quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica | Megalopolis – Coppola cria fantasia ancorada em discurso político, porém com CAPENGA tom burlesco

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Será que a ambição nos leva a cometer loucuras? Esta pergunta é pertinente tanto do ponto de vista da trama quanto dos bastidores da produção. É impossível falar de Megalopolis, de Francis Ford Coppola, sem contextualizar os anos de produção que o filme levou para ser feito e a rejeição de investidores ao projeto.

Desde da década de 1980, o renomado diretor — ganhador de cinco Oscar e duas Palmas de Ouro — sonha com este filme. Megalopolis é uma fantasia sobre política social, no entanto, ancorada em elementos do cinema de várias épocas e, principalmente, no caráter burlesco. 



Enquanto a encenação dos atores é propositalmente teatral, a estética do longa é futurista e espelha-se na ambientação de ficção-científica. Confuso? Pois é. Francis Ford Coppola apresenta uma montagem de elementos sobrepostos de maneira bastante desarmoniosa. 

Megalopolis

Se nas cenas iniciais temos a sensação de pisar em um solo parecido com o de Christopher Nolan, onde temos que descobrir a lógica da obra para segui-la. Logo depois, compreendemos que esta é apenas uma ponta do espetáculo proposto pelo cineasta, o qual faz referências de dezenas de obras cinematográficas, assim como literárias, num roteiro em que a citação é rainha de todos os discursos. 

Em uma alusão direta a Metrópolis (1927), de Fritz Lang, Megalopolis propõe ser futurista, mas ancorado nas mazelas atuais, principalmente sobre a insustentabilidade do modelo capitalista, ao invés de ser na era industrial, é na digital. Para isso, no entanto, utiliza-se de linguagens antigas de forma cômica e satírica. 

Outra ponte traçada pelo cineasta é o Império Romano, sucumbido pela soberba de poder de poucos homens, uma referência, talvez, ao aumento de bilionários nesse planeta. A própria cidade fictícia chama-se New Rome, uma mistura de New York a ao império de Júlio César, e o narrador (Laurence Fishburne) nos lembra a cada momento desse espírito histórico em suas interferências.  

Megalopolis

A interpretação mais memorável é a de Shia LaBeouf como Clodio Pulcher, por conta do seu caráter dúbio e andrógeno, tal como o bobo da côrte, já que todos os outros personagens  parecem terem saído de folhetins dos anos 1930. Além disso, os papéis femininos são unidimensionais. 

Uma é a mocinha Júlia Cicero (Nathalie Emmanuel), que vai apaixonar-se pelo arquiteto utopista Caesar Catalina (Adam Driver) a contragosto do seu pai, o prefeito Franklyn Cicero (Giancarlo Esposito) e inimigo n°1 dos projetos do amado da filha. A segunda personagem feninina é a femme fatalle Wow Platinum (Audrey Plaza), uma repórter interessei que utiliza dos seus atributos físicos para manipular, enganar e roubar os homens ricos. 

Dentro do arco principal da disputa de narrativas do que é melhor para as pessoas: uma cidade sustentável ou um mundo capitalista em ruínas, o enredo engendra ainda tons de filme noir e comédia pastelão. Em uma cena sobre a revelação do segredo de uma celebridade da música pop (Chloe Fineman), o desenrolar remete à cena do tribunal do filme O Mentiroso (1997), com Jim Carey. Sem contar as diversas citações de William Shakespeare e Marco Aurélio, como se o reinventar de frases fosse desnecessário diante de tantas palavras já ditas. 

Megalopolis

Com tantos componentes a analisar em cena, a trama principal de Megalopolis sobre o arquiteto ganhador do prêmio Nobel, por conta da descoberta do Megalon, fica quase como um pano de fundo do que uma intriga latente. Ao invés de instigar a curiosidade, o longa nos aborrece com tanta espetacularização da riqueza, cenas exageradamente teatrais e de zombaria.

Megalopolis é um filme sobre um megalomaníaco utópico, dessa forma a cidade almejada não existe (e nunca existirá), mas o utopista luta pelo direito de imaginá-la. Algo que o protagonista diz em alto e bom tom na narrativa é que não importa se ele projetá-la um dia, só de as pessoas começarem a discutir sobre o processo é uma vitória. A reflexão soa piegas como boa parte da estética do filme e seus personagens. Olhando pelo prisma de deixar-se levar pela comicidade, é possível divertir-se aqui e ali durante a projeção. 

Ao tentar abraçar um mundo, isto é, todos às estéticas e referências, Megalopolis parece um filme mal acabado, com um pouco de beleza  — as cenas das estátuas desmoronando são ímpares  —, e sem lucidez. Aos 85 anos, Francis Ford Coppola permite-se confundir, enjoar e desagradar, já o público decide se vai aplaudir sua loucura ou escarnecer de sua ridicularização utópica.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Desde da década de 1980, o renomado diretor — ganhador de cinco Oscar e duas Palmas de Ouro — sonha com este filme. Megalopolis é uma fantasia sobre política social, no entanto, ancorada em elementos do cinema de várias épocas e, principalmente, no caráter burlesco. 

Enquanto a encenação dos atores é propositalmente teatral, a estética do longa é futurista e espelha-se na ambientação de ficção-científica. Confuso? Pois é. Francis Ford Coppola apresenta uma montagem de elementos sobrepostos de maneira bastante desarmoniosa. 

Megalopolis

Se nas cenas iniciais temos a sensação de pisar em um solo parecido com o de Christopher Nolan, onde temos que descobrir a lógica da obra para segui-la. Logo depois, compreendemos que esta é apenas uma ponta do espetáculo proposto pelo cineasta, o qual faz referências de dezenas de obras cinematográficas, assim como literárias, num roteiro em que a citação é rainha de todos os discursos. 

Em uma alusão direta a Metrópolis (1927), de Fritz Lang, Megalopolis propõe ser futurista, mas ancorado nas mazelas atuais, principalmente sobre a insustentabilidade do modelo capitalista, ao invés de ser na era industrial, é na digital. Para isso, no entanto, utiliza-se de linguagens antigas de forma cômica e satírica. 

Outra ponte traçada pelo cineasta é o Império Romano, sucumbido pela soberba de poder de poucos homens, uma referência, talvez, ao aumento de bilionários nesse planeta. A própria cidade fictícia chama-se New Rome, uma mistura de New York a ao império de Júlio César, e o narrador (Laurence Fishburne) nos lembra a cada momento desse espírito histórico em suas interferências.  

Megalopolis

A interpretação mais memorável é a de Shia LaBeouf como Clodio Pulcher, por conta do seu caráter dúbio e andrógeno, tal como o bobo da côrte, já que todos os outros personagens  parecem terem saído de folhetins dos anos 1930. Além disso, os papéis femininos são unidimensionais. 

Uma é a mocinha Júlia Cicero (Nathalie Emmanuel), que vai apaixonar-se pelo arquiteto utopista Caesar Catalina (Adam Driver) a contragosto do seu pai, o prefeito Franklyn Cicero (Giancarlo Esposito) e inimigo n°1 dos projetos do amado da filha. A segunda personagem feninina é a femme fatalle Wow Platinum (Audrey Plaza), uma repórter interessei que utiliza dos seus atributos físicos para manipular, enganar e roubar os homens ricos. 

Dentro do arco principal da disputa de narrativas do que é melhor para as pessoas: uma cidade sustentável ou um mundo capitalista em ruínas, o enredo engendra ainda tons de filme noir e comédia pastelão. Em uma cena sobre a revelação do segredo de uma celebridade da música pop (Chloe Fineman), o desenrolar remete à cena do tribunal do filme O Mentiroso (1997), com Jim Carey. Sem contar as diversas citações de William Shakespeare e Marco Aurélio, como se o reinventar de frases fosse desnecessário diante de tantas palavras já ditas. 

Megalopolis

Com tantos componentes a analisar em cena, a trama principal de Megalopolis sobre o arquiteto ganhador do prêmio Nobel, por conta da descoberta do Megalon, fica quase como um pano de fundo do que uma intriga latente. Ao invés de instigar a curiosidade, o longa nos aborrece com tanta espetacularização da riqueza, cenas exageradamente teatrais e de zombaria.

Megalopolis é um filme sobre um megalomaníaco utópico, dessa forma a cidade almejada não existe (e nunca existirá), mas o utopista luta pelo direito de imaginá-la. Algo que o protagonista diz em alto e bom tom na narrativa é que não importa se ele projetá-la um dia, só de as pessoas começarem a discutir sobre o processo é uma vitória. A reflexão soa piegas como boa parte da estética do filme e seus personagens. Olhando pelo prisma de deixar-se levar pela comicidade, é possível divertir-se aqui e ali durante a projeção. 

Ao tentar abraçar um mundo, isto é, todos às estéticas e referências, Megalopolis parece um filme mal acabado, com um pouco de beleza  — as cenas das estátuas desmoronando são ímpares  —, e sem lucidez. Aos 85 anos, Francis Ford Coppola permite-se confundir, enjoar e desagradar, já o público decide se vai aplaudir sua loucura ou escarnecer de sua ridicularização utópica.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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