quinta-feira , 21 novembro , 2024

Crítica | ‘Pinóquio’ é um enfadonho live-action que não traz quase nada de interessante

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Em 1940, a Walt Disney Studios lançava uma de suas mais adoráveis animações – a divertida e inspiradora Pinóquio. Baseada no romance italiano homônimo de Carlo Collodi, a narrativa acompanha um velho marceneiro chamado Gepeto, cujo maior desejo é ter um filho. Atendendo a seu pedido, a benevolente Fada Azul utiliza seus poderes para trazer a marionete titular à vida, aconselhando-o a ser corajoso, verdadeiro e generoso para, de fato, se tornar um menino de verdade. Entretanto, como podemos imaginar, Pinóquio é seduzido pelas tentações da vida e, por vezes, desvia de seu caminho de bondade e quase cede às futilidades de seu cotidiano – seja pelas promessas vazias da fama e do sucesso, seja pelo cárcere induzido da Ilha dos Prazeres.

Considerada como uma grande metáfora arquetípica do bem e do mal (algo bastante incisivo, considerando que o filme foi lançado no início da II Guerra Mundial), a história foi eternizada de diversas maneiras e com incontáveis releituras – incluindo uma animação futurista intitulada Pinóquio 3000’ e uma backstory mais sombria na série ‘Once Upon a Time’. Agora, continuando sua onda de remakes em live-action, a Casa Mouse lança uma nova adaptação da trama no catálogo do Disney+, destinado essencialmente à geração mais recente de crianças e tentando reorganizar o enredo como respaldo para a atualidade. Entretanto, apesar das boas intenções, a releitura é uma investida enfadonha, sem muito de interessante a dizer e sem muita originalidade (com exceção de algumas mudanças criminosas que, basicamente, se esquecem da essência da obra original).



O primeiro ato segue os passos do filme de 1940: a cena de abertura nos apresenta ao Grilo Falante (Joseph Gordon-Levitt) chegando à casa de Gepeto em uma noite fria, procurando se esquentar. Lá, o marceneiro, interpretado pelo sempre incrível Tom Hanks, conversa consigo mesmo e com seus animaizinhos de estimação, Cleo e Fígaro, sobre suas criações e sobre seu desejo de ter um filho para compartilhar das histórias por trás das dezenas de relógios. Afinal, ele perdeu a esposa e, desde então, se confinou à loja que possui, com medo de enfrentar o mundo lá fora e encontrando conforto consigo mesmo e com as sólidas paredes que o protegem. Como já sabemos, a Fada Azul (Cynthia Erivo) ouve a prece de Gepeto e dá vida ao boneco de madeira Pinóquio (Benjamin Evan Ainsworth), que, apesar de “quase ser um menino de verdade”, é o suficiente para trazer felicidade ao marceneiro.

De certa forma, o fato do live-action ser extremamente apaixonado pela animação posa como uma faca de dois gumes: de um lado, todos os elementos estilísticos e imagéticos estão lá, nos levando para um cenário perdido no tempo e recheado de obstáculos através dos quais Pinóquio irá navegar. Ele enfrenta a dura realidade de ser diferente das outras crianças, motivo pelo qual é expulso da escola, bem como a presença ameaçadora de Honesto, uma raposa trambiqueira e golpista que consegue convencê-lo de que o show business é o que o futuro reserva ao protagonista, e não a normalidade da escola; temos também o perigoso e cruel Sr. Stromboli (Giuseppe Battiston), dono de um circo itinerante de marionetes, e a lábia do Cocheiro (Luke Evans), que leva crianças para a sinistra Ilha dos Prazeres para transformá-las em burrinhos e vendê-las para as minas de sal.

De outro lado, esse fascínio pela produção original também se mostra como um martírio. Afinal, Robert Zemeckis, que comanda o remake e assina o roteiro, parece preso demais em honrar a animação e não buscar alguma coisa nova, como vimos em ‘A Bela e a Fera’, ‘Mogli’ ou ‘Aladdin’. É claro, temos a presença de Kyanne Lamaya como Fabiana, uma ex-bailarina que trabalha para Stromboli contra a própria vontade e que se torna uma aliada inesperada de Pinóquio – mas, se a tirarmos de jogo, nada muda. Fabiana é construída apenas como uma escolha paliativa e que não coloca nada em xeque para o destino do protagonista ou fornece ajuda considerável. Nem mesmo as bizarras criaturas de fumaça da Ilha são de grande ameaça – indo e vindo como são: totalmente esquecíveis.

É claro que ainda temos o charme conhecido de Zemeckis, que parece mais preocupado em dar a Hanks mais uma chance de brilhar depois de tantas colaborações. O diretor, inclusive, pega algumas páginas emprestadas de ‘Os Fantasmas de Scrooge’ e ‘O Expresso Polar’ e, mesmo infundidas com um classicismo nostálgico, algo ainda parece faltar – e é triste pensar que Zemeckis, em resumo, não parece inspirado o suficiente para trazer essa atemporal história para o novo século (e isso sem mencionar a atroz e inexplicável decisão de não transformar o boneco de madeira em um menino de verdade nas cenas finais).

Pinóquio pode ter o coração no lugar certo, mas isso não é o bastante para quebrar a maldição que se abate sobre os estúdios Walt Disney e seus remakes. Em cada aspecto, um pedaço para faltar, nunca atingindo uma completude plena e deixando para trás um gostinho agridoce de quero mais que só pode ser saciado retornando a um passado distante.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Considerada como uma grande metáfora arquetípica do bem e do mal (algo bastante incisivo, considerando que o filme foi lançado no início da II Guerra Mundial), a história foi eternizada de diversas maneiras e com incontáveis releituras – incluindo uma animação futurista intitulada Pinóquio 3000’ e uma backstory mais sombria na série ‘Once Upon a Time’. Agora, continuando sua onda de remakes em live-action, a Casa Mouse lança uma nova adaptação da trama no catálogo do Disney+, destinado essencialmente à geração mais recente de crianças e tentando reorganizar o enredo como respaldo para a atualidade. Entretanto, apesar das boas intenções, a releitura é uma investida enfadonha, sem muito de interessante a dizer e sem muita originalidade (com exceção de algumas mudanças criminosas que, basicamente, se esquecem da essência da obra original).

O primeiro ato segue os passos do filme de 1940: a cena de abertura nos apresenta ao Grilo Falante (Joseph Gordon-Levitt) chegando à casa de Gepeto em uma noite fria, procurando se esquentar. Lá, o marceneiro, interpretado pelo sempre incrível Tom Hanks, conversa consigo mesmo e com seus animaizinhos de estimação, Cleo e Fígaro, sobre suas criações e sobre seu desejo de ter um filho para compartilhar das histórias por trás das dezenas de relógios. Afinal, ele perdeu a esposa e, desde então, se confinou à loja que possui, com medo de enfrentar o mundo lá fora e encontrando conforto consigo mesmo e com as sólidas paredes que o protegem. Como já sabemos, a Fada Azul (Cynthia Erivo) ouve a prece de Gepeto e dá vida ao boneco de madeira Pinóquio (Benjamin Evan Ainsworth), que, apesar de “quase ser um menino de verdade”, é o suficiente para trazer felicidade ao marceneiro.

De certa forma, o fato do live-action ser extremamente apaixonado pela animação posa como uma faca de dois gumes: de um lado, todos os elementos estilísticos e imagéticos estão lá, nos levando para um cenário perdido no tempo e recheado de obstáculos através dos quais Pinóquio irá navegar. Ele enfrenta a dura realidade de ser diferente das outras crianças, motivo pelo qual é expulso da escola, bem como a presença ameaçadora de Honesto, uma raposa trambiqueira e golpista que consegue convencê-lo de que o show business é o que o futuro reserva ao protagonista, e não a normalidade da escola; temos também o perigoso e cruel Sr. Stromboli (Giuseppe Battiston), dono de um circo itinerante de marionetes, e a lábia do Cocheiro (Luke Evans), que leva crianças para a sinistra Ilha dos Prazeres para transformá-las em burrinhos e vendê-las para as minas de sal.

De outro lado, esse fascínio pela produção original também se mostra como um martírio. Afinal, Robert Zemeckis, que comanda o remake e assina o roteiro, parece preso demais em honrar a animação e não buscar alguma coisa nova, como vimos em ‘A Bela e a Fera’, ‘Mogli’ ou ‘Aladdin’. É claro, temos a presença de Kyanne Lamaya como Fabiana, uma ex-bailarina que trabalha para Stromboli contra a própria vontade e que se torna uma aliada inesperada de Pinóquio – mas, se a tirarmos de jogo, nada muda. Fabiana é construída apenas como uma escolha paliativa e que não coloca nada em xeque para o destino do protagonista ou fornece ajuda considerável. Nem mesmo as bizarras criaturas de fumaça da Ilha são de grande ameaça – indo e vindo como são: totalmente esquecíveis.

É claro que ainda temos o charme conhecido de Zemeckis, que parece mais preocupado em dar a Hanks mais uma chance de brilhar depois de tantas colaborações. O diretor, inclusive, pega algumas páginas emprestadas de ‘Os Fantasmas de Scrooge’ e ‘O Expresso Polar’ e, mesmo infundidas com um classicismo nostálgico, algo ainda parece faltar – e é triste pensar que Zemeckis, em resumo, não parece inspirado o suficiente para trazer essa atemporal história para o novo século (e isso sem mencionar a atroz e inexplicável decisão de não transformar o boneco de madeira em um menino de verdade nas cenas finais).

Pinóquio pode ter o coração no lugar certo, mas isso não é o bastante para quebrar a maldição que se abate sobre os estúdios Walt Disney e seus remakes. Em cada aspecto, um pedaço para faltar, nunca atingindo uma completude plena e deixando para trás um gostinho agridoce de quero mais que só pode ser saciado retornando a um passado distante.

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