Família é uma coisa constituída através de uma relação imprevisível. Por um lado, crescemos com pessoas que achamos que conhecemos, cujas índoles podemos colocar nossa mão no fogo. Por outro, essas mesmas pessoas que sempre pareceram boas podem, da noite para o dia, virar ao avesso, dependendo da circunstância que as envolva. E, no meio disso tudo, há o tal laço consanguíneo, que une a todos apesar dos pesares. Então, como lidar com os parentes que não merecem, assim, tanto amor? Partindo dessa reflexão vem o filme ‘O Preço da Família’, comédia italiana já disponível aos assinantes da Netflix.
Carlo (Christian De Sica) e Anna (Angela Finocchiaro) são um casal que está sofrendo da “síndrome do ninho vazio”, que é quando os filhos crescem, saem de casa e os pais ficam sentindo um enorme buraco no cotidiano da casa. Após muitas tentativas de retomar o contato com Alessandra (Dharma Mangia Woods) eles a flagram propositalmente não atendendo o celular com uma chamada deles; no mesmo dia, marcam um jantar com Emilio (Claudio Colica) e percebem que o rapaz só foi encontrá-los para buscar as blusas limpas e passadas que a mãe levara. É assim que o casal percebe que seus filhos não se importam com eles, e, por isso, decide inventar uma mentira: vão fingir que receberam uma herança inesperada de 6 milhões de euros, só para ver se, assim, os filhos voltam a se interessar pelos pais. Diante da realidade que a brincadeira proporciona, o difícil será contar a verdade e deixar de viver uma vida de luxo e glamour à qual passam a tomar gosto.
‘O Preço da Família’ tem uma premissa bem interessante, que é essa coisa de testar até onde vai a ganância e os interesses humanos – mesmo entre família – quando muito dinheiro está em jogo. Ao mesmo tempo que retrata bem a mudança de comportamento dos filhos diante da bolada – que imediatamente começam a fazer planos com o dinheiro, como se a quantia fosse deles -, não deixa de ser triste observar a desolação desses pais, que precisam apelar para a fictícia ideia de se tornaram milionários para voltar a receber atenção e carinho dos filhos, a quem deram tudo a vida toda mas que, uma vez tendo se mudado para a capital, passaram a ignorar e rejeitar os pais. Através da comicidade, o filme de Giovani Bognetti propõe uma boa reflexão sobre esse assunto, sem apontar culpados – ao contrário, compartilhando as parcelas de culpa entre cada um dos envolvidos.
O roteiro, também escrito por Giovani Bognetti, flui bem entre os três arcos do enredo, envergando suavemente mais para este gênero do que para a comédia, ainda que não haja momentos verdadeiramente dramáticos. Entretanto, não passa despercebido certa estereotipização dos personagens e suas resoluções (todas as vezes que os pais precisam resolver assuntos individuais com os filhos, a mãe é quem lida com a filha mulher, enquanto o pai lida com o filho homem, sem haver alternância dos papéis).
Bastante iluminado e com um clima natalino (afinal, a história se passa na época de Natal), ‘O Preço da Família’ é uma comédia dramática leve que convida o espectador a pensar – e a pensar não tanto nas relações de interesse, mas, acima de tudo, no próprio comportamento para com nossos pais. Para ver em família!