Envelhecer parece uma boa ideia. Sinônimo da longevidade, parente do duradouro. Frequentemente associado a uma trajetória, a um futuro longínquo, todo mundo – bem ou mal – quer chegar lá. Mas sem pressa, sem acelerar nada. Este pavor da idade, toda a sua complexidade tão tragicômica e seus dissabores compõem o tema da vez no novo filme do francês Guillaume Canet, que se coloca no centro das atenções, nos lembrando que envelhecer é assustador, fazê-lo diante dos holofotes hollywoodianos é três vezes pior.
Existe essa pressão no ramo cinematográfico, em que a beleza permeia todas as esferas que englobam a produção do entretenimento. Muito mais que uma tendência, o belo é naturalmente associado à juventude, que sem surpresas, é tão efêmera quanto poderia ser. Seus anos parecem ávidos enquanto os vivemos, mas no instante em que se tornam fragmentos do passado, parecem a vida de alguém que pouco nos lembramos quem foi. Em Rock n’ Roll: Por Trás da Fama, Canet ironiza essa trágica máxima, ao encarar a crise dos 40 anos com as exigências de um mundo cada vez mais vaidoso e plástico, em uma era onde a tecnologia evidencia e valoriza os egos com frequentes publicações em redes sociais.
Em uma espécie de documentário fictício, invadimos a vida íntima do casal Guillaume Canet e Marion Cotillard, que ainda que estejam na mesma etapa da vida, vivem ângulos distintos da idade. Ele, entremeado em uma produção familiar na qual interpreta o pai de uma jovem no auge de seus 20 anos. Ela, desbravando papéis desafiadores, aos moldes daquilo que mais amamos em sua atuação cheia de entrega. Esses contrastes desviam nossos olhares de Marion, à medida que gradativamente Guillaume toma ciência de que ser velho já não é mais aquela expectativa do futuro. Aflito por ser visto como um artista da geração passada, o medo do ostracismo de Hollywood paira sobre sua mente ávida, o levando a uma divertida e prazerosa jornada em busca de um novo eu, que de preferência seja bem jovem.
Com um roteiro simples e uma direção documental, que busca ser o mais natural possível, Rock n’ Roll nos torna testemunhas da irreverência sem limites de Canet, que ao se usar como instrumento cômico, faz uma crítica certeira ao modus operandi de Hollywood – vez outra descartando grandes atrizes e atores por sua idade. Em uma época onde o fútil tem sido atacado em prol do substancial, a comédia francesa pisa no calo da indústria, mostrando um lado nada glamouroso existente atrás das cortinas do espetáculo da vida televisionada e cinematográfica. Ao final do dia, percebemos que Marion e Guillaume são retratos expressivos de toda a indústria, que busca construir trajetórias emblemáticas e históricas, mas teme o preço que o tempo cobra.
E o humor de Rock n’ Roll reside nessa paranoia, que todos temos no íntimo da alma, mas pouco externam de maneira tão eficaz. Com uma atuação divertida que imprime a confusão da mente de alguém que não está pronto para envelhecer, nos deliciamos com a insistência de Canet em ser jovem para sempre, indo até as últimas consequências. Essa espiral alucinante em busca de si mesmo, nos permite conhecer de perto os extremos que a sede por juventude traz consigo mesmo. Progressiva, a comédia tem seu ápice em um clímax inusitado, que revela que no desespero, até negar-se é uma alternativa bem plausível a fim de retardar o tempo.
Trazendo as clássicas e hoje habituais intervenções cirúrgicas para o dentro do debate, Rock n’ Roll: Por Trás da Fama mostra também uma Marion que não tem medo de se satirizar. Vítima do mesmo temor que a fase dos 40 anos traz para todos, ela mostra em tempo a pressão que existe sobre a mulher em contradizer sua própria carteira de identidade. Simples e direta, a agradável comédia nos lembra que a famosa junção de sexo, drogas e – claro – rock n’ roll é muito mais que um bordão icônico da subversão, é também o anseio de quem tem medo do futuro e adoraria poder reinventar seu presente.