Crítica | Pearl – Mia Goth deve ser indicada ao Oscar por viver “versão feminina do Coringa” no TERROR

A frustração de uma vida reduzida ao ostracismo do anonimato se transforma em um contemplativo banho de sangue pelas mãos de Ti West em seu terror X: A Marca da Morre. Com ares de Sexta-feira 13, sob uma fotografia solar e uma hipersexualização de seus personagens, o terror conceitual é um frescor dentro do gênero, que emana a estética oitentista em um longa que, muito mais do que assustar, se preocupa em nos tragar para a sanguinolência de seus atos. Uma sucessão de assassinatos motivados pela infelicidade de uma isolada senhora que vive às custas de sonhos jamais realizados, o original é uma observação sobre o ser humano em seu estado mais primitivo possível – longe do convívio social e distante da sanidade lógica que governa a humanidade.

Pearl: Uma História de Origem ‘X’ chega aqui como uma história de origem não necessária, mas inegavelmente espetacular. Explicando quem foi a maldita vilã que nos revirou o estômago com mortes tão gráficas, a prequel de ‘X: A Marca da Morte‘ não é aquele clássico terror de jumpscares, mas é definitivamente um impecável ensaio sobre um surto psicótico. A realidade de Pearl (Mia Goth) poderia ser de enlouquecer qualquer um. Com seu esposo no fronte de batalha, ela dedica seus dias de volta à casa de seus pais, onde deve cuidar do seu pai – que segue em estado vegetativo -, enquanto é constantemente humilhada e maltratada por sua mãe. Entre os afazeres da fazenda e os cuidados paliativos que lhe tomam a energia, ela sonha com a vida de uma vedete nos palcos e nos cinemas. Sempre entre a mais pura e alucinante fantasia e uma dura realidade jamais desejada, ela tenta traçar seus caminhos em direção ao sucesso, fama e beleza plástica. O que não lhe disseram é que em uma terra árida, os sonhos nascidos do campo não tendem a florescer.

E sob uma estética bem technicolor, que remonta o formato dos filmes dos anos 50 e 60, West entrega outro brilhante terror que vai muito mais além do combo de sustos que normalmente nos aguarda em um terror slasher. Pearl é de fato uma espiral caótica de uma jovem à deriva de sua própria existência, que perece em uma vida medíocre onde sua identidade e personalidade são abafadas e sucumbidas pelas pressões de uma matriarca agressiva, insensível e indiferente. Mas independente do contexto familiar que nos trouxe Pearl, é inegável que a vilania já habitava nela, como West faz questão de mostrar em sua tortuosa forma de sacrificar animais indefesos. E essa construção é fundamental para tornar a idosa Pearl de ‘X‘ em uma criatura cruel e monstruosa aos olhos dos personagens e, obviamente, da audiência.

Conectando ambos os filmes de forma natural e quase imperceptível, Pearl é um derivado que caminha por suas próprias pernas e em diversos momentos nada se assemelha a ‘X‘. Com uma abordagem levemente metalinguística e um desenvolvimento narrativo diferente, o longa concentra-se na jornada autodestrutiva de uma jovem que enlouquece diante de sua realidade e da impossibilidade de seus sonhos. Trazendo uma performance poderosa de Mia Goth, o longa mostra uma vez mais a versatilidade da atriz em navegar em três personagens distintas em uma mesma franquia: Maxine – atriz de filmes adultos; a idosa Pearl em seu estado moribundo; e a jovem Pearl – uma garota entre a inocência e a insanidade histérica que a leva em uma epifania de assassinatos.

Caprichando em seu segundo ato com uma sanguinolência de encher os olhos dos mais famintos pelos slasher, Pearl ainda abre espaço para um toque de humor e brinca com as oscilações emocionais de sua protagonista, transformando-na em uma pequena mistura entre o horror e um sarcasmo de um humor ácido e cortante. Violento, mas nada assustador, o mais novo filme de Ti West é uma espécie de jornada do vilão. E embora não acrescente nada genuinamente novo à X: A Marca da Morte, Pearl é o tipo de horror conceitual que é tão meticulosamente bem feito, que merece ser desfrutado até mesmo como uma experiência única sobre uma jovem frente à frente com a pior versão de si mesma.

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