerar muitas reflexões.