Quase dois anos depois das reviravoltas do final do seu terceiro capítulo, em dezembro de 2022, o seriado de Darren Star chega a sua quarta temporada exatamente como todas as outras: um passeio por Paris e cidades francesas de um ponto de vista simples e leve. Emily em Paris continua a apresentar sua protagonista (Lily Collins) mais interessada em mudar de outfit em cada cena do que revelar traços de sua personalidade.
Geralmente séries de comédia apoiam-se em situações engraçadas de personagens simpáticos e carismáticos, o público diverte-se em acompanhar seus maneirismos e fazer boas e más escolhas. Miriam Maisel (Rachel Brosnahan) é apaixonante em A Maravilhosa Sra. Maisel (2017-2023), já Hannah Horvath (Lena Dunham) é irritante em Girls (2012-2017), porém ambas nos dão a oportunidade de emergir sensações. Algo, no entanto, ausente na quarta temporada de Emily em Paris.
Dessa vez, a narrativa é dividida em duas partes, a primeira de cinco episódios, lançados em 15 de agosto, e outros cinco, em 12 de setembro. Na primeira metade, os três primeiros focam em desatar os nós do triângulo amoroso entre Emily, Gabriel (Lucas Bravo) e Alfie (Lucien Laviscount). O britânico apaixonado é realmente o único personagem, infelizmente, a despertar certa emoção, mas o modo que os roteiristas o trata é lastimável.
Desde a primeira temporada, Emily e Gabriel vivem este romance fogo de palha, pouco convincente e sem tanta química, portanto, a torcida por ver os dois juntos é inexistente. Ainda mais com a nova barreira do casal ser Camile (Camille Razat) grávida, vivendo com sua amante grega no seu apartamento. O seriado simboliza o período como uma zona cinzenta, e um modelo moderno de relação dos franceses.
As piadas clichês da diferença cultural diminuíram, mas ela ainda flutua em alguns diálogos, como nesse ideal de trisal e amantes franceses, além da expressão idiomática “ménage à trois” e “trompe l’oeil”. Por outro lado, os passeios pelas cidades ao redor de Paris e suas paisagens peculiares ainda rendem bastante visitas e experiências a serem exploradas.
No Segundo episódio, somos convidados à quadra de Roland Garros, o maior torneio de tênis do mundo, realizado entre final de maio e início de junho, todos os anos em Paris. Assim como, a bela cidade de Giverny, onde é localizada os jardins e a casa do pintor impressionista Claude Monet, a apenas uma hora e meia da capital.
Igualmente, nos chama à atenção a gastronomia peculiar parisiense, como as sobremesas “enganadoras” em forma de frutas, garrafas e pratos, criadas pelo chef Cédric Grolet, no restaurante Maurice. Lançado alguns anos atrás, as criações do francês tornaram-se altamente populares nas redes sociais e ele possui mais de 11 milhões de seguidores.
Por esses e outros pequenos detalhes dos arredores da capital francesa e da própria cidade, o seriado ainda possui o seu encanto. Podemos, por exemplo, fazer um passeio pelas famosas Galeries Lafayette, onde todos os turistas encontram todas as marcas mais famosas do país, e ainda presenciar um jantar no caríssimo L’Ambroisie, com três estrelas Michelin, — onde nenhum prato é menos de 100 euros, isto é, mais de 500 reais — , na Praça de Vosges.
Emily em Paris tenta não ser somente sobre a cidade e a protagonista título; deixando um pouco de espaço para os dilemas de Luc (Bruno Gouery), Julien (Samuel Arnold), Mindy (Ashley Parkold) e, principalmente, Sylvie Grateau (Philippine Leroy-Beaulieu). Esta última mostra-se como uma peça bastante importante para o pequeno gesto da produção a favor do movimento #MeToo na França, despertado este ano pela denúncia da atriz Judith Godrèche de abuso — ainda quando menor de idade — contra os diretores franceses Benoît Jacquot e Jacques Doillon.
Tratando-se do tom descompromissado da série, o assunto não ganha tanta proeminência, mas serve de pano de fundo para algumas importantes decisões. A promessa para a segunda parte é de conhecer outras cidades na França e conservar o romance morno e conturbado de Emily e Lucas, os quais nunca estão prontos para assumir uma autêntica relação. Ainda mais que Emily não demonstra nenhum esforço em integrar-se à cultura francesa e continua sendo uma turista em Paris, apesar do emprego de publicitária e seus duvidosos pitches de vendas.
No fim das contas, eu gostaria de conhecer mais Emily, seus gostos (além das roupas); sua família, sua vida anterior nos EUA e até mesmo o seu salário para vestir-se como esbanjadora em Paris, contudo não temos nada disso. Apesar do tom raso, Emily em Paris segue como série embaixadora da França para o mundo e catapulta o interesse do público, sobretudo dos norte-americanos, a fazerem o seu próprio tour Emily in Paris.